Um ônibus gratuito que passa por estações onde serviços essenciais de saúde, segurança e educação são oferecidos à população. Além disso, o trajeto atende aos polos industriais e de educação da Região Metropolitana. A ideia não é novidade. Surgiu em 1994, quando foi criado o Acordo Operacional Avenida do Trabalhador, primeiro nome da linha Transversal Metropolitana 1 (TM1), atualmente operada pelo Consórcio Metropolitano de Transportes (CMT).
A chamada "Avenida do Trabalhador" foi criada pelo Governo do Estado. A via é um conjunto de ruas e avenidas que liga o bairro Restinga, na zona sul de Porto Alegre, ao bairro Mathias Velho, em Canoas _ passando por Viamão, Alvorada e Cachoeirinha. Porém, desde seu início, a ideia nunca engrenou. Das nove estações de serviços que deveriam ser erguidas, uma nunca saiu do papel, inclusive. Das que ficaram prontas, nenhuma chegou a ser usada exatamente como idealizou o então governador Alceu Collares. Por isso, ainda em 1994, o Estado cedeu a linha Acordo Operacional para um consórcio de empresas que operavam na Região Metropolitana. Surgiu aí o TM1, uma linha metropolitana pouco comum. Isso em razão da quilometragem rodada a cada viagem: 130 km, contando ida e volta, passando por cinco cidades.
Preço é considerado acessível
Passados 25 anos do pontapé inicial do lançamento da Avenida do Trabalhador, restam apenas placas deterioradas e algumas das estações seguras que teriam os serviços de saúde, segurança e educação. Hoje, os pontos são usados pelos municípios em outras funções.
Alheio a tudo isto, o TM1 sobreviveu, e muito bem. De segunda a sexta, a linha faz 54 viagens partindo da Capital em direção à Canoas e outras 53 viagens no sentido Mathias Velho-Restinga. Nos domingos e feriados, são menos horários. Cada viagem completa (ida e volta), leva cerca de quatro horas. Por mês, são transportados 180 mil passageiros, além da média de 157 mil quilômetros rodados mensalmente.
O que mais atrai os usuários para a longa viagem pela Região Metropolitana, na avaliação da gerente-geral do Consórcio Metropolitano de Transportes (CMT), Eleonora Lindner, é o preço. Atualmente, a passagem custa R$ 5,70.
— É uma linha focada em estudantes e trabalhadores. Passa por vários municípios e chega nos pontos que são importantes para este público. Quem usa, economiza, pois, ao invés de pegar duas ou até três conduções para chegar ao mesmo destino, faz tudo em uma viagem — explica Eleonora.
Um expediente de 174 quilômetros
Quem usa o TM1 não costuma fazer a viagem inteira, conforme dados do CMT. O uso do ônibus é mais frequente na ligação entre um município e outro, como quem vai de Porto Alegre para Alvorada ou Viamão. Ou quem vai de Alvorada para Cachoeirinha e Canoas, por exemplo. O mesmo vale no sentido inverso.
— Apenas 10% dos usuários chegam a fazer o trajeto completo, de ponta a ponta. É muito usado por quem mora numa cidade e trabalha ou estuda em outra — explica a gerente do consórcio.
O tempo médio que cada usuário passa no ônibus é de pouco mais de uma hora. Se isso já lhe parece muito, imagine a rotina de quem trabalha no itinerário. É o caso do motorista André Luís Figueira, 48 anos, e do cobrador Luís Celso de Oliveira Silva, 29 anos. Eles fazem parte do time de 240 motoristas e cobradores que trabalham nas linhas TM. Por dia, a dupla roda cerca de 174 quilômetros. Para se ter ideia, a distância é pouco menor do que o necessário para ir da Capital até Torres, no Litoral Norte. A primeira viagem da dupla parte de Canoas em direção à Restinga, às 6h20min.
Contudo, a rotina deles começa bem mais cedo. André mora em Porto Alegre, no bairro Rubem Berta, enquanto Luís vive no bairro Stella Maris. Por volta das 4h da manhã, ambos já estão de pé. Funcionários da Soul, uma das integrantes do consórcio, eles se encontram na sede da empresa antes das 5h. Lá, embarcam em um dos 60 veículos da frota própria do CMT e vão até a garagem da empresa Vicasa _ outra integrante do consórcio _, em Canoas. No local, eles recebem a tabela de horários do dia e partem para a primeira viagem.
