Recentes episódios de abuso sexual de crianças e adolescentes em Caxias do Sul e em Lagoa Vermelha deixaram autoridades em alerta. Entre as vítimas dessa triste realidade está uma menina de nove anos, que foi alvo de um homem ainda não identificado no caminho da escola na zona norte de Caxias do Sul, na tarde de 19 de outubro. A garota não conhecia o agressor e caiu na clássica conversa de que ganharia um presente, o que a motivou a entrar no veículo dele. Dali, foi levada até a casa do homem, onde sofreu o abuso. A polícia divulgou um retrato falado do provável autor do estupro.
Esse e outros casos mostram que os criminosos continuam fazendo uso de velhas e novas táticas para fazer vítimas, o que tem ajudado a aumentar o número de crimes sexuais contra a infância e adolescência em Caxias do Sul. De janeiro a setembro do ano passado, a Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA) havia registrado 52 ocorrências de estupro e pedofilia. No mesmo período deste ano, foram registradas 79 casos, sendo 77 por estupro de vulnerável e duas por pedofilia, o que corresponde a um aumento de 51%.
Os alvos mais recorrentes são crianças do sexo feminino. O cenário, no entanto, deixa evidente que meninos e meninas estão em situação vulnerável não só no caminho da escola ou dentro de casa. Apesar das velhas técnicas de aproximação, hoje, segundo o delegado Joigler Paduano, titular da DPCA, o abusador também faz contato pelas redes sociais e por aplicativos de celular.
— No ambiente digital, muitas vezes, não se sabe com quem se está falando. Esses agressores adicionam as vítimas, trocam conversas, vão se aproximando e o assunto amigável começa a ficar sexual. Daí vem a troca de vídeos, nudes e pode acabar da internet para o contato pessoal — alerta Paduano.
Conforme Joigler, ainda é difícil precisar o perfil do abusador. Já as vítimas mais recorrentes, em Caxias, são crianças de ambos os sexos e na idade dos 12 e 15 anos, segundo o delegado. Na DPCA, somente neste mês, houve denúncia de dois casos de pedofilia pelo WhatsApp.
Violência intrafamiliar
De acordo Janet Vivan, psicóloga no ambulatório Apoiar da Secretaria Muncipal de Saúde, uma das formas de prevenir e identificar abusos é estabelecer diálogo entre pais e filhos logo cedo, quando surgirem as primeiras questões sobre sexualidade ou se a criança apresentar mudança no comportamento.
—É fundamental ensinar a criança a valorizar e a cuidar do próprio corpo em qualquer idade. A conversa é essencial para entender o que ela está passando. Na atual sociedade, a melhor forma de proteção é a supervisão constante das crianças tanto em casa quanto na rua — salienta Janet.
Embora se relacione à família o papel protetivo, o Conselho Tutelar alerta que, em alguns casos, a violência sexual ocorre dentro do núcleo familiar. De janeiro até outubro deste ano, foram cadastrados para atendimento no Conselho Tutelar Macrorregião Norte 34 denúncias de abuso, sendo que 27 desse total ocorreram em família. Já no conselho da macrorregião Sul, 20 situações foram atendidas.
— Nós temos o papel de trabalhar com a prevenção e proteção das vítimas. O ato de cometer pedofilia está dentro do que se entende como abuso sexual e deve ser tratado como crime. Nossas ações visam orientar as famílias, reiterando o papel protetivo e a importância da denúncia. Em casos de fatos consumados, nós encaminhamos o adolescente ou a criança para a rede de atendimento, que prestará assistência médica e psicológica à vitima — explica Terezinha Andreazza, coordenadora do Conselho Tutelar Norte.
O alerta também vale para as instituições de ensino. Segundo terezinha, o ambiente escolar deve estimular a conversa com o aluno e expor essas situações de risco, além de aconselhar que evitem aceitar presentes, caronas ou falar com estranhos.
O que conversar
Para evitar que seu filho seja alvo de violência sexual é importante estar atento à rotina dele e conversar sobre o corpo ainda na infância, conforme a psicóloga Janet Vivan.
— A partir dos três anos, pode se ensinar o que são as partes íntimas. Pelos cinco ou seis, quando a criança demonstrar interesse ou tocar no assunto, se deve ensinar que abuso sexual é, por exemplo, quando qualquer pessoa tenta passar a mão ou beijar as partes íntimas. Quando iniciarem as perguntas sobre sexualidade, responder apenas a pergunta feita da maneira mais clara e verdadeira possível com linguagem adequada à idade — orienta Vivan.
