Para a promotora Lúcia Helena Callegari, da Promotoria de Justiça do Tribunal do Júri de Porto Alegre, a impunidade e a redução do custeio da Brigada Militar são alguns dos fatores que contribuem para o aumento da "audácia de quem comete crimes". Em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade, da Rádio Gaúcha, a promotora afirmou que a apreensão de armamento pesado mostra que os criminosos estão com "poderes e tentáculos muito mais fortes".
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Leia trechos da entrevista:
Que avaliação a senhora faz do momento que estamos vivendo em termos de segurança pública na Capital?
Há um tempo atrás eu dizia que nós tínhamos duas Porto Alegre: a que estava acontecendo nos bairros de menor renda e a outra que estava acontecendo na realidade que nós vivemos. Agora, mudei meu discurso. A mesma realidade dos bairros tomou conta de todas as regiões de Porto Alegre. Estamos vindo de uma série de ocorrências que tem me deixado extremamente preocupada, porque é traficante caçando traficante em plena luz do dia e em ruas de alto movimento. A ousadia chega a tal ponto que agora se tenta invadir o Exército para buscar armas. Não acho que seja só a falta de policiamento ostensivo que leva a isso. É a falta de punição, a liberalidade das leis. Não existe mais uma preocupação com a efetiva punição.
Onde estamos falhando?
Todos os grandes criminosos estão envolvidos com homicídios. Entendo que tivemos uma grande melhora com a instalações de delegacias especializadas. Agora, é óbvio que há uma certa desmotivação no momento em que se tiram horas extras, quando se tem combustível reduzido. De qualquer modo, acho que a investigação tem melhorado. Existe um medo muito forte de quem tem que prestar depoimento, e isso se reflete na prova. Muitos crimes acabam não sendo apurados porque as pessoas não querem prestar depoimento. E aqueles que são punidos chegam na execução criminal e a nossa lei é uma piada. A forma como se interpreta é pior ainda. Tenho denunciado toda a semana pessoas que estão com tornozeleira com prisão domiciliar. Quer dizer, tinham que estar dentro do sistema e foram mal avaliadas.
As estatísticas da Secretaria de Segurança apontam uma redução da criminalidade. O que explica isso? Há um problema com as estatísticas?
Quando se tem chacinas, se coloca como um fato quando, na verdade, são três ou quatro. Começa por aí o erro. Falar em redução da criminalidade quando a gente tem visto o armamento muito mais pesado, tem que pensar de onde está vindo. Há quatro ou cinco anos, a gente não ouvia falar nesse tipo de apreensão com essa frequência que tem acontecido. A apreensão desses armamentos mostra que a criminalidade está com poderes e tentáculos muito mais fortes do que tinha. As tentativas de homicídio são registradas, mas as pessoas morrem no hospital. Esses dados têm que ser verificados até que ponto são fidedignos com a realidade que se apresenta.
O aumento da ousadia está relacionado com a redução do custeio das polícia no RS?
A partir do instante que se tem conhecimento que os policiais vão estar com combustível reduzido, que o policiamento vai diminuir, porque horas extras não estão sendo pagas, há uma maior audácia de quem comete crimes porque acredita que que não vai ser pego. Óbvio que isso não pode ser o único fator. É desestimulante para a população andar na rua e não encontrar policiamento, o que passa a sensação para quem comete crimes de que pode continuar. Não tenho dúvidas disso.