BRASÍLIA, DF E SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O Ministério da Educação anunciou nesta quarta-feira (17) um programa para incentivar a captação de recursos privados para as universidades federais.
Entre as medidas, estão a constituição de fundo imobiliário para vender imóveis ociosos da União, a participação de organizações sociais na gestão de gastos do dia a dia e o aumento da captação de recursos do setor privado para financiar projetos.
Em outra frente, o projeto prevê que museus ligados a universidades possam captar recursos da Lei Rouanet, como já ocorre hoje. Uma das instituições que já adotou a prática é o Museu Nacional, vinculado à UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Embora tenha sido autorizado a utilizar a legislação, o museu só conseguiu captar parte dos recursos pleiteados.
Agora o MEC quer incentivar mais a utilização da lei, cuja utilização foi alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro (PSL), e abrir a mesma possibilidade para bibliotecas universitárias. "Queremos nos transformar na Apex (Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos) da educação. Queremos que a educação brasileira seja um produto tipo exportação", afirmou o secretário de Educação Superior, Arnaldo Lima.
A adesão ao novo programa, chamado Future-se, será opcional, mas os interessados serão obrigados a contratar organizações sociais para fazer a gestão e cumprir outros pontos, segundo o texto submetido a consulta pública.
O valor previsto para captação em incentivos é de R$ 102 bilhões, dos quais R$ 50 bilhões viriam de fundo imobiliário composto de patrimônio da União, R$ 33 bilhões de fundos constitucionais, R$ 17,7 bilhões de lei de incentivos fiscais e depósitos à vista e ainda R$ 1 bilhão da verba cultural.
O restante viria das demais fontes de financiamento previstas no projeto, como fundos patrimoniais e cessão de espaços físicos das universidades.
Ao resumir a proposta, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse que haverá quatro meios para obter recursos: "patrocínio, patrocinador, aluguel e parceria".
Segundo ele, os recursos devem ser geridos por um "fundo soberano do conhecimento". O capital privado, além do investimento direto em cada instituição, poderia entrar nesse fundo, de onde seria redistribuído às universidades.
"Algumas pessoas que não vão ler o projeto vão dizer que é privatização. O que é completamente errado", disse Lima. "As receitas são adicionais no orçamento."
A proposta deve passar por consulta pública. A ideia é enviar o projeto para o Congresso até o fim de agosto. Entre as leis que precisam ser alteradas estão a de fundos constitucionais, dos depósitos à vista, de incentivos fiscais e o marco legal de ciência e tecnologia.
Um dos pontos principais do projeto é a constituição de fundos imobiliários para venda ou concessão de imóveis e terrenos ociosos da União.
Segundo o MEC, a ideia é que a rentabilidade desses fundos seja revertida para as instituições. Lima citou o recurso que poderia ser gerado com a transformação de um terreno em um shopping, por exemplo. Outra possibilidade seria a constituição de fundos patrimoniais, regulamentados no ano passado. Eles recebem verba privada e são geridos por entidades sem fins lucrativos criadas para esse fim.
Algumas universidades e faculdades já utilizam expedientes similares. Um exemplo é a Escola Politécnica da USP.
"Por ser um fundo de investimento negociado em Bolsa, por CVM, ele tem autorregulação, tem pessoas acompanhando, e é obrigado a revelar questões de rentabilidade. E, quando o retorno voltar para as OSs, vamos ter transparência de onde esse dinheiro está sendo investido", disse Lima. "Mas queremos sobretudo ter gestores que entendam desse ramo."
Segundo o MEC, organizações sociais poderão participar da gestão imobiliária, limpeza e vigilância, por exemplo, além da captação de investimentos do setor privado.
O projeto prevê autorização de naming rights, quando o nome de empresas e patrocinadores pode aparecer na instituição, assim como em estádios de futebol. Segundo o MEC, a medida tem amparo legal, e deve ser estimulada.
O lançamento do novo programa ocorreu em meio ao contingenciamento de verbas das universidades. Algumas delas já começam a ter dificuldade para pagar despesas básicas, como conta de luz.
O ministro negou redução nos valores destinados pelo governo no orçamento para as universidades que aderirem.
O projeto também prevê estímulo à oferta de intercâmbio, bolsas para atletas e os com alto desempenho acadêmico. Já professores e departamentos poderiam obter recursos com projetos de empreendedorismo e patentes. "O professor pode ficar rico. Aqueles que quiserem explorar patentes vão ter o melhor emprego do Brasil", disse Lima.
O ministro completa: "Não é só montar uma empresa. O professor que publicar em revista boa também vai ser premiado pelo fundo", disse.
Outra proposta é a criação de um ranking com indicadores de desempenho das universidades mais eficientes.
No início da apresentação, o presidente da UNE (União Nacional dos Estudantes), Iago Montalvão, interrompeu para pedir mais recursos para educação. "Ministro, cadê o dinheiro da educação? Queremos solução para os estudantes que estão sem bolsa. Queremos uma resposta imediata. Como vamos pensar um projeto para o futuro se no presente não funciona?"
"É isso que precisamos: de investimento público para educação. É importante que tenha parceria, mas precisamos de politica pública.
O ministro não respondeu. Em seguida, convidou o estudante a acompanhar o anúncio, desde que não interrompesse. Segundo Weintraub, ao menos 20 reitores já aderiram "de boca" ao projeto. Ele nega que a possibilidade de cobrança de mensalidade. "
Plano foi elaborado sem consultar reitores, afirma associação
BRASÍLIA "O plano do MEC para captar recursos do setor privado para as universidades foi elaborado sem consultar reitores, afirmou nesta quarta-feira (17) o presidente da Andifes (Associação Nacional de Dirigentes de Instituições Federais do Ensino Superior), Reinaldo Centoducatte.
"É uma proposta formulada sem qualquer tipo de participação e escuta dos reitores", disse. "Não tem precedente um projeto desse vulto sem ter tido discussão prévia."
Segundo ele, a Andifes fará um grupo para avaliar o tema, mas as universidades terão liberdade para decidir se devem aderir. "Queremos preservar a autonomia. Se for algo que vai restringir o funcionamento e o papel da universidade em áreas específicas, isso vai contra o nosso conceito de universidade. Isso é algo que temos que analisar a partir das proposições", disse.
Para Centoducatte, a adesão ao modelo não pode ser "tudo ou nada". Mais cedo, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, disse que o programa não se ajustaria a cada instituição. "Ou adere a tudo ou a nada", informou.
Entre os pontos que não estão claros, estão o papel das organizações sociais e os impactos dessa medida e a mobilização de recursos por meio do fundo de financiamento.
Para João Carlos Salles, reitor da UFBA (Universidade Federal da Bahia), a criação de um projeto para captar recursos extras para custeio das instituições mostra que o governo reconhece a atual defasagem orçamentária.
Segundo a Andifes, algumas universidades podem suspender as atividades em setembro devido ao contingenciamento de recursos.