Mesmo cortando cargos comissionados, reduzido despesas e diminuído o ritmo da máquina pública no final do ano passado, os prefeitos das sete principais cidades de Santa Catarina iniciaram 2016 com uma dura missão: evitar que a redução de recursos afete diretamente a população. Parte das prefeituras já admite que será difícil fazer com que isso não ocorra. Um levantamento feito pelo Diário Catarinense aponta que os municípios programam novos cortes neste começo de ano para que a situação não se agrave até dezembro.
Os administradores municipais se veem diante de um cenário complicado: escolher em quais áreas os cortes serão feitos. A maioria busca alternativas que não afetem saúde e educação.
– Tudo que fizemos até hoje foi pensando primeiramente em não afetar diretamente o dia a dia das pessoas. Porém, daqui para frente, os cortes começam a afetar. As revisões de contratos, por exemplo, inicialmente trabalhamos em contratos internos, que interferem mais no dia a dia da administração do município. Mas agora estamos partindo para contratos que acabam impactando a população, como nas secretarias de Serviços Urbanos, Obras, Fundação Cultural e de Esportes. Algumas coisas que estavam programadas vão ter que aguardar – analisa o secretário da Fazenda de Blumenau, Alexandro Fernandes.
Na cidade do Vale do Itajaí, o ICMS teve queda de 6% em janeiro e de 15% em fevereiro. A mesma redução de receita obtida com impostos ocorreu nas outras cidades do levantamento. Florianópolis foi o único dos sete municípios a não ter queda real da arrecadação, mas todos os valores ficaram abaixo da inflação.A professora de economia e finanças da Udesc Ivoneti Ramos defende que a ação ideal dos prefeitos é melhorar a gestão nos municípios. Como isso não é possível a curto prazo, os cortes se mostram mais eficientes. Porém, ela entende que a medida correta é organizar a própria estrutura administrativa para evitara redução na aplicação de recursos. Segundo a especialista, outro ponto problemático é a folha de pagamento. Em Itajaí, por exemplo, sem contar com as autarquias, o valor representa 60% da receita do município.
– E vai haver um problema maior esse ano porque os orçamentos foram reajustados num percentual menor que o da inflação e o reajuste dos servidores é baseado na inflação – explica Ivoneti.
A professora lembra que o atual momento da crise serve como lição para que os prefeitos possam reorganizar suas gestões a fim de evitar que sejam necessários novos cortes:
– As crises existiram desde os primórdios, mas, quando se tem métodos de fazer gestão de crise, é possível amenizar. A gente vai sentir muitos nos próximos dois anos, os desafios são grandes.
Colaboraram Felipe Lenhart, Lucas Paraizo e Darci Debona
Criciuma
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
A prefeitura tem dados consolidados preliminares de janeiro do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), que indicam uma queda de 15,56% em comparação com janeiro de 2015. Se for considerada a inflação, a queda sobe para 26,5%. Em janeiro, somente em FPM, a prefeitura deixou de receber R$ 1,2 milhão. Em relação ao ISS, a queda gira em torno de 5% a 6% nos últimos meses. O ICMS, segundo a prefeitura, não está negativo, mas não corrige nem a inflação.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
A folha de pagamento consome 42% da receita da prefeitura de Criciúma.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
A prefeitura afirma que já fez cortes em 2015 e segue em 2016 com o controle de gastos. A Secretaria da Fazenda criou uma comissão que analisa todos os gastos. Eles precisam ser aprovados pelo grupo antes de efetivados. Entre março e abril deste ano, haverá a demissão de 400 servidores por conta de uma decisão judicial. Ao todo, somando as demissões de 2015, são 1,2 mil servidores a menos. Atualmente, a prefeitura tem 5 mil trabalhadores.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
A prefeitura admite que terá de diminuir serviços. Saúde e educação devem ser os menos impactados. A Secretaria da Fazenda afirma que obras podem ser postergadas para que os investimentos nas duas áreas ocorram.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
A prefeitura afirma que não há previsão concreta diante da crise nacional causada pelo cenário econômico e político.
Temos que trabalhar com a nova realidade. A situação se agrava a cada dia, não por conta de má gestão, mas por conta da queda da arrecadação. Vamos ter que fazer novos cortes. Os gastos são mínimos e qualquer gasto tem que ser controlado.
