Para a Polícia Civil, não há dúvidas de que Guilherme Corrêa de Quadros, 20 anos, morreu devido a ferimentos decorrentes de um acidente de trânsito em Carlos Barbosa na madrugada de 19 de março de 2017. Para a família do jovem, para peritos particulares e para advogada Dinamara Lusa Tessaro, a história é diferente: o jovem foi vítima de agressões que lhe causaram a morte.
Com base em uma perícia realizada por uma empresa privada de São Paulo, que contraria a conclusão do inquérito policial, Dinamara e a família de Guilherme querem reabrir o caso e pedir nova investigação.
O rapaz, que morava em Garibaldi, morreu no Hospital São Roque após ter sido retirado do Fusca que conduzia naquela madrugada. O veículo havia batido contra a grade de ferro de uma moradia de Carlos Barbosa. Guilherme estava sozinho no carro.
A perícia oficial indicou que rapaz sofreu um ferimento profundo na pescoço causado pelo impacto contra o para-brisas do Fusca. De acordo com a polícia, antes do acidente, o jovem havia deixado a Rua Coberta, onde ocorria uma festa, dirigindo o carro. Ele colidiu o veículo primeiro contra um parquímetro na Rua Rio Branco, no Centro. Depois, seguiu dirigindo até perder novamente o controle do Fusca e bater contra uma Saveiro estacionada na rua. Na sequência, atingiu a grade de uma residência na Rua José Raimundo Carlotto, no Vila Nova. Socorrido, o jovem veio a óbito pouco depois.
O inquérito, concluído em dezembro de 2017, foi encaminhado ao Ministério Público em janeiro deste ano. A Justiça deu vista dos autos ao MP e o promotor, após análise, pediu o arquivamento do inquérito por se tratar de um acidente de trânsito causado pela própria vítima, o que foi aceito pelo judiciário em fevereiro.
Não satisfeita com o resultado, a família contratou uma investigação particular. A tese de família parte de informações de testemunhas, que afirmaram que Guilherme havia sido agredido numa briga antes de embarcar no veículo. O laudo não oficial indica que o rapaz morreu em virtude dessas agressões.
As manchas de sangue indicam cientificamente que ele embarcou machucado no carro.
EDUARDO LLANOS
perito contratado pela família do jovem
Segundo os investigadores particulares, as provas, testemunhas e análises de câmeras de vídeo apontam que o jovem sofreu as lesões que lhe causaram o corte profundo no pescoço antes antes de embarcar no Fusca. Ou seja, o ferimento foi produzido por uma garrafa, segundo a investigação particular. O corte levou à perda de sangue, e fez com que Guilherme perdesse o controle do veículo e batesse contra a grade de uma casa.
Com base no laudo contratado, a advogada Dinamara irá solicitar o desarquivamento do caso à Justiça.
— Vamos pedir a reabertura da investigação — ressaltou.
"Ele não foi ferido no acidente"
Conforme o perito Eduardo Llanos, diretor da Sewell Investigações e Perícias, contratada pela família de Guilherme, foram realizados trabalhos de investigação particular por cerca de três meses. Llanos afirma que a análise criminológica sobre as manchas de sangue na roupa da vítima comprova que Guilherme estava machucado ao entrar no Fusca, e não após o acidente:
— É comprovado pelo padrão das manchas de sangue que ele estava ferido ao entrar no carro, ele não foi ferido no acidente. As manchas de sangue indicam cientificamente que ele embarcou machucado no carro. A velocidade em que ele estava era entre 50 e 60 km (por hora), então vai contra a versão de que foi o acidente que provocou a morte. O ferimento não é da colisão contra o parquímetro, camionete ou contra a grade da residência, não foi do acidente, e esse é um fato cientificamente comprovado.
O perito particular destaca ainda que essa versão foi comprovada por novas testemunhas que, segundo ele, não foram ouvidas pela Polícia Civil. Contudo, essas pessoas procuram a advogada da família para prestar informações sobre o caso.
— Ele (Guilherme) ingressou no veículo ferido e isso ficou confirmado pelo testemunho de pessoas que nos procuraram para prestar esclarecimentos sobre aquela madrugada. Por meio das testemunhas e das imagens de vídeo, temos inclusive um possível suspeito que, em depoimento, repassou à polícia uma versão diferente dos fatos que ocorreram na Rua Coberta —ressalta Llanos.
Caso está encerrado, diz Polícia
Familiares contestaram a versão da Polícia Civil desde o início da investigação. Segundo o delegado de Carlos Barbosa, Leônidas Costa Reis, o pai do jovem registrou ocorrência alegando que o filho foi agredido com uma garrafada durante uma festa na Rua Coberta, em Carlos Barbosa.
Essas informações nortearam o início da investigação oficial, mas não foram confirmadas pelo laudo do Instituto Médico Legal. Conforme Leônidas, a perícia apontou que o jovem não teria condições de dirigir com um corte profundo como o que apresentava no pescoço — a distância entre a Rua Coberta e o ponto onde o carro foi achado é de cerca de 1,3 quilômetro.
O laudo (oficial) aponta que o rapaz não teria condições de dirigir com aquele ferimento e o sangue no interior do veículo comprova que o ferimento foi do acidente.
LEÔNIDAS COSTA REIS
delegado responsável pelo caso
Leônidas desconhece o laudo contratado pela família. Ele explica que a linha de investigação começou com a possibilidade de Guilherme ter sido agredido, devido ao boletim de ocorrência registrado pelo pai do jovem, informação que não se confirmou ao longo das diligências e depoimentos de testemunhas. Para ele, o caso está encerrado:
— Desconheço esse novo laudo, mas prefiro acreditar na perícia oficial, que teve acesso ao corpo do rapaz, ao veículo que ele dirigia e aos locais onde ele colidiu. Se ocorrer um fato novo comprovado e fundamentado é possível reabrir o caso, porque a polícia busca a verdade sempre, mas é preciso que sejam fatos que tenham credibilidade. A família tem todo o direito de buscar um culpado e procurar outra versão, mas na esfera policial o caso está encerrado e arquivado pelo Judiciário. O laudo aponta que o rapaz não teria condições de dirigir com aquele ferimento e o sangue no interior do veículo comprova que o ferimento foi do acidente. Ele deixou a Rua Coberta sem nenhum ferimento, lesão ou mancha de sangue.
A reportagem tentou contatar o Instituto Geral de Perícias para tratar do assunto, mas não obteve retorno.