— Fizemos uma ida e volta de Canoas à Porto Alegre. Depois, voltamos à Porto Alegre, onde encerramos o expediente. Dá uma volta e meia (apenas o trajeto de ida e volta é considerado uma "volta completa"). Se nada atrasar, às 14h estamos voltando para casa — conta Luís, que chega em casa por volta das 16h.
— Na maioria das vezes, antes das 22h eu já estou dormindo. Na terça, nem vi o jogo da Seleção — diz ele, se referindo ao empate entre Brasil e Venezuela, em jogo válido pela Copa América.
Amizades pelo trajeto
A recompensa pelas longas viagens vem por meio do convívio com os passageiros. Luís está há menos de um ano como cobrador do TM1. Para André, a estrada já é mais longa, são seis anos conduzindo a Transversal Metropolitana 1. Entre as situações mais inusitadas, ele lembra os expedientes anuais de 20 de maio. É quando ele completa mais um ano de vida e, costumeiramente, os passageiros fazem questão de cantar um "parabéns à você" dedicado ao condutor.
— É muito especial essa relação. Tem gente que anda comigo há seis anos. A gente sabe quando está atrasado, quando está num dia bom, ou nem tanto — brinca ele.
A dupla fecha a primeira volta _ há um intervalo, realizado em Porto Alegre, entre 8h20min e 9h30min _ pouco depois das 11h30min, ao chegar a Canoas. A saída para seu último itinerário do dia é às 12h. Esta janela de 30 minutos entre as viagens é utilizada para o almoço.
— No início do mês de julho vou entrar em férias. Os passageiros sentem falta, mas em agosto estou de volta — tranquiliza André.
Quem usa, e por quê?
O Diário Gaúcho foi acompanhar uma viagem de TM1. Embarcamos na Restinga e fomos até o bairro Mathias Velho, em Canoas. A principal característica da linha é sua renovação durante o trajeto. Em alguns momentos, o veículo está carregado. Em outros, trechos são feitos com o carro quase vazio. Mesmo com a longa viagem, os rostos são conhecidos entre motorista e cobrador. Os sorrisos e os cumprimentos de bom dia são constantes.
Há quem vá ao trabalho, quem se desloque para escola ou faculdade. Gente que vai para aprender, mas também para ensinar, como é o caso do professor de Geografia Fernando Oliveira, 47 anos. Ela dá aulas para alunos do Ensino Fundamental em uma escola particular de Alvorada. Entretanto, mora em Taquara, distante cerca de 60 quilômetros:
— Venho até Cachoeirinha com um ônibus e pego o TM1 para chegar na escola. É um valor acessível. Acredito que, por isso, tantas pessoas utilizem. De manhã, quando venho, é sempre cheio.
Custo-benefício
A dona de casa Samantha da Silva, 19 anos, vem da Lomba do Pinheiro até o bairro Guajuviras, em Canoas. A motivação é a sua família. O marido mora em Porto Alegre, para onde ela se mudou a menos de meio ano. Desde então, os trajetos com o TM1 são frequentes. Para Samantha, a viagem dura quase duas horas. Ultimamente, ela tem levado outro passageiro a tiracolo. Seu filho, Enzo Gabriel, dois meses. A pequena Emily, 12 anos, sua irmã, também costuma estar junto.
— Estou levando ele na UPA de Canoas, faço o atendimento lá. Se não fosse essa linha, teria de ir ao Centro da Capital e pegar outro ônibus. Demoraria bem mais — compara Samantha.
Modernização, apesar da idade
Junto aos seus 25 anos de existência, o TM1, e também o TM2 e TM3 _ outros dois transversais operados pela CMT, que carregam cerca de 332 mil pessoas por mês _ estão dando um novo "presente" aos usuários. Agora, os ônibus da frota são equipados com GPS. Por meio do aplicativo TEU Ônibus, os passageiros podem acompanhar onde cada veículo está em tempo real.
— Fica muito mais fácil saber a hora certa de ir até a parada. Traz segurança para os passageiros — explica a gerente-geral do consórcio.
O aplicativo está disponível para os sistemas operacionais Android e iOS.