Reforma política pode ganhar força após lista
Com a divulgação da primeira lista de políticos que serão investigados na Operação Lava-Jato, o Congresso passa a enfrentar uma das mais graves crises das últimas décadas. Não só pelo número de parlamentares envolvidos - são 22 deputados e 12 senadores de cinco partidos -, mas por colocar sob suspeita os presidentes da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), segundo e terceiro na linha de sucessão presidencial, respectivamente.
A credibilidade do Congresso, mais uma vez, deve encostar no chão, como ocorreu após as manifestações de junho de 2013. Desde 2009, o parlamento ocupa a penúltima colocação - atrás apenas dos partidos políticos - no Índice de Confiança Social (ICS) elaborado pelo Ibope. Além de abalar ainda mais a já deteriorada imagem da instituição, a Lava-Jato também poderá ter como efeitos a paralisia do Legislativo, renúncias e cassações e um Executivo ainda mais fragilizado.
- É uma crise nova e sem precedentes, certamente a maior que o parlamento brasileiro já enfrentou, porque envolve a cúpula do Congresso - afirma o cientista político Paulo Baía, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
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De acordo com o professor, a tendência é de que a divulgação da lista dos possíveis beneficiários do esquema de corrupção envolvendo a Petrobras provoque uma "onda de indignação contra o Congresso", que, pelo que seu histórico indica, deve agir com rapidez para enfrentar a crise. Baía avalia que a estratégia a ser adotada será a de "cortar na própria carne", desencadeando uma série de renúncias e pedidos de cassação. Só o fato de o nome dos políticos constarem na lista, conforme Baía, já caracterizaria quebra de decoro:
- O Congresso fará isso porque tem enorme senso de sobrevivência e age sempre em sintonia com a opinião pública.
Analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Antônio Augusto de Queiroz também reconhece que a pressão sobre os políticos será grande, mas pondera que, como se trata de inquérito, e existem mais de 300 contra parlamentares, poucos devem renunciar. No entanto, ele acrescenta, se os deputados e senadores avaliarem que existem grandes chances de seus processos prosperarem, alguns podem optar pela renúncia para evitar a inelegibilidade, ou seja, a perda dos direitos políticos por oito anos.
Há quem defenda a tese de que a relação do governo federal com o Congresso tende a se deteriorar ainda mais. Professor na Universidade de São Paulo (USP), o historiador Lincoln Secco, autor do livro A História do PT, afirma que o efeito principal da Lava-Jato é que o governo federal terá que se desdobrar para contornar as chantagens do PMDB, principal aliado da presidente Dilma Rousseff (PT).
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O cientista político Pedro Arruda, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), concorda com a avaliação. Segundo Arruda, tanto Eduardo Cunha quanto Renan Calheiros devem criar dificuldades para o governo federal, e a estratégia começou a ser colocada em prática na semana passada, antes mesmo da divulgação da lista, quando o Senado devolveu a medida provisória que trata da desoneração da folha de pagamento das empresas:
- Estamos diante de uma crise política que não é apenas de um governo ou partido, é uma crise generalizada.
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Como fica a credibilidade do Congresso, com os presidentes do Senado e da Câmara investigados como possíveis beneficiários do esquema na Petrobras?
O Congresso é uma das instituições de mais baixa credibilidade e apoio na sociedade brasileira, e nunca fez nada de importante para mudar isso. O envolvimento dos presidentes das duas casas piora ainda mais a situação, mas também abre oportunidade para o Congresso se reabilitar, caso se antecipasse às investigações e afastasse os dois dos seus cargos, que é o procedimento correto em qualquer democracia. Mas acho difícil que isso ocorra.
Quais devem ser, a partir de agora, os desdobramentos da crise?
Os parlamentares mais vulneráveis são os que vêm de Estados onde as eleições são muito competitivas. Então, Eduardo Cunha é mais vulnerável à pressão popular do que Renan Calheiros. Há uma certa blindagem dos dois, mas, como existe a possibilidade de afastamento, eles ficam vulneráveis politicamente, e aí vão entrar em um modo de autoproteção, de busca da sobrevivência política. Quanto mais demorar até chegar o momento em que Cunha e Renan terão de ser afastados, mais o governo fica fragilizado no Congresso, porque isso é absolutamente indispensável para garantir essa sobrevivência. Eles têm de manter o governo na corda bamba exatamente para que o governo faça todo o esforço possível, inclusive mobilizando a bancada petista, para protegê-los politicamente.
É uma das mais graves crises enfrentadas pelo Congresso?
Existiram outras crises graves, como a dos anões do orçamento, que também atingiu a cúpula do Legislativo. Mas é uma crise grave porque atinge o Congresso em um momento de baixíssima credibilidade e péssima reputação junto à opinião pública e, além disso, em um momento em que o Legislativo tem funções importantes a desempenhar.
Quais serão as consequências?
O Congresso vai ficar tão envolvido na sua autodefesa e na discussão de sua crise que o processo legislativo pode ser paralisado no momento em que o Brasil precisa de um parlamento mais ágil para enfrentar a crise econômica e social. Essa paralisia certamente vai agravar a crise política associada às crises econômica e social.
Debatida no Congresso há mais de duas décadas, a reforma política pode voltar à pauta fortalecida pelos desdobramentos da Lava-Jato. As empreiteiras investigadas na operação, que foi deflagrada pela Polícia Federal em março de 2014, doaram quase R$ 100 milhões aos dois candidatos à Presidência que chegaram ao segundo turno das eleições.
- Essas denúncias estão também relacionadas com o sistema de financiamento eleitoral. Parte desse dinheiro de pagamento de propina foi para os caixas de partidos políticos. As empresas não fazem doações: na prática, fazem investimento - afirma o cientista político Pedro Arruda, da PUC-SP.
Para o ex-deputado Raul Pont (PT), o possível envolvimento de um número significativo de políticos no esquema de corrupção demonstra a necessidade de por fim ao financiamento privado de campanhas eleitorais:
- É a prova mais evidente de que este sistema é falido, corruptor e corrupto e que não expressa a real vontade do eleitor.
Pont também defende que os membros do PT que estão sob suspeita sejam afastados enquanto perdurarem as investigações. Já o ex-senador Pedro Simon (PMDB) não tem o mesmo entendimento. O peemedebista acha que, neste momento, com as investigações apenas começando, seria uma decisão precipitada. Simon sugere que a presidente Dilma Rousseff estruture um comitê suprapartidário para sair da crise. Sobre os peemedebistas envolvidos, afirmou:
- O MDB vai tomar uma posição que deve ser firme, doa a quem doer.
Confira os perfis dos políticos que serão investigados:
A cronologia da Lava-Jato: