O Tribunal Europeu de Direitos Humanos (TEDH) rejeitou nesta quarta-feira o recurso da família do brasileiro Jean Charles de Menezes, morto pela polícia britânica por engano em 2005, ao confundi-lo com um terrorista duas semanas depois de uma série de atentados em Londres. O tribunal de Estrasburgo afirma que a Justiça britânica realizou uma "investigação efetiva" sobre sua morte, embora "nenhum dos policiais envolvidos" tenha sido alvo de procedimentos penais individuais.
"As autoridades do Reino Unido não faltaram com a obrigação que tinham (...) de realizar uma investigação efetiva sobre a morte do senhor Menezes", estimou.
A decisão, adotada por 13 dos 17 juízes da Grande Câmara do TEDH, a instância suprema do tribunal, é definitiva. A família do brasileiro questionava o tratamento judicial do caso, porque nenhum policial foi alvo de procedimentos penais individuais, já que o Ministério Público considerou que não havia provas suficientes para processá-los.
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O caso ocorreu em um contexto de tensão e de luta antiterrorista após os atentados suicidas lançados nos transportes londrinos em 7 de julho de 2005, e desencadeou uma polêmica na Grã-Bretanha. A polícia, que seguia a pista de dois suspeitos que viviam no mesmo endereço que Jean Charles de Menezes, seguiu o brasileiro, eletricista de 27 anos, em 22 de julho. Na véspera, uma série de bombas não detonadas foram encontradas em várias estações de metrô e ônibus de Londres.
Policiais das forças especiais, convencidos de que se tratava de um suicida, dispararam contra Jean Charles quando ele ia entrar no metrô em direção ao seu trabalho e o mataram com vários tiros na cabeça.
– Neste caso, um homem completamente inocente foi morto deliberadamente por agentes do Estado – lembrou na audiência, em junho de 2015, Hugh Southey, advogado da prima de Jean Charles, que apresentou o recurso ante o tribunal de Estrasburgo.
A representante das autoridades britânicas, Clare Montgomery, respondeu que os policiais não foram processados porque o Ministério Público considerou que estavam convencidos de que se tratava de um suicida. No entanto, a Scotland Yard foi alvo "em seu conjunto" de um procedimento judicial e condenada a pagar uma multa importante por suas falhas neste caso, acrescentou.
A legítima defesa em questão
Uma comissão de investigação independente da polícia havia decidido na época tomar ações disciplinares. E em 2008 uma investigação judicial sobre as circunstâncias da morte (procedimento sem acusado e, portanto, sem condenação possível) terminou em um veredicto aberto, já que o júri não pôde determinar se a polícia havia agido ou não em legítima defesa.
O TEDH considerou compreensível a frustração dos familiares da vítima, mas ao mesmo tempo afirmou que "a decisão de não lançar procedimentos judiciais contra nenhum dos agentes a título individual não se deveu a deficiências da investigação nem a uma cumplicidade ou tolerância do Estado" em relação à ação dos policiais.
Nos debates também foi tema central a definição da legítima defesa aplicada no Reino Unido: basta que os policiais demonstrem que "acreditaram honestamente" que a utilização da força era absolutamente necessária, sem a necessidade de apoiar esta convicção em argumentos razoáveis. Mas os juízes de Estrasburgo não consideraram que esta definição violava a Convenção Europeia de Direitos Humanos.
Nenhum parente da vítima nem o advogado da autora da ação acompanharam o veredicto, que foi pronunciado na presença do representante permanente britânico ante o Conselho da Europa, Christopher Yvon, que não quis fazer comentários.