Cloir Dassoler, secretário da Fazenda de Criciúma
Blumenau
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
Já em 2015, houve queda de 7% em relação a 2014. Neste ano, o retorno de ICMS, que representa 30% da receita de impostos da cidade, teve redução. Em janeiro de 2016, houve queda real de 6% e, em fevereiro, de 15%. A estimativa inicial era arrecadar, com receitas de impostos, em torno de R$ 679 milhões em 2016, mas esse número já foi revisto para R$ 609 milhões.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
A folha de pagamento consome 45% da receita da prefeitura de Blumenau.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
Desde 2013 ocorreram reduções, com o corte de 83 cargos comissionados e três secretarias, o que resultou numa economia de R$ 4 milhões por ano. Um plano para melhorar a eficiência energética no município resultou numa economia de R$ 2,5 milhões. Também houve reorganização da estrutura de compras e armazenamento de secretarias, o que gerou economia de R$ 800 mil por ano. Uma revisão de contratos reduziu em mais R$ 350 mil os gastos. A prefeitura diminuiu o salário dos comissionados, desde prefeito (15%) até secretários e diretores (10%), e as horas extras.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
A prefeitura admite que daqui para frente os cortes vão começar a afetar diretamente o dia a dia. O secretário da Fazenda Alexandro Fernandes cita contratos como as secretarias de Serviços Urbanos, Obras, Fundação Cultural e Esportes.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
A prefeitura entende que 2016 deve se manter da mesma forma e que não há perspectiva de melhora em curto espaço de tempo.
Estamos em uma situação de falta de recursos. Hoje não há uma sobra financeira, há uma falta de verba devido à redução de arrecadação com impostos. E o poder público sente depois do mercado privado. Então, a situação lá fora está muito pior.
Alexandro Fernandes, secretário da Fazenda de Blumenau
Lages
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
A arrecadação no município está congelada ao mesmo nível de 2014, com uma queda real de 17% pela inflação. Os mesmos R$ 32 milhões de 2014 foram arrecadados em janeiro de 2016.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
A folha de pagamento consome 47% da receita da prefeitura de Lages. O índice é considerado alto pelo secretário da Fazenda, Mateus Lunardi, que aponta que seria necessário um gasto abaixo de 40% para melhorar a administração de recursos do município. Ele admite que os valores consumidos pela folha são altos, mas diz que 80% vai para servidores da educação, saúde e assistência social, áreas vitais para a cidade.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
A Secretaria da Fazenda do município afirma que está diminuindo pela metade os investimentos. Segundo o secretário, “se antes a velocidade dos serviços era 50, agora é 25”. Para aumentar a arrecadação, a prefeitura tomou iniciativas, como o protesto das dívidas ativas do município, o aumento na alíquota do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) e a venda de imóveis sem uso.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
O secretário da Fazenda admite que, normalmente, os serviços já não atendem à necessidade da população, e agora, quando a arrecadação diminui, a oferta é prejudicada. Obras programadas para inaugurar nos próximos meses devem ser estendidas.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
A Secretaria afirma que somente em 2018 ou 2019 a situação será revertida.
Os cortes já foram feitos, cortando de um lado e melhorando a arrecadação de outro. 80% da folha vai para servidores de educação, saúde e assistência social. E faz o que? Fecha escola, posto de saúde e creche? Não dá.
Mateus Lunardi, secretário da Fazenda de Lages
Joinville
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
Só no ano passado, houve uma queda de 15% na arrecadação do município, na comparação com 2014. Isso significa cerca de R$ 300 milhões a menos nos cofres da prefeitura do que em anos anteriores. A previsão para este ano não é nada otimista. A estimativa é de que só no primeiro bimestre a prefeitura arrecade 8,7% a menos em impostos do que no ano passado.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
A folha de pagamento está em quase R$ 70 milhões mensais, o que representa cerca de 52% da receita do município.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
A Prefeitura de Joinville adota medidas de contenção que visam resultar no menor impacto aos moradores da cidade. No final do ano passado, foi lançado um plano de redução para economizar R$ 60 milhões. Nesses processos estão sendo diminuídos os gastos internos e também estão sendo feitas mudanças de estruturas de secretarias, por exemplo, para economizar com alugueis.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
A ação visa garantir a receita para honrar com o pagamento em dia dos 13 mil funcionários do município e também para manter os investimentos em áreas prioritárias, como saúde, educação e infraestrutura.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
Apesar da crise, a prefeitura trabalha com uma projeção otimista de melhoria do cenário econômico. Segundo a prefeitura, o planejamento, o controle e a boa aplicação dos recursos públicos devem ser sempre priorizados pelo poder público para que não haja maiores problemas que comprometam o investimento à população.
Estamos adotando medidas de contenção, mas também esperamos o retorno de recursos, pois todas as demandas estão nas cidades.
