Está aberta a temporada de caça a pechinchas no Brasil. Com valor das empresas depreciado devido à crise política e econômica que assola o país e o real desvalorizado tornando mais vantajosas as transações para quem paga em dólar, grupos nacionais capitalizados e estrangeiros aceleram a busca por fusões e aquisições no Brasil.
Debilitado por ser um dos alvos da Operação Lava-Jato, o grupo que controla a empreiteira Camargo Corrêa confirmou nesta segunda-feira a venda da controlada Alpargatas, por R$ 2,67 bilhões, à holding J&F, dos irmãos Wesley e Joesley Batista. A dupla é dona da gigante de carnes JBS (da marca Friboi), que ano passado alcançou o posto de maior faturamento entre as empresas privadas brasileiras e foi grande doadora nas campanhas de candidatos a presidente no ano passado.
Dona da JBS compra fabricante das Havaianas por R$ 2,667 bilhões
Em busca de caixa, a Alpargatas, fabricante das sandálias Havaianas, já havia vendido no início do mês as marcas Topper e Rainha. Também na segunda-feira a americana Omnicon oficializou a compra do grupo ABC, líder em propaganda e marketing no país, do publicitário Nizan Guanaes. No início do mês, a Hypermarcas vendeu sua divisão de cosméticos para o grupo estrangeiro Coty, no mesmo dia em que o megaempresário Abilio Diniz declarou em Nova York que o Brasil estava "em liquidação, muito barato" - dizendo que investidores encontrariam negócios com preços atrativos no país.
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Quem trabalha na linha de frente em processos de fusões e aquisições confirma notar a retomada da busca de negócios. Para Marcela Ejnisman, sócia na área de fusões e aquisições de TozziniFreire Advogados, o interesse parece ter sido reavivado a partir de setembro.
- O primeiro semestre foi muito fraco. Havia uma apreensão com o que ocorreria com o país. Agora estamos com bastante trabalho. Particularmente, tenho percebido muito interesse de estrangeiros. Dizem que, apesar da crise, o Brasil ainda é a melhor oportunidade na América Latina - observa Marcela, que espera um 2016 mais movimentado do que este ano.
Marta Sfredo: o Brasil de chinelos
Levantamento da empresa de auditoria PwC confirma que, até agora, predominou a retração no mercado. De janeiro a outubro, foram 618 transações do gênero contabilizadas no país, 14% abaixo do mesmo intervalo de 2014. Para Fernando Spadari, sócio da Gocapital, dedicada a fusões e aquisições, apesar da crise política e econômica e da insegurança jurídica, investidores estão despertando para oportunidades na economia real brasileira e dispostos a correr um pouco mais de risco.
- Ainda temos um mercado com mais de 200 milhões de pessoas que vai continuar comendo, usando transporte, buscando serviços. Tem muita gente vendo a chance de consolidar o mercado (unir empresas para criar uma mais forte) na crise de uma forma mais barata do que seria dois ou três anos atrás - diz Spadari, lembrando que o faturamento das empresas brasileiras, convertido em dólares, também ficou menor.
Alíquota sobre ganho de capital subirá e pode acelerar processos
Mesmo um pouco mais cético quanto a um possível aumento de fusões e aquisições nos próximos meses, Fábio Niccheri, sócio da PwC Brasil, não hesita em confirmar que a ocasião favorece quem estiver com dinheiro para investir e apostar em ter retorno a médio prazo, com a recuperação da economia nos próximos anos.
- O Brasil é sempre em ondas. Estamos em um momento de baixa, onde uma compra hoje parece interessante. Alguma hora a gente vai retomar. O Brasil está barato - reforça Niccheri.
Marta Sfredo: negócios mostram indícios de fundo de poço
Além dos preços dos ativos mais baixos devido à crise e do menor desembolso em dólares de estrangeiros pela relação mais favorável ante o real, outro fator tem apressado negócios. Parte das iniciativas previstas no processo do ajuste fiscal, em setembro o governo federal publicou medida provisória que eleva a carga tributária sobre ganho de capital. A alíquota do Imposto de Renda, hoje de 15%, pode chegar a até 30% a partir de janeiro de 2016, o que diminuiria o valor embolsado por quem vende uma empresa, por exemplo. Para fugir da mordida, a ordem é acelerar e fechar as transações ainda neste ano.