O governo Dilma Rousseff lançou 23 pacotes com medidas para estimular a economia brasileira, mas todo esse ativismo, até agora, não gerou uma taxa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) próxima ao patamar de 3%. Depois do mais recente pacote, que consistiu numa injeção de R$ 12 bilhões no setor elétrico para manter a conta de luz baixa e competitiva para as empresas e famílias, as críticas do mercado ao "intervencionismo" do governo voltaram com força.
Internamente, os próprios técnicos da equipe econômica admitem que houve um excesso de medidas, mas a visão do governo é clara: não fossem os estímulos fiscais e monetários concedidos nos últimos anos, o ritmo da economia brasileira seria ainda mais lento, e a inflação ainda mais alta. No Palácio do Planalto, o entendimento é que as medidas estruturais, como a desoneração da folha de pagamentos, as concessões ao setor privado e a desvalorização da taxa de câmbio, ainda vão surtir efeito pleno sobre a atividade produtiva.
- A economia entrou em compasso de espera, porque as regras do jogo foram mudando rapidamente, tanto setorialmente, como no caso dos ramos automobilístico, da mineração e do setor elétrico, quanto no campo macro, com juros e câmbio subindo e descendo bruscamente em pouco tempo - disse Juan Jensen, sócio da Tendências Consultoria e responsável pela área de macroeconomia e política do grupo.
Para Jensen, o elevado número de pacotes com medidas para estimular a economia não só deixaram de cumprir seu objetivo principal, como acabaram por minar as expectativas com a atividade econômica.
- Todo remédio tem efeito colateral. O problema do governo é que ele atacou os efeitos colaterais dos seus remédios com novos medicamentos - disse o economista, que citou o caso do setor de combustíveis.
Para auxiliar a Petrobras, mas ao mesmo tempo evitar que um reajuste da gasolina chegasse ao consumidor, o governo zerou o principal tributo do setor, a Cide. Com isso, reduziu sua arrecadação, e deixou a gasolina mais competitiva que o etanol. Então, concedeu um pacote ao etanol, com redução do PIS/Cofins, o que reforçou a piora fiscal.
O sócio da Tendências Consultoria criticou uma das principais medidas de estímulo à economia do governo Dilma, a desoneração da folha de pagamentos, medida presente no primeiro dos 23 pacotes, o Plano Brasil Maior. Segundo ele, cada emprego formal nos mais de 60 setores beneficiados pela medida custou R$ 140 mil aos cofres públicos. Como a média de salários nesses setores é de R$ 40 mil anuais, afirmou Jensen, o governo poderia simplesmente "transferir esse dinheiro diretamente ao trabalhador, criando uma 'bolsa salário', e ainda poupar R$ 2 bilhões por ano.
- A medida puniu as empresas que tinham mecanizado sua produção, e tornou mais complexa a operação de pagamento de tributos. Diversas empresas nos avisaram disso - disse.
De acordo com Thais Marzola Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, os 23 pacotes de medidas indicam "um claro improviso" da política econômica.
- Defrontado com algum problema, o governo tirou alguma medida da cartola sem um plano de mais longo prazo, sem estratégia mais clara. O resultado foi uma redução da transparência e na previsibilidade da economia, o que gerou o efeito reverso sobre os agentes - comentou Thais.
A economista da Rosenberg avaliou que a justificativa apontada pelo governo, de que o cenário atual seria muito pior não fossem as várias intervenções feitas na economia, é falha. Thais citou o caso do setor elétrico, alvo de um dos principais pacotes da gestão Dilma, em setembro de 2012, que resultou na redução das tarifas ao consumidor em 2013 - corte mantido em 2014 por meio do 23º pacote, anunciado no mês passado.
- Não fosse a intervenção, a conta de luz estaria mais cara hoje, de fato, mas o consumo teria sido inferior também. Desta forma, menos usinas termelétricas seriam acionadas, e o preço da energia no mercado livre estaria mais baixo, e o quadro geral do setor muito mais saneado do que agora. O Tesouro, também, teria muito menos gastos para sustentar o setor - disse a especialista.
Confira os pacotes
1. Brasil Maior (2/8/2011)
Desoneração da folha de pagamentos de quatro setores, criação do programa Reintegra, de devolução imediata de crédito tributário à indústria exportadora.
2. Liberação de crédito (16/10/2011)
Banco Central (BC) reduz de 16,5% para 11% o requerimento de capital mínimo para empréstimos ao consumo, corta de 20% para 15% o percentual mínimo de pagamento das faturas de cartão de crédito.
3. Desoneração (1/12/2011)
Governo reduz de 3% para 2,5% a alíquota do IOF que incide sobre o crédito para o consumidor, corta o IPI sobre eletrodomésticos da linha branca, zera o PIS/Cofins sobre massas.
