Terceira maior economia do Estado, Gravataí ainda amarga os efeitos do desemprego gerado por dois anos seguidos de crise na indústria automotiva. Com o fechamento do terceiro turno da General Motors, maior empresa da cidade, 1.466 trabalhadores foram demitidos entre 2015 e 2016, segundo o Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí (Sinmgra). O fechamento de tantos postos de trabalho provocou um efeito em cascata que atingiu toda cidade.
O comércio de rua foi um dos setores mais afetados. Proprietária de uma loja de brinquedos e roupas infantis no Centro de Gravataí, Cerli Dulce Dal Santo vê a cada dia que passa mais um vizinho comerciante fechar as portas por conta da crise. Na calçada de uma mesma quadra da Rua Adolfo Inácio Barcelos, onde fica a loja de Cerli, duas foram fechadas nos últimos quatro meses.
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O Sindilojas de Gravataí calcula que ao longo de 2016, pelo menos, 15 lojas deixaram de existir por mês na cidade, o que é observado quando a empresa se desassocia da entidade que possui 1,7 mil associados.
A Associação Comercial, Industrial e de Serviços de Gravataí (Acigra), que tem cerca de 900 associados, registra de três a quatro fechamentos de empresa por mês, o que, em anos anteriores, não chegava a uma a cada dois meses.
– Na Avenida José Loureiro da Silva (a principal da cidade), três lojas fecharam na semana passada. Isso é péssimo, é cada vez menos gente circulando. A concorrência diminuindo é ruim para todo mundo – avalia Cerli.
Em 2016, ela teve o pior ano dos 24 em que mantém seu negócio e foi forçada a adotar estratégias nunca antes necessárias para evitar que sua loja também naufragasse: distribuiu panfleto na rua e usar as redes sociais.
– Eu passei por diferentes momentos da economia do Brasil e, para mim, agora está pior do que na época da remarcação de preços (que ocorreu no governo de Fernando Collor, no início dos anos 1990 devido à hiperinflação). Quem comprava R$ 100 hoje está gastando muito menos do que a metade disso.
“Varejo teve queda assustadora”
Na avaliação do presidente do Sindilojas de Gravataí, José Rosa, os efeitos no comércio foram mais visíveis no último trimestre – seis meses após a última leva de demissão da GM, que ocorreu em abril de 2016 –, quando o período de pagamento do seguro-desemprego da maioria dos trabalhadores desligados da GM já havia encerrado:
– O varejo teve queda de vendas assustadoras, só resistiu quem estava muito bem organizado.
Quem tem estabelecimento comercial no Centro percebe que até o movimento nas ruas diminuiu.
– Hoje, a gente vê metade das pessoas do que era antes caminhando na calçada – comenta Fabrício Euzébio Sassi, proprietário do restaurante Toscana.
O empresário de Carlos Barbosa decidiu apostar na cidade em 2011, quando identificou uma oportunidade de investimento em Gravataí. Até 2014, era comum ver o restaurante lotado e fila de clientes. Nos últimos dois anos, com o cenário em transformação, Fabrício estima que perdeu 30% do movimento. E não recuperou mais. Hoje, serve 2 mil almoços por mês a menos do que no passado:
– A crise que chegou nos restaurantes de Porto Alegre em 2016 nós começamos a sentir bem antes. Até 2014, foi muito bom. Hoje, não tem espaço para outro restaurante aqui no Centro.
Quem seguiu frequentando o restaurante trocou o bufê livre pela modalidade a quilo (mais barata dependendo do consumo), diminuiu ou cortou a bebida e já não vai mais com a mesma frequência.
– O movimento do começo do mês durava até o dia 20. Hoje, não passa do dia 10 – compara ele.
Em 2016, Fabrício precisou demitir seis dos 20 funcionários e, para não perder mais clientes, aumentou apenas R$ 1 o bufê livre nos últimos dois anos. De R$ 18, passou a R$ 19.
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"Se a GM está bem, nós estamos bem"
A avaliação que a gerente do Hotel Gravataí Center, Claudia Regina Rodrigues Turis, fez da relação da cidade com o desempenho da sua maior empresa talvez seja o que melhor defina o atual momento:
– Se a GM está bem, nós estamos bem.
A montadora, sozinha, contribui com 50% do total de retorno de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) da cidade, segundo o secretário da Fazenda, Davi Keller. Para 2017, já é esperada uma queda de 4% no retorno do ICMS em relação ao ano passado. Outro termômetro importante para a cidade é o número de alvarás, que caiu 35% de 2014 para 2016.
O atual momento da GM enfraqueceu como nunca o movimento de hóspedes no hotel de Claudia. Dos 50 quartos disponíveis – que tinham lotação sempre elevada entre março e dezembro, principalmente de executivos que vinham visitar a montadora –, apenas de dez a 15 normalmente estão ocupados.
– Para nós, mudou da água para o vinho. Em nenhum momento nos dois últimos anos, houve lotação máxima – afirma Claudia.O restaurante que funcionava no prédio do hotel chegou a fechar neste período, por falta de clientes.