Com o retorno das aulas nesta semana, depois de 53 dias de greve dos professores da rede estadual – na mais longa paralisação dos últimos 25 anos –, as equipes diretivas dos estabelecimentos de ensino da Capital trabalham na construção de calendários para a recuperação do tempo parado.
Cada escola tem a sua particularidade: algumas tiveram adesão total à paralisação, em outras, parcial, e também há aquelas instituições que tiveram ocupação. De acordo com o Cpers, a adesão à greve no Estado foi de 58%.
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Independentemente disso, todas as escolas precisam obedecer o que determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que é o cumprimento de 200 dias letivos. Para o ensino fundamental, é necessário cumprir carga horária mínima de 800 horas anuais e o médio, carga horária mínima de mil horas anuais.
Calendário
De acordo com a diretora do departamento pedagógico da Secretaria Estadual de Educação (Seduc), Márcia Coiro, cada escola fará o seu calendário, que deverá passar pela apreciação do Conselho Escolar para, posteriormente, ser homologado pela Coordenadoria Regional de Educação (Cre).
– Havia um processo pedagógico em andamento que foi interrompido. A nossa preocupação é que seja efetivada a carga horária de cada curso. É inadmissível que o aluno tenha qualquer tipo de prejuízo – afirma a diretora.
Embora cada escola tenha liberdade de montar seu calendário de acordo com a realidade vivida durante a greve, há orientações de base para a recuperação como, por exemplo, a utilização do recesso de julho, dos sábados do segundo semestre, dos dias após o Natal e até mesmo o avanço das aulas durante o mês de janeiro.
– Não adianta trabalhar com os alunos à exaustão. É preciso tranquilidade e bom senso, pois está em jogo a qualidade da aprendizagem – avalia a diretora.
Verdadeiro quebra-cabeças
Na Escola Estadual de Ensino Médio Professor Alcides Cunha, no Morro Santana, o calendário de recuperação dos dias letivos e horas-aula será discutido neste sábado. A diretora Elisabete Guedes da Silva considera que tem um quebra-cabeças a ser montado.
– Queremos ouvir os alunos, o conselho escolar, a comunidade. Vamos negociar (o calendário), não há um modelo único, mas pretendemos recuperar todos os dias e horas para não comprometer o ensino e a aprendizagem – observa o vice-diretor da manhã, Rogério de Barcelos Guimarães.
Segundo Elisabete, as férias de julho já estão comprometidas com a recuperação. Há possibilidade de extensão do turno com um sexto período (para o ensino fundamental), de utilização de sábados, dos dias após as festas de Natal e, possivelmente, uma semana de janeiro.
A escola, que atende a 1,3 mil alunos, viveu realidades distintas durante a greve: do primeiro ao quinto anos, as aulas seguiram normalmente. Os anos finais do ensino fundamental e o ensino médio pararam com 80% das atividades. A escola também foi ocupada por alunos e, durante um período, não permitiram a realização das aulas.
Weslley Jeske, 18 anos, é aluno do terceiro ano do ensino e vai fazer o Enem. Mesmo durante a ocupação e a greve ele não perdeu o contato completamente com os estudos.
– Vai ser difícil recuperar, a gente ficou um bom tempo sem estudar, vou ter que me puxar. Mas neste tempo o cursinho do Enem continuou no noturno, isso ajudou também.
A saída de cada escola
Na Escola Paula Soares, no Centro, o calendário aprovado em assembleia que envolveu a comunidade escolar será de aula durante cinco sábados, no recesso de julho e em 12 dias de janeiro de 2017. Assim, serão recuperados os 26 dias sem aula por conta da ocupação da escola.
De acordo com a vice-diretora do turno da manhã, Sílvia Martins, a escola não foi afetada pela greve porque apenas dois professores paralisaram as atividades.
Já na Escola Cristóvão Colombo, no Bairro Sarandi, a construção do calendário será um pouco mais complexa. De acordo com o diretor Luciano Marcelo Boeira, pelo fato de a greve ter sido parcial, será necessário pensar num calendário a partir da carga-horária de cada professor que cruzou os braços. Além da greve, a escola também passou por um período de ocupação.
– O turno da noite foi o mais atingido. Mas tivemos quatro professores que lecionaram. Terá que ser feita a contagem das horas. Cada vice-diretor sabe a realidade do seu turno – explica.
Há possibilidades de recuperação aos sábados, no recesso de julho e até mesmo em janeiro. No caso dos alunos do diurno, por exemplo, também é possível que se estabeleça a recuperação das aulas no turno inverso e até mesmo no vespertino. Tudo isso será avaliado numa reunião de professores.
Adaptação do currículo
De acordo com Maria Amabile Mansutti, coordenadora técnica do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), os dias sem aulas geram uma defasagem que implica na aprendizagem. O tempo parado, na avaliação da coordenadora, é altamente desmobilizador. Os alunos que terão uma prova pela frente como o Enem, por exemplo, sentirão o impacto da paralisação. Mas Maria Amabile acredita que o professor, tendo um bom plano de trabalho, focado no que é essencial, pode minimizar os efeitos.
A professora da Faculdade de Educação da Ufrgs, Maria Luisa Merino Xavier, afirma que há a necessidade de se fazer adaptações no currículo. Conforme a docente, essa seleção deve ser feita pelos professores, que também podem aproveitar a oportunidade para trazer temas da atualidade – como por exemplo a ocorrência de alagamentos na cidade ser discutida na disciplina de Geografia.
Já a coordenadora pedagógica da Comunidade Educativa Cedac, Maura Barbosa, acredita que antes de olhar para os conteúdos é importante ver o que os alunos deram conta até o momento da paralisação para verificar o que será preciso intensificar. O aluno deve ser o foco do plano de ação, que terá de envolver todos os funcionários da escola.