Três meses depois de visitar a rotina suspensa de quatro trabalhadores afastados pelo regime de layoff, Zero Hora voltou a encontrá-los para mostrar como está a situação daqueles que sofreram o impacto direto da recessão econômica que varre o país. Mais de 41,6 mil pessoas passaram pelo programa de interrupção temporária dos contratos em 2015 e nos dois primeiros meses de 2016. Um dado em ascensão: até o final do ano passado, eram 33,2 mil.
O programa que tem por objetivo salvar empregos manteve a vaga de pouco mais da metade dos cerca de 200 metalúrgicos que tiveram de aderir ao regime na unidade da Gerdau em Charqueadas, na Região Carbonífera, por oito meses. O restante foi demitido ao fim do layoff, em março, sob a justificativa do impacto provocado na fábrica pela baixa demanda da indústria automobilística, principal consumidora de aços da empresa.
Na General Motors (GM) de Gravataí, na Região Metropolitana, quase 800 funcionários estão com os contratos suspensos desde dezembro. Eles devem se reapresentar à empresa em maio. Entre os metalúrgicos, o sentimento é de incerteza em decorrência dos prognósticos que combinam alta da inflação, do juro e do desemprego para os próximos meses.
– O avanço do layoff depende do desempenho do mercado de trabalho. Em geral, é uma medida paliativa. Pode até segurar renda para as pessoas durante um período, com recursos públicos, mas isso depende do desempenho de cada setor – avalia o professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) José Dari Krein.
O mecanismo visa a evitar demissões uma vez que a empresa reduz custos ao deixar de pagar encargos e salários por até cinco meses. No período de layoff, os afastados têm de fazer um curso e recebem bolsa de qualificação que, somente em janeiro e fevereiro deste ano, custou R$ 24,6 milhões ao governo federal oriundos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
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Fabiano e o retorno
Se parte dos funcionários da Gerdau em layoff perdeu o emprego, outra fatia se desfez de parte da angústia e retornou ao serviço ao fim do regime. Fabiano Machado Pereira, 34 anos, compõe a parcela dos que foram reconduzidos ao trabalho. Mas o sentimento de indefinição persiste mesmo que o operador usufrua de estabilidade por integrar a Comissão Interna de Prevenção de Acidentes (Cipa) da empresa, como prevê a legislação trabalhista.
– Para nós, que retornamos, o sindicato avisou: "Não pensem que estão garantidos, porque novas demissões podem vir" – lamenta Pereira.
O metalúrgico conta que o clima era de indefinição até o fim das aulas impostas aos trabalhadores pelo layoff. Na reapresentação, os funcionários se reuniram em uma sala de espera, e um a um, foram chamados por um dos coordenadores. Os que não retornavam haviam sido demitidos.
– Aqueles que conseguiam passar pela gente faziam assim, ó – relata Pereira, relembrando a cena ao passar a mão pelo pescoço em sinal de degola.
Mesmo com o emprego garantido, ele se diz solidário aos colegas dispensados que, durante o período de afastamento, compartilharam do mesmo sentimento de indefinição. Muitos, como Pereira, buscaram complementar a renda por meio de bicos com temor de que o emprego não fosse mantido. Isso porque, como deixou de receber horas extras e adicional noturno, o metalúrgico viu o rendimento cair durante o layoff. Tarefas adicionais como auxílio em obras e corte de grama lhe renderam uns R$ 500 por mês.
– Estamos controlando os gastos em tudo: o banho está mais curto, o rancho mais magro – resume.
Ronaldo e a demissão
O principal temor de trabalhadores que entram em layoff recaiu sobre o técnico em eletromecânica Ronaldo Fernandes, 36 anos. Em 21 de março, oito meses depois de se ver obrigado a substituir a rotina de serviço na unidade da Gerdau, em Charqueadas, por um curso, reapresentou-se à empresa e recebeu a notícia de que seria desligado.
– Até o dia anterior, não sabia o que aconteceria. Mas, sempre contei com o pior – conta.
Os 17 funcionários da equipe em que Fernandes atuava foram chamados para uma sala, onde a chefia traçou uma explicação sobre o impacto da crise financeira na indústria de aço. Do recinto, todos saíram sem emprego.
