A Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc) voltou a ser cenário de um episódio que comprova a fama de escritório do crime organizado no Estado.
Está sendo investigado pela Polícia Civil o sequestro da mulher do apenado Fabrício Santos da Silva, o Nenê, considerado líder da facção Os Manos, uma das maiores e mais antigas quadrilhas de tráfico de drogas, assaltos a bancos e a carros-fortes.
O crime ocorreu logo após a mulher visitar Nenê na Pasc. O principal suspeito de encomendar o sequestro é outro preso da Pasc, que exigiu R$ 400 mil de resgate para soltar a vítima.
Um dos suspeitos de arquitetar o crime é Lauri Sávio Cunha, 33 anos, um dos bandidos mais conhecidos da polícia gaúcha com extensa ficha criminal por comandar um grupo de extermínio em Canoas, e de ordenar sequestros de dentro da Pasc. Como vingança do sequestro, dois homicídios já teriam acontecido em Canoas.
Leia mais:
Quadrilha pretendia usar métodos de tortura com parentes para obrigar gerente a liberar acesso a banco
Telefone pode valer até R$ 5 mil em presídios gaúchos
Polícia Civil gaúcha busca entender papel de Nenê, preso pela PF em Foz do Iguaçu
A mulher de Nenê foi sequestrada no começo da noite de 4 de maio, na ERS-401, em Charqueadas, instantes depois de ela deixar a Pasc. O carro foi fechado por outro veículo com equipamento luminoso no teto (existente em viaturas policiais) no qual estavam três homens.
Dois deles, armados e com capuzes na cabeça, entraram no carro da vítima. Um dos bandidos assumiu o volante do veículo, e a mulher foi colocada no banco traseiro, onde seguiu acompanhada por uma outra mulher e uma criança de três anos. Em um momento de distração dos criminosos, ela teria percebido que o carro estava em São Leopoldo.
Levada para um matagal, a vítima teria permanecido nas mãos dos bandidos durante 11 horas, sofrendo tortura psicológica, sendo obrigada a gravar vídeos em celular, despedindo-se dos familiares. Uma cova chegou a ser aberta para enterrá-la. De dentro da Pasc, Nenê, conseguiu contato, via celular, com gente de fora da cadeia que reuniram R$ 400 mil para pagar o resgate.
Por ter antecedentes por crimes semelhantes, a desconfiança recaiu sobre Lauri. Uma revista na galeria dele resultou na apreensão de um celular em poder de um comparsa de facção. O telefone contém registros de conversas via WhatsApp, que fortaleceria a suspeita do envolvimento de Lauri no sequestro. Há, inclusive, uma foto da cova aberta onde a mulher seria enterrada e de maços de dinheiro, supostamente, usados para pagamento do resgate. O crime levou a Justiça a transferir Nenê para o Presídio Central de Porto Alegre.
A Superintendência dos Serviços Penitenciários evita comentar o assunto. Sobre a presença de celulares na Pasc, onde tem scanner corporal e detector de metais para evitar a entrada dos aparelhos, a Susepe informou que faz revistas e apreensões periódicas. Sobre a situação de Lauri, que segue recolhido na Pasc, o órgão também não deu detalhes.
O dinheiro pago na extorsão teria sido entregue à quadrilha de Lauri.
Quem é Fabrício Santos da Silva:
Conhecido como Nenê, tem 33 anos. É apontado como líder da facção Os Manos. Em setembro de 2005, foi preso em flagrante em Santa Maria do Herval após assalto a banco que resultou em confronto com PMs, com saldo de três pessoas mortas (dois comparsas de Nenê e um aposentado de 70 anos, vítima de um infarto). Também foi acusado da morte de um PM à paisana, em tiroteio em frente a uma boate, em Sapiranga, em fevereiro de 2012. Tem condenações que somam 29 anos por roubo e homicídio. Em novembro de 2013, quando estava foragido, foi preso por policiais federais no aeroporto de Foz do Iguaçu, tentando embarcar para Florianópolis com documentos falsos.
Quem é Lauri Sávio Cunha:
Aos 33 anos, já foi condenado a sete anos por assalto e porte ilegal de arma. A pena já está extinta, mas segue preso na Pasc porque é acusado de integrar um quadrilha de tráfico de Canoas, que formou um grupo de extermínio suspeito de matar ao menos 50 pessoas, entre desafetos e consumidores com dívidas (operação policial conhecida como Cova Rasa desvendou esquema de bando armado). Lauri já esteve um ano fora do Estado em penitenciária federal. De volta à Pasc, passou a ordenar sequestros de gerentes de bancos e de gerentes de joalherias em shopping de Porto Alegre, além de pequenos comerciantes e até da filha de um vereador em São Leopoldo. Parte dos crimes não se confirmou porque a Polícia Civil conseguiu evitar.