O prefeito de Porto Alegre José Fortunati foi multado em R$ 1,5 mil pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) por não apresentar um plano detalhado com ações para aumentar a oferta de vagas na educação infantil da Capital. A decisão, da qual cabe recurso, foi tomada em sessão plenária na tarde de ontem.
Fortunati tinha até 30 de junho para apresentar ao tribunal uma série de propostas que ampliassem e melhorassem de forma progressiva o serviço ofertado às crianças no município. O TCE aponta um déficit de 13.942 vagas para crianças de zero a cinco anos na Capital, usando como base dados do IBGE e do DataSus.
A determinação do órgão ocorreu após o julgamento de uma inspeção especial que analisou itens quantitativos e qualitativos do serviço ofertado na Capital. Entre as informações apontadas pelo relatório, divulgado no ano passado, está a de que Porto Alegre possui a menor oferta de vagas no país para crianças entre zero e cinco anos em escolas da rede municipal.
Conveniadas
Outro ponto importante, conforme o voto do relator do processo, conselheiro Cezar Miola, é a diferença de atendimento entre alunos da rede própria e da rede conveniada. Ao realizar o relatório, o auditores do TCE verificaram que a rede conveniada – na qual o custo por aluno/ano é de R$ 3 mil, frente aos R$ 8,8 mil de uma Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) – tem condições inferiores de atendimento em relação às Emeis.
Além do custo por aluno ser 65% menor, as conveniadas têm qualidade menor em itens que vão desde o espaço de recreação e cardápio até a edificação dos prédios, mantidos, na maioria das vezes, por associações comunitárias.
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Turmas fechadas
Segundo a Defensoria Pública, em junho foram fechadas 28 turmas de berçário e maternal na Capital, o que impossibilitou a matrícula de 397 crianças de zero a três anos. A 1ª Defensoria Pública Especializada em Infância e Juventude instaurou um Procedimento para Apuração de Dano Coletivo, que verificou que as turmas foram fechadas para suprir as vagas para quatro a cinco anos – estratégia para atingir a meta do PNE, que é atender a 100% das crianças na faixa etária até o final de 2016.
Prefeitura contesta decisão
A secretária de Educação de Porto Alegre, Cleci Jurach, contesta a decisão do TCE. Ela informa que a prefeitura entregou o plano de ação com a previsão de atendimento de demanda futura de crianças com base em escolas que estão em obras. Cleci insiste que o déficit de vagas para crianças de quatro a cinco anos está zerado. Já na faixa de zero a três anos, reconhece que 37% das crianças não são atendidas.
– Não se pode fazer estimativa em cima de um censo de dez anos atrás. Trabalhamos em cima de uma demanda definida pela procura de vagas no período de matricula, que é no final do ano – justifica.
Segundo ela, a busca ativa de crianças, cobrada pelo TCE, é inviável:
– Eles (TCE) têm que nos dizer como fazer a busca ativa. Como iremos na casa todos os porto-alegrenses?
O Tribunal não leva em consideração o desejo da família de colocar a criança em escola privada. Cleci orienta os pais que precisam de vagas para crianças entre quatro e cinco anos a procurarem Secretaria Municipal de Educação:
– A família tem que ir até a Smed. Temos obrigação de acolher estas crianças. Nesta semana, serão inauguradas duas novas escolas infantis, a Nossa Senhora das Graças, no Bairro Lami, e a Jardim Paraíso, na Restinga, totalizando 24 novas escolas inauguradas na Capital desde o início da gestão de José Fortunati, em 2013.
Informe sobre a falta de vagas
- Secretaria Municipal de Educação: Rua dos Andradas, 680, Centro, fone 3289-1788
- Atendimento ao público: de terça a sexta-feira, das 9h às 11h30min e das 14h às 17h30min
Uma difícil realidade
Para o TCE, a prefeitura descumpre um dos princípios do Plano Nacional de Educação (PNE), que é o de realizar a busca ativa das crianças, em parceria com órgãos públicos de assistência social, saúde e proteção à infância. A prefeitura discorda do déficit de vagas apresentado em relatório, mas admite que leva em conta apenas os números de quem foi procurar vaga nas escolas. A realidade enfrentada, por exemplo, por mães do Morro da Polícia, no Bairro Aparício Borges, mostra que a falta de vagas em creches está longe do fim.
Tamara Viana dos Santos, 24 anos, nunca conseguiu escolinha para nenhum dos seus três filhos: Diones, cinco anos, Miguel, três anos, e Pietro, dois anos. O mais velho tinha nove meses quando ela tentou pela primeira vez colocá-lo em creche:
– Já madruguei para tentar vaga e nunca consegui. Por isso, nunca pude trabalhar.
Com atraso
A vaga que Anelise dos Santos, 32 anos, tanto queria só apareceu para a filha Érika, oito anos, quando a criança já estava em idade escolar. Erika tinha quatro anos quando a mãe entrou na lista de espera. Hoje, Anelise ainda sonha com vagas para o caçula Adrian, cinco anos, e para a sobrinha que cria, Maria, de um ano e oito meses:
– A gente espera, espera e ninguém dá retorno – afirma.
A experiência das duas vizinhas só desanima ainda mais Rafaela Pereira da Rosa, 20 anos, mãe de Gabriel, de um ano e nove meses, e de Gustavo, de um mês. Se fosse pagar uma escola particular, gastaria R$ 700 com a mensalidade para os dois meninos:
– Já procurei vagas para Gabriel em quatro escolinhas e não consegui. Quando o meu mais novo fizer quatro meses, vou tentar novamente.