CRIMES
A DPCA divulgou o retrato falado do homem que abusou de uma criança de nove anos em Caxias do Sul. A menina foi abordada perto da escola. O agressor estava num Palio e levou a criança para uma casa, onde cometeu o estupro. A criança só foi liberada duas horas depois numa localidade da zona sul de Caxias. A vítima não soube descrever o endereço do crime, mas forneceu detalhes importantes sobre a fisionomia do agressor. O retrato foi elaborado por técnicos do Instituto Geral de Perícias (IGP). Denúncias sobre suspeitos podem ser encaminhadas para os telefones 190 (Brigada Militar) ou (54) 3214.2014 (DPCA).
Enquanto os agentes da DPCA ainda buscam o criminoso de Caxias do Sul, a Polícia Civil estabelece quais são as conexões de um morador de Lagoa Vermelha preso por envolvimento numa rede de pedófilos investigada pela Secretaria Nacional de Segurança (Senasp). Na casa dele, onde abusava das vítimas e gravava vídeos desses atos e os compartilhava na internet, a polícia aprendeu um notebook, porções de maconha e outros equipamentos de armazenamento digital como DVDs e pendrives.
LEI
O abuso sexual não se caracteriza somente pela relação consumada. Atos como compartilhamento de vídeos, fotografias ou troca de mensagens com finalidade de satisfação sexual e que exponham a criança ou o adolescente são formas de abuso e violação da integridade física do menor. A pena para estupro de vulnerável prevê reclusão de oito a 15 anos
CUIDADOS
Abaixo, confira dicas dos profissionais do Apoiar, da Secretaria Municipal da Educação e do Conselho Tutelar para evitar que os filhos fiquem em situações vulneráveis
:: Em casa: a criança e o adolescente precisam se sentir seguros e assistidos em casa, principalmente, para informar se algo de diferente está acontecendo na presença de algum adulto, seja familiar ou desconhecido. É recomendado que os responsáveis escutem as crianças e os adolescentes, evitem que eles fiquem sozinhos na residência, além de não deixá-los abrir a porta para estranhos ou falar ao telefone com desconhecidos. Supervisionar a rotina e o comportamento do menor é essencial.
:: Nas redes: É recomendado que a gurizada não tenha acesso liberado ao computador e à internet. Existem filtros que os pais ou responsáveis podem ativar no computador para fiscalizar o que os filhos estão consumindo no meio digital (chat, redes sociais, sites, etc.), assim como o que estão publicando no Instagram, WhatsApp, Snapchat, Facebook e Twitter, por exemplo. Especialistas também sugerem que os responsáveis não deixem as crianças totalmente sozinhas enquanto usam o celular ou o computador.
:: Na rua: Alerte a criança e o adolescente para não aceitar carona de pessoas estranhas ou de conhecidos com atitudes suspeitas. É importante explicar para os filhos quais os tipos de abordagens utilizadas pelas pessoas mal-intencionadas, tais como oferecer doces, recompensas ou ajudas desnecessárias. Explicar a eles para ficarem atentos caso alguém se aproxime e tente acompanhá-los na rua ou tocar em alguma parte do corpo deles.
:: No caminho da escola, é prudente que a criança não ande desacompanhada. Uma alternativa é contar com pessoas de confiança da criança e da família para guiá-la no trajeto. Ou pedir que pais de colegas façam o acompanhamento até a escola.
SINAIS
:: Fique atento em relação às alterações de humor ou mudanças de comportamento do adolescente e da criança.
:: Os especialistas alertam que quando eles sofrem algum tipo de agressão ou abuso podem expressar agressividade, tendência ao isolamento, depressão e dificuldade para fazer necessidades fisiológicas.
:: Preste atenção também se há alguma marca aparente pelo corpo ou se há mudança de comportamento diante de determinada pessoa conhecida.
ONDE DENUNCIAR OU BUSCAR AJUDA
Conselho Tutelar Sul
Endereço: Rua Os 18 do Forte, 998, bairro Centro
Telefone: (54) 3216.5500
Horário de atendimento: de segunda a sexta, das 8h às 17h30min
Conselho Tutelar Norte
Endereço: Rua Visconde de Pelotas, 130, bairro Pio X
Telefone: (54) 3227.7150
Horário de atendimento: de segunda a sexta, das 8h às 17h30min
Ambulatório Apoiar
Endereço: Rua Alfredo Chaves, 515, bairro Centro
Telefone: (54) 3901.1338
Horário de atendimento: de segunda a sexta, das 8h às 18h30min
Ministério Público
Endereço: Avenida Independência, 2.372, bairro Exposição
Telefone: (54) 3216.5300
Horário de atendimento: de segunda a sexta, das 9h às12h e das 13h30min às 18h
Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA)
Endereço: Rua Marquês do Herval, 1.178, bairro Centro
Telefone: 3214.2014
Horário de atendimento: de segunda a sexta, das 8h30min às12h e das 13h30min às 18h
Disque-denúncia Nacional de Abuso e Exploração Sexual
Telefone: 100 (em qualquer horário)
Brigada Militar
Telefone: 190 (em qualquer horário)