BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O Supremo Tribunal Federal formou maioria (6 votos) para enquadrar homofobia e transfobia na lei dos crimes de racismo até que o Congresso aprove lei sobre o tema.
O julgamento, que havia começado em fevereiro, foi retomado nesta quinta (23), um dia após a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado fazer avançar um projeto de lei que criminaliza a discriminação por orientação sexual ou identidade de gênero.
Já havia no STF quatro votos pela criminalização da homofobia, proferidos em fevereiro pelos ministros Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Nesta quinta, votaram Rosa Weber e Luiz Fux, formando a maioria.
O julgamento deverá ser retomado em 5 de junho --quando está na pauta processo sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo. No caso da homofobia, faltam os votos de cinco ministros: Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e o presidente da corte, Dias Toffoli.
Estão em julgamento dois processos que pedem que o STF reconheça a omissão do Congresso ao deixar de criminalizar a homofobia. Os autores são Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transexuais e PPS, que acionaram o tribunal em 2012 e 2013.
Rosa Weber ressaltou a violência que as comunidades LGBT enfrentam e, citando autores, afirmou que o racismo não se baseia no conceito simplista de raça, mas na atitude de hierarquizar grupos humanos e justificar a segregação e dominação de alguns grupos, seja por qual for o motivo.
"Entendo que o direito à própria individualidade, identidades sexual e de gênero, é um dos elementos constitutivos da pessoa humana. O descumprimento de tal comando pelo Legislativo, não obstante transcorridas três décadas desde a promulgação da lei fundamental, abre a via da ação por omissão, prevista na Constituição e que visa suprir vazio legislativo", disse Rosa.
O ministro Fux afirmou que o Judiciário não está criando figura penal ao enquadrar condutas homofóbicas na lei do racismo, mas só fazendo interpretação da legislação infraconstitucional. Segundo ele, há racismo contra gays, judeus, afrodescendentes.
"Não temos certeza de que ele [o projeto de lei que passou na CCJ] vai ser aprovado, ele pode ser vetado [pelo presidente], e efetivamente a homofobia vai prosseguir", disse Fux. "Às vezes voz e votos não são suficientes, porque ao final do curso legislativo nós podemos ter um veto."
Antes de retomar a análise dos processos, os ministros do STF fizeram uma votação preliminar pela continuidade ou não do julgamento, em face da movimentação feita pela CCJ do Senado na quarta (22).
Por 9 votos a 2, a maioria decidiu que o julgamento devia prosseguir. Essa discussão foi repleta de críticas aos senadores que pediram o impeachment dos quatro ministros que, em fevereiro, haviam votado pela criminalização da homofobia --Celso de Mello, Fachin, Moraes e Barroso.
A discussão foi iniciada pelo decano, Celso de Mello, relator de um dos processos. Ele contou que recebeu, pouco antes da sessão, um ofício do Senado informando sobre a decisão da CCJ de quarta-feira.
Mello disse que, embora o Senado não tivesse feito pedido formal para interromper o julgamento, ele deveria continuar porque a movimentação do projeto de lei na CCJ não esvazia processos no STF.
"A omissão [do Congresso] ainda subsiste", disse o decano. Para ele, desde o início da vigência da Constituição, há 30 anos, ou pelo menos desde que o primeiro projeto de lei sobre a homofobia chegou ao Congresso, há 18 anos, os parlamentares não legislaram em defesa dessas minorias.
Apenas Marco Aurélio e Toffoli votaram por não julgar os processos e esperar a tramitação do projeto no Congresso.
Para Celso de Mello, o pedido de impeachment representou uma "manifestação de superlativa intolerância por parte dos denunciantes".
Um dos líderes da bancada evangélica, o deputado Pastor Marco Feliciano (Pode-SP), disse que a decisão não o surpreende. "Já era esperada. Porém [tratar] a suspensão da sessão mostra o compromisso de Toffoli conosco em aguardar texto via Câmara."
Feliciano disse ter falado com Toffoli na quarta (22) e acordado para apresentar o projeto. "Há acordo de procedimento com as Câmaras Alta e Baixa e o Executivo... A razão da demora é por ser assunto polêmico e que não há convergência nem entre os LGBTs."
Já o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) criticou o STF. "A corte, quando o faz sabendo que há trâmites dessa matéria no Legislativo, usurpa a competência do Congresso. Acho erro, mas respeito."