Pelos corredores, salas e gabinetes do Congresso, ninguém duvida que, sem a atuação hábil do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o impeachment de Dilma Rousseff não teria sido aprovado na sessão deste domingo. O sim ao afastamento, sustentado por ampla maioria, significa uma vitória de Cunha. Isso o fortalece, mantém em seu entorno um círculo de mais de cem parlamentares protetores e aumenta a sensação de que "ele faz a Casa andar".
Mas há o contraponto. Para muitos deputados, inclusive alguns correligionários, Cunha não suportará o avanço das investigações da operação Lava-Jato. Ele já é réu no Supremo Tribunal Federal (STF), acusado de receber propina do esquema de corrupção da Petrobras. No Conselho de Ética da Câmara, responde a processo por quebra de decoro parlamentar por supostamente ter mentido na CPI da Petrobras, quando disse que não tinha contas no exterior. Esses elementos, somados à pressão do PT e às críticas da população, podem levar à queda de Cunha.
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Aliados de peemedebista pretendem fazer um acordo. A opção mais citada seria aprovar no Conselho de Ética um relatório que peça uma punição mais branda, como a suspensão temporária do mandato, o que lhe preservaria como parlamentar até janeiro de 2019. O deputado Carlos Marun (PMDB-MS) confirma a estratégia.
– Acredito que a situação do Eduardo tem de se resolver no STF. Se tivéssemos voto secreto aqui na Câmara, com certeza ele teria 300 votos para ficar. Como presidente, ele é admirado. O problema é que a pressão popular pode fazer efeito no plenário – avaliou Marun.
O relator do processo por quebra de decoro no Conselho de Ética, deputado Marcos Rogério (DEM-RO), pretende apresentar seu parece no caso Cunha até o final de maio. Ele conseguiu reuniu maioria no colegiado. Articulou a saída de Fausto Pinatto (PP-SP), que votava contra ele, e fez ingressar a deputada Tia Eron (PRB-BA), dona de referências elogiosas ao peemedebista.
– Maioria na comissão o Eduardo já tem. Lá, ele deve ganhar. Até pode vir ao plenário se apresentarem recurso, mas, ganhando na comissão, fica mais difícil cassar. A alternativa é uma pena mais branda – diz Paulinho da Força (SD-SP).
Quem conhece Cunha avalia que a hipótese de renúncia à presidência da Câmara é improvável. Neste cenário, ele abriria mão do comando da Casa e seria preservado pelos seus pares. Peemedebistas o descrevem como "obcecado", de perfil antagônico àqueles que aceitariam a renúncia.
– Depois dessa vitória (no impeachment)? Sem chance – avaliou Paulinho.
Mas a pressão para Cunha sair pode vir de dentro de casa. O PT irá reforçar o discurso de que o impeachment, caso confirmado no Senado, o tornará "vice-presidente". Como é réu, não pode assumir a presidência em caso de ausência de Michel Temer, mas a simbologia da sua presença e proximidade do poder poderá se tornar um estorvo.
– Isso (saída de Cunha) estará na pauta, sem dúvida – confidencia um parlamentar do PSDB.
Deputados do próprio PMDB entendem que, com o fim do processo na Câmara, Cunha perderá o seu escudo: enquanto o impeachment corria na Casa, ele contava com um fato mais relevante para retirar o foco das atenções de si.
– Acho que ele não resiste à Lava-Jato. Não há um banco estrangeiro sem conta dele. Com essa narrativa do PT de que ele está se tornando vice-presidente, se vier ao plenário, ele está morto – diz um peemedebista.
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Entre os governistas, a palavra de ordem é acelerar os ataques contra Cunha. Virou questão de honra dar o troco e cassar o mandato do algoz, o segundo político, depois de Roberto Jefferson (PTB-RJ), que desafiou o PT em 13 anos de poder.
– O PMDB negociou uma rede de proteção (para Cunha). Ela não tem um script pronto para o final, é mais ou menos como se escrevem algumas novelas, depende de como vier o tiroteio contra ele, mas obviamente ele trabalha para eleger um governo que vai protegê-lo. Temer nunca falou uma frase contra Cunha – analisa o deputado Henrique Fontana (PT-RS), que costuma chamar o presidente da Câmara de "um dos políticos mais corruptos da história do Brasil".