Distribuídas ao redor da foz do Rio Doce, na vila Regência, em Linhares, litoral do Espírito Santo, barreiras de contenção instaladas pela Samarco para proteger a vegetação da lama que avança ao Oceano Atlântico não devem ser suficientes para evitar que a mancha se misture ao mar.
Apesar da decisão judicial que determina que a mineradora contenha o deslocamento, não é esse o desejo da comunidade do distrito de Linhares. O que eles querem, na verdade, é tirar o barro do quintal de casa.
- Estamos tomando providências para que a água suja saia para o mar. Se ficar aqui, a consequência seria muito maior do que se saísse para o mar - diz Carlos Sangalia, vice-presidente da Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Doce.
Às 18h desta sexta-feira, a lama da barragem do Fundão, que se rompeu em Mariana (MG), já havia chegado a Linhares, o que indica que deva atingir o oceano na madrugada do sábado, segundo o Serviço Geológico do Brasil, que acompanha o deslocamento. A previsão é incerta pela instabilidade da correnteza e pode mudar a qualquer momento.
- Esperamos que a Justiça tenha consciência. Já que não conseguiu parar essa lama lá na altura das barragens, não podemos pagar esse grande ônus de ficar com isso no nosso quintal. Lógico que isso vai provocar impactos no mar, mas acreditamos que seriam menores do que se ficasse represado aqui dentro - ressalta Sangalia.
- Essas contenções são mais para óleo. Eles estão tentando para ver se vai funcionar. Mas acho que não vai ter jeito. A lama vai passar de qualquer maneira - aposta Rildo Alves da Silva, funcionário do Projeto Tamar.
Na vila de Regência, comerciantes, surfistas e pescadores lamentam a perda do Rio Doce. O impacto social e econômico na comunidade foi avassalador: reservas foram canceladas nas pousadas, as vendas nas lojas de ecoturismo caíram drasticamente e os pegadores de onda não poderão desfrutar de uma das melhores ondulações do país.
- Regência está na rota do turismo do surfe. Investi minha vida toda no surfe, no turismo. Agora eu perdi meu sonho, perdi até minha onda - lamenta Robson Barros, presidente da Associação do Surfe de Regência, criada em razão do desastre.
Nas lojas da vila de Regência, o impacto econômico também já é sentido.
- O movimento por aqui zerou. Estava num ritmo muito bom de turistas. Os caiaques estavam todos na água. Agora já é o terceiro fim de semana que está tudo guardado - relata Luciane Cunha, proprietária de uma operadora de ecoturismo.
Mas a esperança ainda não morreu. Com lágrimas nos olhos, Luciane diz que é hora de erguer a cabeça e se reinventar:
- Desanimar nunca. Temos de partir para outras atividades. Fechar a ir embora não é a solução. A vida continua.
Rota da Lama
Zero Hora percorre o rastro de devastação provocado pelo rompimento da barragem da mineradora Samarco ao longo do curso do Rio Doce. A primeira parada foi na localidade de Bento Rodrigues, no município de Mariana, que registrou mortes, desaparecimentos e foi praticamente extinta. A segunda parada foi em Paracatu de Baixo, também em Mariana (MG), onde a lama destruiu as casas e se acumula em blocos de um a dois metros de altura. Em seguida, nossos repórteres visitaram Rio Doce e Governador Valadares. Em outra frente, no Espírito Santo, a reportagem já passou por Colatina e seguiu em direção a Linhares, no litoral capixaba. Veja abaixo todas as matérias que já foram publicadas: