A delação premiada de Delcídio Amaral, senador do PT do Mato Grosso do Sul, divulgada nesta quinta-feira pela Revista IstoÉ, cita os nomes de dois desembargadores do Tribunal de Justiça (TJ) de Santa Catarina. Segundo a publicação, um dos magistrados teria sido procurado pelo ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para votar pela soltura de empresários presos pela operação Lava-Jato no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A delação premiada do senador ainda não foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Cardozo negou as informações de Delcídio (leia o contraponto abaixo).
O documento diz que "é indiscutível e inegável a movimentação sistemática do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e da própria presidente Dilma Rousseff no sentido de tentar promover a soltura de réus presos no curso da referida operação".
De acordo com a delação divulgada pela IstoÉ, a procura pelo desembargador catarinense Newton Trisotto ocorreu quando a primeira estratégia do governo deu errado. A "primeira investida do Planalto para tentar alterar os rumos da Lava Jato em 07/07/2015 (18 dias após a prisão de Marcelo Odebrecht e Otávio Azevedo) entre Dilma, José Eduardo e o presidente do STF, Ricardo Levandowski, (ocorreu) numa escala em Porto (Portugal) para supostamente falar sobre o reajuste de verbas do Poder Judiciário".
O encontro, porém, teria sido para tratar da mudança nos rumos da operação, segundo Delcídio. A posição de Levandowski teria sido de não se envolver. Por isso, então, houve uma mudança nos planos em que o nome do ex-presidente do TJ-SC, Nelson Schaefer Martins, é citado, conforme diz a delação:
"Em virtude da falta de êxito na primeira investida, mudou-se a estratégia, que se voltou, então, para o STJ, José Eduardo (Cardozo) esteve em Florianópolis em agenda institucional... ... A ideia era indicar para uma das vagas no STJ o presidente do TJ de Santa Catarina, Nelson Schaefer. Em contrapartida, o ministro convocado, Dr. Trisotto, votaria pela libertação dos acusados Marcelo Odebrecht e Otavio Azevedo. A investida foi em vão porque Trisotto se negou a assumir tal responsabilidade espúria. Mais um fracasso de José Eduardo em conseguir uma nomeação”.
A informação de Delcídio bate com a visita de Cardozo a Florianópolis nos dias 24 e 25 de julho do ano passado, dias depois de a primeira tentativa do governo não dar certo em Portugal. Naquele dia, o ministro da Justiça esteve em Santa Catarina para se reunir com representantes da segurança pública do Estado e para entregar equipamentos.
Trisotto atuou no STJ até outubro do ano passado como ministro convocado na vaga derivada da aposentadoria de Ari Parglender. Em agosto de 2015, o colunista do DC Moacir Pereira publicou um texto que exaltava a atuação do catarinense na luta contra a corrupção.
Contraponto
Nelson Schaefer Martins responde
Procurado pela reportagem do DC, o presidente do TJ-SC, Nelson Schaefer Martins, afirmou que não se encontrou com o então ministro da Justiça José Eduardo Cardozo em Florianópolis e que jamais conversou com ele qualquer palavra sobre o tema a que Delcídio Amaral se refere.
– Afirmo peremptoriamente que não fui procurado em momento algum para tratar disso. O ministro da Justiça não falou comigo em Florianópolis em momento algum.
O presidente do TJ-SC relembra que no período em que seu nome constou da lista tríplice do STJ ele teve encontros e fez contato com autoridades, mas que nunca discutiu qualquer assunto referente à soltura dos empresários.
– Entre o momento em que os nomes da lista tríplice foram definidos e a decisão da presidente Dilma, transcorreram-se quase 180 dias e, nesse período, tive contato com muitas autoridades do Legislativo e do Executivo, mas repito que em nenhum momento houve qualquer sugestão ou referência a isso. Isso nunca aconteceu.
Martins explica que se encontrou com Cardozo apenas uma vez durante o processo de escolha do magistrado que assumiria a vaga no STJ.
– Estive em visita a ele no seu gabinete, em Brasília, mas foi uma visita protocolar, agendada por ele, como acontece com todos os candidatos de listas tríplices. São entrevistas de questões institucionais e esse assunto jamais aconteceu.
Sobre o desembargador Trisotto, Martins acresdita na honestidade intelectual e na correção do colega de magistratura.
– Trisotto é um homem admirável que cumpriu com seu dever e atendeu aos ditames de sua consciência durante toda a sua permanência no STJ.
Newton Trisotto responde
Via assessoria de imprensa do TJ-SC, o desembargador afirmou que: “Nunca, em qualquer tempo e lugar, por qualquer pessoa, fui procurado para tratar deste assunto”.
José Eduardo Cardozo responde
Na tarde desta quinta-feira, na posse do novo ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que deixou o cargo, negou envolvimento nos fatos e disse que não negociou cargos no STJ.
Sobre a primeira tentativa de soltura dos empreiteiros, na conversa entre Dilma e Lewandowski, Cardozo diz que o encontro ocorreu para debater o aumento do salários dos servidores do Judiciário, na época. E que se fosse para fazer algum contato sobre o assunto, o ministro Lewandowski não seria o caminho pois ele não era responsável pelo processo e apenas presidia o STF.
Cardozo também falou especificamente sobre o trecho em que Delcidio cita a negociação com os desembargadores de Santa Catarina:
– Estive várias vezes em Santa Catarina, para reunião do Mercosul, entrega de equipamentos, fiz recentemente uma ida à Polícia Rodoviária Federal (PRF), todas documentadas pela imprensa. Em nenhuma tive contato com o ministro Trisotto. Por que diabos eu iria a Santa Catarina para se reunir com o ministro Trisotto se ele atuava em Brasília? – rebateu Cardozo.