Os problemas financeiros do hospital Nossa Senhora das Graças viraram um drama que repercute na Região Metropolitana. Representantes da prefeitura de Canoas, do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers), do Ministério Público (MP) e da direção do hospital fizeram diversas audiências públicas. O município suspendeu na última quarta-feira consultas e exames no Nossa Senhora das Graças e em outros dois hospitais canoenses, por falta de dinheiro, que deveria ter sido repassado pelo governo estadual.
Médicos de 40 especialidades, que atuam pelo regime pessoa jurídica, voltaram a trabalhar, mesmo com até 12 meses de vencimentos atrasados. Nas audiências públicas, foi informado que o hospital tem R$ 130 milhões em débitos variados (com servidores, fornecedores e bancos). Destes, R$ 22 milhões são com médicos — alguns dos quais não recebem há mais de um ano, detalha Clarissa Bassin, diretora do Simers.
Até recursos oriundos de convênios particulares foram usados para pagar atrasados dos funcionários, segundo a comissão formada por membros de prefeitura, MP e Simers, que tenta salvar o Nossa Senhora das Graças e sugeriu que seja pedido financiamento de longo prazo ao BNDES.
Auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que Canoas gastou em média o dobro, entre 2006 e 2007, do que Porto Alegre na implantação de próteses ortopédicas. Segundo o TCU, o valor médio das Autorizações de Internação Hospitalar (AIHs) na cidade da Região Metropolitana foi de R$ 7.848 ante R$ 3.917,18 na Capital.
Prefeito aponta consultas não feitas
A prefeitura de Canoas admite que o pagamento de atendimentos e cirurgias feitas no Nossa Senhora das Graças tem sido glosado constantemente (o SUS cobra devolução de dinheiro, por serviços que considera fraudados ou não prestados). O prefeito Luiz Carlos Busato (PTB) afirma que, um mês depois de assumir, auditoria constatou que, de 600 consultas neurológicas pagas ao hospital nos três primeiros meses de 2017, apenas umas poucas foram realizadas.
— Glosamos R$ 590 mil em consultas não comprovadas. O hospital pressionou prefeitos,ao longo dos últimos anos, a pagar serviços que muitas vezes não eram realizados. Ameaçava com fechamento — resume Busato.
Durante as audiências públicas, foi sugerida auditoria de todo o Nossa Senhora das Graças, aos moldes da que foi feita no Hospital Beneficência Portuguesa de Porto Alegre. Busato admite que a cada auditoria que aponta suspeita de fraudes fica mais difícil para o estabelecimento negociar financiamentos e manter o fluxo de AIHs liberadas pelo governo federal.
O que diz a direção do Nossa Senhora das Graças
-Informa que o processo no qual Associação Beneficente Canoas(mantenedora do hospital) contesta a dívida de R$ 3,5 milhões que a União cobra do Nossa Senhora das Graças se encaminha para sentença e a eventual confirmação da cobrança de expressiva soma em dinheiro"impactará significativamente as finanças do hospital, que já opera, por muitos anos, em severo regime de sub custeio".
- A direção da instituição não descarta que possam ter ocorrido fraudes, mas não teriam sido praticadas com conhecimento do hospital. Se ocorreram, acrescenta,foram por responsabilidade de equipes contratadas para cirurgias.-Sobre o pagamento de 200 consultas por mês em neurologia,feito pelo município, o hospital diz que é verdadeiro e que,efetivamente, prestou poucas consultas desse tipo: 40 no primeiro trimestre de 2017.
O diretor administrativo e financeiro do Nossa Senhora das Graças,Francisco Valmor Marques de Avila, diz que, apesar de não realizar as consultas contratadas,o hospital gastou muito mais do que o previsto em exames (raio X e tomografia).
"Ou seja, fizemos consultas amenos e exames a mais. No final,um custo compensa o outro. O contrato, portanto, desenvolve-se em total regularidade", detalha Avila.