Conforme o Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Charqueadas (Sindimetal), cerca de 200 funcionários da Gerdau entraram em regime de layoff em julho do ano passado. Desses, 76 acabaram dispensados ao fim do programa, que, inicialmente, duraria cinco meses. Depois, alongou-se por mais três. Em nota, a empresa apontou que o corte de postos de trabalho mostrou-se como o "último recurso após a tomada de uma série de medidas para evitá-lo".
Quando demitido depois do afastamento por layoff, o funcionário perde o direito de receber o seguro-desemprego. Entretanto, um acordo entre o sindicato da categoria e a Gerdau garantiu pagamento de cinco meses do auxílio aos dispensados. É com esse recurso que Fernandes irá custear despesas enquanto busca se recolocar num mercado de trabalho que tem fechado mais portas do que abriu.
Fernandes adotou o corte de gastos pela indefinição de quando conseguirá uma recolocação. Tem desembolsado apenas para o básico, excluindo o que considera supérfluo do dia a dia.
Já no início do layoff, a incerteza no retorno à empresa fez o técnico começar a procurar emprego. Ele costumava encaminhar cinco currículos a cada mês. Desde a demissão, perdeu a conta de quantos já enviou:
– Foram muitos. Mesmo.
Em maio, Alessandro terá de se reapresentar à GM em Gravataí. Seu futuro e o dos colegas está indefinido
Alessandro e a preocupação
Encaminha-se para o fim o curso do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) que o metalúrgico Alessandro Lopes da Silva, 36 anos, começou a frequentar em dezembro passado. O término das aulas, um dos requisitos que o trabalhador em layoff tem de cumprir para receber o pagamento da bolsa qualificação, representa, também, o fim do programa adotado pela General Motors (GM) e o retorno do funcionário ao serviço.
Pelo menos, essa representa a expectativa de Silva e mais 790 colegas da unidade da empresa em Gravataí, na Região Metropolitana, que tiveram o contrato suspenso na esperança de salvar seus empregos. Mas a apreensão pelo retorno cerca os funcionários, uma vez que o agravamento da recessão torna a manutenção dos postos uma incerteza.
– Temos a consciência de que a empresa pode não precisar mais do nosso serviço. Claro, todos estão preocupados. Temos famílias para manter e contas a pagar – diz o metalúrgico.
O curso termina em 20 de abril. Doze dias depois, os funcionários devem se reapresentar à GM, que informou, por meio da assessoria de imprensa, que ainda não há uma definição sobre o futuro dos trabalhadores em layoff. Pela lei, a empresa pode prorrogar o regime por mais cinco meses, desde que assuma os custos das bolsas pagas aos trabalhadores. Não é o que deseja Silva.
Ronaldo e a descrença
Pouca esperança de retorno ao terceiro turno de produção tem o metalúrgico Roberto Bacchi, 36 anos. Ele teve o contrato suspenso há quase cinco meses pela fábrica da General Motors (GM) em Gravataí, na Região Metropolitana, e, junto aos colegas, compartilha da angústia de não saber o que o futuro lhe reserva.
O Sindicato dos Metalúrgicos de Gravataí indica que um quarto do total de trabalhadores do complexo foi afastado pelo programa de layoff – fração que dimensiona a crise vivida pelo setor automobilístico.
– O clima está horrível. Havia a expectativa de que alguma coisa mudasse na economia, mas não aconteceu nada. Passa o tempo, chega a hora de retornar e as notícias são as piores possíveis – desabafa Bacchi.
Angustiado pela descrença na retomada do setor, o metalúrgico planeja trocar de área para evitar a condição de desemprego. Ele começou um curso de eletricista predial e pretende ingressar na construção civil. Enquanto isso, admite:
– Estou atacando em tudo quanto é área. Serralheiro, jardineiro, em obras, como segurança. Tem de fazer entrar o dinheiro. De alguma maneira.
Os bicos serviram para agregar R$ 1 mil por mês à renda familiar do metalúrgico. Mas a preocupação não tem fim. Isso porque, caso venha a ser desligado, o temor é em ficar sem o seguro-desemprego.