Udo Döhler, prefeito de Joinville
Chapecó
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
Levando em conta as principais receitas do município (ICMS, FPM, IPVA, Imposto Sobre Serviços e Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) e considerando uma inflação (INPC) dos últimos 12 meses acumulada em 11,3%, a receita de janeiro de 2016, comparada ao mesmo período de 2015, teve uma queda de 2,1% o que representa um valor aproximado de R$ 450 mil. A única exceção foi o ICMS, que teve um aumento de 2,77% acima da inflação. O pior desempenho foi do FPM, com uma queda de 6,21%.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
O município tomou medidas ainda em julho de 2015, reduzindo drasticamente o número de servidores comissionados e o número de horas extras, como forma de enfrentamento da crise. Hoje, a folha de pagamento dos servidores de Chapecó consome aproximadamente 47% da receita corrente líquida.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
O município afirma que também efetuou revisões em alguns contratos de prestação de serviços à prefeitura e propôs adequações nesses contratos. A prefeitura diz que a medida representou uma economia considerável para Chapecó – mas não divulga em quanto os valores gastos anteriormente foram reduzidos.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
A prefeitura garante que as medidas tomadas para enfrentamento da crise não atingiram a população de Chapecó. A justificativa é que os ajustes são, principalmente, internos.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
A prefeitura acredita que, neste ano, a situação não vai ter uma virada. Segundo o prefeito, Luciano Buligon, isso mantém a necessidade de um controle rigoroso das despesas.
Para nós, a crise está sendo encarada como incentivo para trabalhar mais.
Luciano Buligon, prefeito de Chapecó
Florianópolis
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
Os valores das transferências constitucionais (FPM, ICMS, IPVA), subiram 0,3% em relação ao ano passado. Se inflacionar, é queda de 10%. O Imposto sobre serviço (ISS) subiu 7,95% por conta do verão. Para esse ano, a prefeitura prevê um crescimento de receita de 7,25%, o que é abaixo da inflação. A prefeitura também prevê incremento em outros impostos, mas todos devem ficar abaixo da inflação.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
A folha de pagamento da prefeitura de Florianópolis consome 55,12%, o que está acima da Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece em 54% o limite máximo para esse fim. A secretaria da Fazenda diz que até abril diminuirá em 30% o excesso de gastos com a folha. Para tal, pretende diminuir gastos com comissionados, horas extras e comissões, além de terceirizados.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
O secretário da Fazenda, Edson Caporal, acredita que, além dos cortes internos, os setores que atendem à população não serão afetados. Ele afirma que o momento é de se concluir obras em andamento. Novas estruturas devem esperar.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
O secretário afirma que a prefeitura trabalha para evitar que a população seja prejudicada. Para isso, busca receitas pontuais como a cobrança da dívida ativa. Com o processo chamado securitização, pretende arrecadar R$ 150 milhões com os pagamentos das dívidas.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
O secretário entende que para o problema ser resolvido, é necessário que a crise nacional termine. Por isso, não há ainda perspectiva de recuperação.
Vamos ter saudade de 2015, que foi um ano terrível. Temos que buscar o equilíbrio para não interferir na prestação de serviços.
Edson Caporal, secretário da Fazenda, Planejamento e Orçamento de Florianópolis
Itajaí
Como está a arrecadação deste começo de ano em relação ao mesmo período de 2015?
O secretário da Fazenda de Itajaí, Marcos de Andrade, afirma que a arrecadação municipal está se mantendo na média. Mas, os valores oriundos do Imposto Sobre Serviços (ISS), bastante relacionados ao Porto de Itajaí, caíram 8% neste começo de ano, com relação ao mesmo período do ano passado. Em 2015, a queda média foi de 7%, comparado com 2014. Os impostos vindos do governo federal reduziram 30%, e o ICMS também veio abaixo do ano passado nestes primeiros meses de 2016.
Como está a folha de pagamento e quanto ela consome da receita do município?
Sem falar nas autarquias e no porto, a prefeitura hoje tem uma folha de pagamento de 60% do valor da receita, o que é acima dos 54% da Lei de Responsabilidade Fiscal. O Fundeb, que é destinado para a folha de pagamento (de servidores da educação), é usado pela prefeitura e, mesmo assim, ainda é preciso colocar mais recursos para compensar o valor.
Que despesas com investimentos ou serviços a prefeitura vai cortar para fazer frente à queda da arrecadação?
A prefeitura deve fazer novos cortes para enfrentar a crise, mas o secretário não quis adiantar o que será feito. Uma das medidas já adotadas foi a manutenção do turno único de serviço na prefeitura.
Que reflexo direto esta ação vai ter no dia a dia das pessoas?
O secretário da Fazenda acredita que a população não será afetada com os cortes porque entende que eles são internos.
Qual a previsão de o quadro atual normalizar e a despesa cortada voltar ao orçamento?
A prefeitura diz que está tomando medidas internas para combater a crise, mas os problemas a nível nacional deixam o cenário sem perspectiva de melhora.
Estamos sentindo muito, todos os contratos são reajustados anualmente, os salários são reajustados anualmente, com reposição com mais banho. Então a despesa aumentou e a receita caiu.
Marcos de Andrade, secretário da Fazenda de Itajaí