Mateus Rocha Soares, 13 anos, lembra pouco de Minas Gerais, estado onde nasceu. Há oito anos, a família dele se instalou em terras gaúchas. Foi atraída vocação empreendedora da Serra. É uma das facetas mais marcantes da região e que se confirma em números. O Sebrae aponta que, por aqui, existe uma empresa a cada dez pessoas. Para migrantes, significa oportunidade de uma vida melhor. Por isso, é comum o movimento feito pela viúva Maria da Conceição, que junto com os filhos, escolheu Caxias do Sul para morar. Mateus, o caçula, vive com a mãe na Vila Amélia. Estuda no 7º ano do ensino fundamental na Escola Alexandre Zattera, no bairro Desvio Rizzo. Quer ser médico ou psicólogo. Para o futuro, espera que "tudo" melhore. Esse é, sem dúvida, um sonho ousado e compartilhado por muitos. Mas como construir um lugar assim?
O professor da USP James Wright acredita que parte da resposta pode estar no passado. Para ele, a história ajuda a identificar tendências demográficas e tecnológicas porque possibilita especulações lógicas e ordenadas. Cultura, educação e qualificação profissional são os três principais pontos para o desenvolvimento, segundo o coordenador da Fundação Instituto de Administração (FIA) e do Programa de Estudos do Futuro (ProFuturo). Wright entende ainda que as cidades devem ter capacidade de reter talentos ao proporcionar qualidade de vida.
"Caxias é uma cidade próspera, com excelente potencial, mas está baseada em um modelo de desenvolvimento que deve ser repensado. Essa base industrial, sozinha, não pode ser o sustentáculo", avalia.
Em Bento Gonçalves, onde prestou consultoria para a indústria vitivinícola, Wright percebe que o futuro do setor está na capacidade de agregar valor ao produto. É uma ideia que vai ao encontro do pensamento de outros pesquisadores, como o chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Uva e Vinho, Alexandre Hoffmann. O entendimento dele é que o aumento da expectativa de vida e a procura por uma alimentação mais equilibrada devem ampliar o consumo de produtos naturais. A avaliação é que, nos próximos anos, o consumidor vai aumentar a exigência por qualidade, valorizar a produção sustentável e o contato com o lugar onde ela ocorre. Tudo isso vai exigir profissionalização do setor agrícola.
"A região da Serra, que é uma região tradicionalmente conhecida como inovadora e desbravadora, já adota e vai adotar muito a tecnologia, cada vez mais em função da sobrevivência dos negócios. A busca por novas alternativas de produção e por tecnologias que deem um alimento mais seguro e um ambiente mais sustentável vão ficar cada vez mais na pauta da nossa vida no campo no ambiente dos anos de 2050".
A inovação citada por Hoffmann como característica da Serra também pode ser necessária para a organização dos municípios. O coordenador do curso de Design da Unisinos, Fabrício Tarouco, aborda a importância do design estratégico de cidades, dividindo o planejamento em níveis. Um deles é o estrutural que trata de pontos básicos como vias, obras e organização do espaço urbano. O outro é inovação e tecnologia. Esses dois fatores, na opinião dele, permitem transformações efetivas. O professor propõe que as cidades pensem o querem ser a partir de um recorte. Isso significa que o desenvolvimento vai se dar a partir de uma 'vocação'. Depois da definição, é preciso estudar e implantar estratégias.
"Não são estratégias que dependem só do Poder Público. Precisa contar com uma conexão entre Poder Público, iniciativa privada e comunidade, representada por instituições, que é quem realmente vai fazer isso acontecer".
A tarefa conjunta a que o professor se refere é o grande desafio para o futuro da região. Especialistas apontam que cada vez mais os municípios da Serra vão se aproximar. Estudiosos também citam a similaridade entre as cidades como uma vantagem para o planejamento integrado. É tempo de pensar a educação, a segurança pública, a vida no campo, os espaços urbanos. É hora de refletir sobre a Serra que queremos.