"Peço silêncio, Sergio Moro vai falar", disse o mestre de cerimônias. E um silêncio como poucas vezes se vê em solenidades no Brasil se impôs no Teatro da Feevale, em Novo Hamburgo. Era grande a vontade de ouvir o juiz paranaense que virou mito ainda em vida, endeusado por uns, amaldiçoado por outros.
Moro, magistrado titular da 13ª Vara Federal de Curitiba, tem sido brindado com o título de "homem do ano" em diversas publicações, desde 2014, por ter se tornado o julgador e o rosto mais conhecido da maior investigação de corrupção já desencadeada no país, a Operação Lava-Jato. Pois esse polêmico juiz, inspirador de um movimento de massas por limpeza na política que varreu o Brasil nos dois últimos anos, esteve no Rio Grande do Sul nesta quarta-feira para palestrar.
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Moro foi convidado do Grupo Editorial Sinos para conferência na Feevale, em Novo Hamburgo. De quebra, prestigiou o lançamento da edição em português do livro Operação Mãos Limpas – a verdade sobre a ação que inspirou a Lava-Jato, escrito por três italianos e cujo prefácio em português é dele, Sergio Moro.
Pois Moro provou que é garantia de plateia cheia. O Teatro da Feevale tem 1,8 mil lugares e todas as cadeiras foram ocupadas, mesmo com ingressos que estão longe de ser baratos – variavam de R$ 60 a R$ 90 (nas posições próximas ao palco).
Moro bem que tentou escapar da multidão. Passou parte da tarde no hotel Deville em Porto Alegre e parte em Novo Hamburgo, visitando jornais e repousando no camarim do teatro. O problema é que a multidão não desistiu de Moro.
A fila que se formou na entrada poderia ser de profissionais do Direito, com seus ternos e tailleurs bem cortados – e eles se fizeram presentes, em grande número, perfumados e educados. Mas não eram só eles. A plateia que tomou conta do magnífico Teatro da Feevale era eclética. Médicos, educadores, agrônomos, jornalistas (muitos), donas de casa sem diploma superior, mas com muito fervor cívico. Gente de todo tipo e ideologias diversas esperava por Moro. Até quem não gosta dele veio assistir sua palestra. É o caso da estudante de Direito Priscila Kichler, que está no nono semestre, na Feevale.
– Não concordo com a postura dele. É um sujeito midiático, distante do que um juiz deve ser. Mas tenho de conferir como é, de perto – define ela.
Colega de Priscila no mesmo semestre, Maria Júlia de Ávila não chega a ser crítica de Moro.
– Apenas curiosa, não tem como deixar de assistir – confessa ela.
Mas foi possível constatar que grande parte (talvez a maioria) dos presentes no teatro queria mesmo ver seu herói, em carne, osso e terno bem cortado. A bancária Lenise Staudt define Moro como um exemplo para o Brasil.
– Ele me inspira, faz pensar em dias melhores. É alguém que teve coragem de lutar contra a corrupção – resume.
O veterinário aposentado Ernani Rohr, ligado à Feevale, chega a falar de Moro com familiaridade, embora não conheça o juiz pessoalmente.
– Gosto do Sergio. Teve coragem de enfrentar a corrução histórica desse país. É preciso mais gente como ele – define.
Ernani e Lenise sequer se importaram de serem revistados duas vezes por policiais, uma na entrada do teatro, outra na fila de entrega das entradas. Moro, aliás, contou com aparato de segurança digno de chefes de Estado. Além de cinco viaturas da BM e três da Polícia Civil em frente ao teatro, pelo menos 10 policiais federais (homens e mulheres) formavam uma fila à espera de quem entregava os ingressos. Vestidos com discrição, observavam a tudo e a todos. Havia temor de protestos. Eles não ocorreram.
– Imaginava que estava diante de um simples caso criminal quando começou a Lava-Jato. Mas tudo foi tomando uma dimensão maior e talvez tenha algo a dizer sobre a qualidade da nossa democracia – discursou Moro, ao rememorar dois anos de julgamentos.
A palestra teve Hino Nacional. Teve aplausos em pé. Teve vivas. Teve espetáculo. Teve Moro, que falou de Lava-Jato sem falar de Lula e outros políticos, evitando polêmicas. Foi mais juiz e, por isso, menos controverso.