RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - "A mulher mais bem vestida do Brasil". Esse era o título da reportagem da revista norte-americana Life em abril de 1954, sobre a socialite Thereza de Souza Campos, que décadas mais tarde se tornaria a uma Orléans e Bragança, família dos descendentes do imperador d. Pedro 2º. Ela morreu há seis semanas no Rio de Janeiro. A causa foi problema no coração, segundo João Henrique de Orléans e Bragança, de quem Thereza foi madastra.
Voltando aos anos 1950, a Life era uma das revistas mais importantes do mundo, e Thereza ocupou duas páginas e meia daquela edição em inglês, posando com cinco modelitos variados. Ela era, então, provavelmente a face mais importante do high-society carioca, um grupo de milionários brasileiros acostumado a receber estrelas de Hollywood e a figuras da realeza para jantares nos palácios da cidade, que ainda era a capital federal.
Um desses milionários era Carlos Eduardo de Souza Campos, herdeiro de uma fortuna, alto funcionário do Banco do Brasil, jogador de polo, bom garfo, grande dançarino e carinhosamente apelidado de Didu. Ele transformou a mineira Thereza, filha de um comerciante de Ubá, em madame Souza Campos em 1946. Ela tinha apenas 17 anos, e já trabalhava com moda no Rio de Janeiro.
Um filho, que ficou conhecido como Diduzinho, nasceu logo em seguida, enquanto os jovens pais se tornavam o supra-sumo da elegância nacional. No livro "A Noite de Meu Bem", no qual Ruy Castro descreve a noite chique carioca entre os anos 1940 e 1960, pode-se ler o seguinte:
"(...) Entre essas mulheres, havia uma para quem as próprias mulheres olhavam com uma admiração quase religiosa: Thereza de Souza Campos. Todas a observavam para copiar seus penteados, vestidos, joias, sapatos, gestos, gostos, postura, tom de voz. Ela já nascera elegante -era a única explicação."
A Life concordava. A matéria começava com Thereza em uma foto de página inteira, envergando, nos jardins de sua mansão de quatro andares e 20 cômodos, um lindo vestido de algodão riscado que ela mesma desenhara. Na página seguinte, ela está com um conjunto claro comprado em Capri. E com um tailleur de Paris, envolvido com sobretudo de Roma, ao lado de seu marido Didu, que posa de bigodinho fino, camisa polo e brilhantina atrás do volante de seu Jaguar.
Na quarta imagem, Thereza permite que o fotógrafo a flagre com uma camisa de botões, com colarinho alto, mas "velha", pois comprada em Florença "há seis meses" - e provavelmente um tanto já fora de moda.
Na última página, vemos Thereza deslumbrante com luvas brancas de cetim acima do cotovelo e um longo preto da Dior (que valia 900 dólares em 1954, equivalentes hoje a US$ 8.600 ou R$ 47 mil). Sete voltas de pérolas no pescoço completavam o impressionante look.
O texto diz que o ator Bing Crosby a convidara para participar de um filme hollywoodiano, mas ela havia recusado. Elegantemente, é claro. Não teve, porém, como se furtar ao samba "Café-Society", gravado no ano seguinte e no qual é citada intimamente apenas pelo primeiro nome. "Therezas e Dolores falam bem de mim/ Papai de black-tie jantando com Didu", cantava Jorge Veiga.
Naquele mesmo casarão onde posara para as fotos -que ficava no alto da Mascarenhas de Moraes, em Copacabana -, o casal costumava hospedar o príncipe paquistanês Ali Khan, playboy internacional e pai de uma filha com Rita Hayworth. Em sua homenagem, Thereza promovia jantares para até 70 convidados. RSVP, é claro.
O casamento durou cerca de 25 anos, mas não resistiu a problemas de dinheiro e ao início das vendas dos bens do casal nos anos 1970. Em 1982, o filho Diduzinho saiu de uma longa noitada e arrebentou seu Passat numa curva da Lagoa. Perdeu 100% da visão direita e 90% da esquerda. A ele, coube adaptar a vida de playboy à de classe média.
Thereza se casou pela segunda vez em 1990, desta vez com João Maria de Orléans e Bragança, bisneto de dom Pedro 1º. Assim, aos 61 anos (ele tinha 73), ela se tornou a "princesa" Thereza de Orléans e Bragança.
"Mas papai e Thereza já viviam juntos antes, desde 1985", conta o filho de dom João Maria, João Henrique de Orléans e Bragança. Após o casamento, Thereza e João viveram alternadamente no Rio de Janeiro e em Paraty, na casa que hoje pertence a João Henrique -é lá que ele recebe todos os anos os autores convidados da Flip para um almoço de confraternização.
"Minha madrasta era muito engraçada e simpática", recorda-se ele, que tinha 36 anos quando aconteceu o casamento. "Ela tinha um senso de humor diferente, por vezes ácido." O casal ficou junto por 20 anos, até a morte de João Maria, em 2005. Após isso, Thereza não voltaria mais a Paraty.
-Nos últimos anos, Thereza de Orléans e Bragança se tornou cada vez mais reclusa, saindo cada vez menos para almoçar com as amigas da época do high society, como Lourdes Catão, outro símbolo daquela era e de quem Thereza era inseparável nos anos 1950.
Em agosto do ano passado, Diduzinho morreu e Thereza parou de atender mesmo a telefonemas, se fechando por completo. Há quatro meses, coincidentemente, foi a vez de a alta sociedade se despedir de Lourdes Catão, morta aos 93 anos, após pegar Covid-19.
Em 26 de junho, Thereza de Orléans e Bragança se sentiu mal e foi levada ao hospital por uma sobrinha. Lá morreu, horas depois. Tinha 91 anos.