Até a manhã do dia 19 de janeiro, antes de atirar no surfista Ricardo dos Santos, na praia Guarda do Embaú, em Palhoça, o policial militar Luis Paulo Mota Brentano, 25 anos, projetava uma carreira promissora na corporação. Assim descrevem colegas de farda, amigos e ex-professores do curso de direito da Univille, entrevistados pela reportagem de A Notícia nesta sexta-feira.
O soldado Mota _ como é chamado _ formou-se no curso superior há pouco mais de um ano. Desde então, se preparava para prestar concurso para oficial da Polícia Militar. A prova acontece neste domingo. Segundo profissionais que trabalharam com ele, Mota dedicava seis horas diárias aos estudos e se preparava para dar um passo importante na carreira que escolheu aos 19 anos.
As férias que havia tirado nos últimos dias seriam para relaxar antes de encarar o concurso. Na noite anterior ao trágico episódio, que terminou com a morte do surfista, Mota tinha saído pela primeira vez na companhia do irmão mais novo.
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Em depoimento, o policial disse que reagiu em legítima defesa após uma das pessoas ameaçá-lo com um facão. A outra versão, apresentada por testemunhas que estavam com o surfista, é a de que o PM atirou de dentro do carro sem motivo. Resultados dos laudos periciais devem dar mais detalhes sobre a cena do crime.
Os colegas de farda descrevem o amigo como um profissional responsável, comprometido e atento às leis. Um deles, que o conhece desde criança e dividiu plantões por longo tempo, acredita na versão do companheiro:
- Tenho certeza de que o Mota só atirou para defender a vida dele e a do irmão.
Os professores da faculdade de direito o descrevem como aluno tranquilo e dedicado, que por vezes aparecia de farda nas aulas, pois precisava conciliar os estudos com os horários apertados do trabalho.
- Os fatos serão apurados e ele deverá responder pelos atos dele. Mas, um fato não pode apagar a história de uma vida - disse um professor.
No início da carreira, em 2010, Mota se destacou ao salvar uma criança que havia se afogado com leite materno em Joinville. Também atuou no episódio da Fumaça Tóxica que atingiu São Francisco do Sul em 2013, onde trabalhou por mais de 48 horas na ocorrência. Pouco tempo depois, foi escolhido para integrar o Serviço de Inteligência, um dos setores mais importantes dentro da corporação.
Após o episódio na Guarda do Embaú, os pais do policial foram acolhidos na casa de parentes, pois estão com medo de represálias. O pai de Mota é conhecido no bairro onde ele cresceu, pois além de organizar um time de futebol na comunidade, é catequista na igreja católica. Uma viatura tem feito rondas em frente a casa da família por conta de ameaças que surgiram pelas redes sociais.
Mota também já foi réu em três processos que denunciaram excessos durante a atividade policial. Porém, foi absolvido em todos os casos por falta de provas. Na última denúncia que envolveu o nome dele, feita por um torcedor do JEC em 2014, não chegou a ser indiciado. Os exames periciais não comprovam a suposta tortura sofrida pelo torcedor. O inquérito deste caso foi entregue ao MP nesta sexta-feira.
Entenda os processos
Mota respondeu a dois processos na Justiça Militar. Em um deles, no qual respondia por lesão corporal leve e ameaça, foi absolvido por falta de provas. No segundo episódio, o MP entendeu que não era caso para denúncia.
Pelo Juizado Especial, Mota teve seu nome envolvido em uma denúncia por abuso de autoridade, mas também foi absolvido por falta de provas. A denúncia diz que em 2010, o policial teria constrangido um torcedor em uma revista pessoal.
O último inquérito a que o policial foi submetido à investigação, por causa de uma denúncia de tortura feita por um torcedor do JEC em 2014, foi entregue nesta sexta-feira ao Fórum de Joinville. O delegado entendeu que não havia provas contundentes para indiciar os policiais.
O torcedor que registrou o boletim de ocorrência após ser detido pelo soldado Mota e outro policial no dia do jogo, alegou que foi agredido com vários socos e chutes. Porém, de acordo com o delegado que investigou o caso, Fábio Fortes, o laudo pericial convergiu do depoimento da vítima, pois apresentou apenas uma lesão superficial na boca e outra no abdômen. Os policiais disseram em depoimento que precisaram usar da força para algemar o rapaz que estaria alterado na delegacia. Policiais civis que receberam o flagrante na Central de Polícia, também disseram que não presenciaram excessos por parte dos PMs.
- Diante da fragilidade desses indícios, optei pelo não indiciamento desses policiais militares - explicou o delegado.
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Crime em Palhoça
Ricardinho foi baleado na segunda-feira, depois de uma discussão com um policial. Levado ao Hospital Regional de São José, depois de 30 horas e quatro cirurgias não resistiu e morreu no início da tarde desta terça-feira. O policial e a testemunha que estava com o surfista contam diferentes versões para o motivo dos três disparos. O primeiro alega legítima defesa e a segunda diz que a ação foi sem justificativa. A Polícia Civil investiga o caso.