As poucas obras federais de infraestrutura no Rio Grande do Sul, que já andavam em ritmo lento, devem ser suspensas por tempo indeterminado nas próximas semanas devido à crise econômica. Sem recursos para repassar às empreiteiras, a diretoria colegiada do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) aprovou na terça-feira uma proposta de paralisação dos contratos de supervisão e obras de construção rodoviária da autarquia. Na prática, isso significa que projetos como a nova ponte do Guaíba, a travessia urbana de Santa Maria e o contorno de Pelotas deverão ser engavetados temporariamente.
Na sexta-feira, após o Dnit admitir publicamente a possibilidade de suspensão das obras por meio de nota oficial, entidades criticaram a decisão do órgão, que dependerá da avaliação dos ministérios dos Transportes, do Planejamento e da Casa Civil. Para efetivar a paralisação dos contratos, é preciso que as empresas sejam notificadas, assinem um termo e depois o documento seja publicado no Diário Oficial da União. Embora isso ainda não tenha ocorrido, as empreiteiras dão como praticamente certa a interrupção do trabalho.
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O presidente do Sindicato da Indústria da Construção de Estradas do RS (Sicepot), Ricardo Portella, prevê como uma das principais consequências da medida a demissão de cerca de mil empregados, entre operários e funcionários de níveis médio e superior. Segundo Portella, o setor chegou a contar com 25 mil trabalhadores no início de 2014, mas o agravamento da recessão fez com que o número caísse para os atuais 3,5 mil.
– Isso tudo significa que o custo logístico do Rio Grande do Sul vai ficar mais alto. Quando um caminhão precisa ficar uma hora e meia parado esperando para passar pela ponte do Guaíba, quem também paga é o consumidor. A logística mais cara significa produto mais caro e menos rentabilidade para o produtor – resume Portella.
Previsões de término não serão cumpridas
Os integrantes do Movimento Ponte do Guaíba afirmam que as obras no local já estão praticamente paradas e que há cerca de cem funcionários trabalhando no canteiro, sendo que o número considerado ideal para cumprir o cronograma de conclusão da travessia, em 2017, seria de mil trabalhadores. Desde fevereiro, a obra evoluiu apenas 3%, em um ritmo que não permitirá o término na data prevista.
Além da suspensão das obras, o Dnit deve interromper contratos de conservação de rodovias no Estado e manter apenas operações tapa-buracos.
– Isso é muito ruim porque o maior volume de tráfego está nas estradas federais. Fazer tapa-buracos em uma estrada pequena resolve o problema do município, mas isso, em uma estrada movimentada, como a BR-290 e a BR-116, não dura nada, vai ser dinheiro que vai ter de ser reposto depois – critica Portella.
Raio x das obras (total concluído)
SEGUNDA PONTE DO GUAÍBA – 30%
CONTORNO DE PELOTAS Lote 1A – 96% / Lote 1B – 79%
TRAVESSIA URBANA DE SANTA MARIA (foto abaixo) – 20%
Já paradas
DUPLICAÇÃO DA BR-116 – 58%
DUPLICAÇÃO DA BR-290 – 1,5%
DUPLICAÇÃO DA BR-386 (TABAÍ-ESTRELA) – 91,6%
Retrabalho preocupa construção civil
Além das consequências imediatas, como a demissão de trabalhadores e o atraso na conclusão do trabalho, a suspensão das obras federais de infraestrutura pode custar caro no futuro, quando as construções forem retomadas. Projetos como as duplicações de trechos da BR-116, da BR-290 e da BR-386, que foram interrompidos por falta de recursos, podem ter preço de 20% mais caro no momento da retomada, segundo estimativa de empresas ligadas ao setor. O caso da nova ponte do Guaíba é ainda mais preocupante, por envolver máquinas de grande porte.
– Só para retirar os equipamentos e depois trazê-los de volta, vai ter um grande custo. São guindastes que pesam toneladas. Quanto tu desativas uma obra, tu recolhes máquinas, pessoal. Há um custo para retomar. A decisão do Dnit é péssima. Seria melhor manter as obras em um ritmo mais lento do que desativar completamente – afirma o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Estado (Crea-RS), Melvis Barrios Junior.
Outro problema que deverá ser enfrentado quando as obras forem retomadas é a necessidade de refazer muitos serviços. Trechos das duplicações que ficam expostos a intempéries climáticas já foram afetados nos últimos meses e terão de passar por reestruturações.
– Essas obras vão ter perdas de serviços que foram executados, que foram paralisados de uma maneira desordenada e que terão de ser refeitos depois. Mas o maior prejuízo para a sociedade não é fazer duas vezes a obra, é não ter ela pronta – explica o presidente do Sindicato da Indústria da Construção de Estradas do RS (Sicepot), Ricardo Portella.