A liberdade de imprensa foi tema da palestra conduzida na noite desta terça-feira (31) pelo jornalista gaúcho Marcelo Rech, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), no Instituto Cultural Brasileiro Norte-Americano, em Porto Alegre. O encontro se iniciou às 18h30min e foi aberto à comunidade.
O coordenador do instituto, João Rios, explica que o debate sobre imprensa livre foi um dos temas escolhidos pelos comitês internos para ser trabalhado ao longo do ano. Ele pontua que a instituição, fundada há 84 anos por intelectuais da Capital, incluindo Erico Verissimo, passa hoje por um processo de modernização.
Para celebrar o aniversário, comemorado em 14 de julho, uma série de eventos e atividades estão programadas ao longo do ano, contando com parcerias com outros espaços culturais da Capital, como a Cinemateca Capitólio.
— O instituto não é apenas uma escola de inglês, somos uma instituição que busca difundir a cultura norte-americana em Porto Alegre. Onde quer que se vá, alguém tem alguma história com o instituto — pontua o coordenador.
Em sua fala, Rech comentou sobre os artigos da Constituição que tratam sobre a liberdade de imprensa e como eles impactam na prática jornalística. Como uma forma de driblar a utilização de robôs que disseminam informações falsas, uma das proposições apresentadas pelo jornalista é a aplicação do artigo 5° inciso IV, que diz que "é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato".
Rech também comparou a legislação brasileira com a dos Estados Unidos no que se refere à garantia constitucional de proteção à fonte.
— Nos Estados Unidos, não raro, um jornalista vai preso por não revelar sua fonte. Nesse sentido, o Brasil está mais avançado — comentou.
A responsabilidade social e a ética do jornalismo também foram discutidas no encontro. Rech relembrou decisões editoriais tomadas ao longo de quase três décadas como editor em Zero Hora.
— O jornalismo tem que colaborar para o desenvolvimento da sociedade. Essa deve ser a nossa responsabilidade ética — sublinhou.
O jornalista também compartilhou dados referentes ao ranking de liberdade de imprensa ao redor do mundo, divulgado pela ONG Repórteres sem Fronteiras, em que o Brasil figura na 110ª posição entre 180 países, próximo a regimes autoritários como Nicarágua e Venezuela. Rech comentou sobre as estratégias de intimidação contra jornalistas adotadas em países como a Rússia.
Despoluição informacional
O jornalista propõe uma política de despoluição informacional que, na sua avaliação, deveria ser capitaneada pelas grandes empresas de tecnologia, as chamadas big techs - como Google, Facebook e Microsoft -, contra as redes de desinformação que se concentram em disseminar fake news. Segundo ele, seria necessário rever a política de patrocínios a conteúdos falsos, além do aprimoramento dos algoritmos.
— No processo de produção das big techs, essas grandes plataformas de tecnologia, elas acabaram produzindo um efeito colateral que é a chamada poluição social representada pela desinformação, as fake news, e o discurso de ódio. Creio que não fosse o objetivo delas que isso acontecesse, mas o fato é que aconteceu e é extremamente grave para o mundo todo. Quem tem condições de fazer a limpeza dessa poluição social é o jornalista profissional —enfatizou.
Para o presidente da ANJ, o bom jornalismo é o único antídoto para a epidemia de desinformação.
— Quem intensificou essa fórmula foi o presidente Jair Bolsonaro. É disso que o populismo se alimenta. Não temos que combater nem defender. Temos que fazer jornalismo — ressaltou.
Ambiente polarizado
O ambiente polarizado das redes sociais foi apontado por Rech como um dos motivos para a existência da imprensa profissional, que tem o dever de fornecer informações qualificadas e apuradas à população. Ele finalizou sua fala tratando sobre as consequências que um eventual fim da imprensa profissional representaria para a sociedade e para as democracias.
— Deixo aqui um questionamento para pensarmos para onde a nossa sociedade vai. Vamos optar por viver no império da desinformação, das bolhas, ou vamos buscar a pluralidade, ouvindo o outro lado, mesmo que não nos agrade? Queremos autocracias ou democracias? — pontuou o jornalista.
Durante 27 anos, Rech atuou como executivo no Grupo RBS, onde foi editor-chefe e diretor de redação do jornal Zero Hora por 15 anos, entre outras funções. Formado em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Rech também foi repórter especial de ZH, com foco em coberturas internacionais e de conflitos, como a Guerra do Golfo, a guerra na Iugoslávia, a dissolução da União Soviética, a crise em Cuba e a guerra civil em Moçambique. Ele também participou de cinco expedições à Antártica.