4. Ampliação do Brasil Maior (2/4/2012)
Desoneração da folha de pagamentos é ampliada de quatro para 15 setores, Tesouro Nacional repassa R$ 45 bilhões ao BNDES, forte redução das taxas de juro nas linhas PSI e Finame e anúncio do novo regime automotivo.
5. Medidas emergenciais para veículos (21/5/2012)
BC libera R$ 18 bilhões do depósito compulsório dos bancos para financiamento de carros novos, redução do IPI para indústria automotiva, nova redução do IOF que incide sobre o crédito ao consumidor, de 2,5% para 1,5%.
6. Investimento dos Estados (15/6/2012)
BNDES cria linha especial de R$ 20 bilhões (Pró-Investe) para financiar os investimentos em infraestrutura dos Estados, elevação do limite dos Estados para contratação de parcerias público-privadas, de 3% para 5% da receita corrente líquida.
7. Dilma vai às compras (27/6/2012)
Governo anuncia programa de R$ 8,4 bilhões em compras públicas de máquinas, equipamentos, material escolar, retroescavadeiras, materiais hospitalares e fármacos, redução da TJLP, a taxa básica dos empréstimos do BNDES, de 6% para 5,5%.
8. Concessões começam (15/8/2012)
Presidente Dilma Rousseff anuncia concessões de R$ 166 bilhões em 7,5 mil quilômetros de rodovias e 10 mil quilômetros de ferrovias.
9. Pacote na TV (6/9/2012)
Dilma anuncia o corte nas tarifas de energia elétrica a partir de 2013 durante seu pronunciamento em cadeia nacional de TV e rádio para as festividades da Independência.
10. Estímulos para construção civil (3/12/2012)
Governo anuncia estímulos para financiamento habitacional, inclui o setor de construção civil na desoneração da folha de pagamentos.
11. Reforma no setor portuário (5/12/2012)
Nem o velório de Oscar Niemeyer diminui o ritmo do governo. Horas antes da cerimônia no Palácio do Planalto, Dilma anuncia ampla reforma nos portos do país.
12. Linha do BNDES (5/12/2012)
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, anuncia a prorrogação do PSI por mais um ano, e leva o caixa dessa linha do BNDES a R$ 100 bilhões para 2013 .
13. Novo modelo para aeroportos (20/12/2012)
Governo anuncia a concessão de três grandes terminais à iniciativa privada, um programa estatal de R$ 7,2 bilhões em investimentos em construção e reforma de 270 aeroportos regionais.
14. Cesta básica pela TV (8/3/2013)
Dilma anuncia a desoneração total de tributos federais dos produtos da cesta básica, numa renúncia de R$ 5,5 bilhões em receitas já em 2013. A cesta também é ampliada de 13 para 16 produtos. Dilma também anuncia medidas para aumentar a defesa do consumidor .
15. Inovação (14/3/2013)
Governo lança o nova empresa, com linha especial de crédito subsidiado da ordem de R$ 32,9 bilhões (entre Finep e BNDES) para financiar investimentos de seis setores em inovação, além da criação de uma nova empresa pública para aumentar a relação entre empresas e universidades, a Embrapii, e de um Observatório de Inovação.
16. Mais desoneração da folha (5/4/2013)
Governo edita MP com a inclusão de novos 14 setores no benefício, além de desonerações para construção civil. Renúncia fiscal total de R$ 5,4 bilhões.
17. Setor químico (23/4/2013)
Governo reduz de 5,6% para 1% a alíquota do PIS/Cofins para os fabricantes de matérias-primas para a indústria química. Renúncia fiscal de R$ 1,1 bi em 2013 e R$ 1,7 bi em 2014.
18. Etanol (23/4/2013)
Governo zera o PIS/Cofins dos fabricantes de etanol e mantém o crédito presumido das usinas com o Fisco. Renúncia fiscal de R$ 1 bi em 2013 e R$ 1,4 bi em 2014. Além disso, há redução dos juros do BNDES, de 8,5% para 5,5%, para linha voltada a renovação dos canaviais.
19. Infraestrutura (8/6/2013)
Governo reforça caixa da Valec e do BNDES para aumentar o crédito e os investimentos em infraestrutura.
20. Marco regulatório da mineração (18/6/2013)
Governo anuncia novo marco regulatório da mineração, para aumentar arrecadação e estimular os investimentos no setor.
21. Prefeituras (16/7/2013)
Dilma anuncia pacote de R$ 3 bilhões para melhorar contas das prefeituras e pede em troca mais investimentos
22. Investimentos no PAC e Minha Casa, Minha Vida (30/9/2013)
Governo altera regras do FGTS e amplia o teto para contrapartida de investimentos do PAC e do Minha Casa, Minha Vida. Objetivo era ampliar os investimentos no setor.
23. Leilão de energia (13/3/2014)
Governo baixa pacote de R$ 12 bilhões e anuncia leilão extraordinário de energia térmica para evitar que a conta de luz subisse em 2014, e assim travasse investimentos e aumentasse preços.