Considerado artífice da mais recente e cruenta ditadura argentina, Jorge Rafael Videla foi encontrado morto ontem pela manhã na cela do presídio de Marcos Paz (45 quilômetros a sudoeste de Buenos Aires), onde cumpria pena de prisão perpétua. Videla morreu de "causas naturais", segundo o boletim médico, às 8h25min.
Galeria de fotos: Ex-ditador argentino Jorge Videla morre aos 87 anos
Minutos depois, a notícia percorria o mundo e levava entidades de direitos humanos a uma reflexão: o desaparecimento do principal símbolo da "guerra suja", aos 87 anos, é o encerramento de um ciclo.
- Não existe alegria na morte, mas a de Videla afasta da face da Terra um genocida desumano que não teve pruridos em idealizar um plano de extermínio. Matou, roubou e não se arrependeu - disse Estela de Carlotto, presidente das Avós da Praça de Maio, que, com as duas vertentes das Mães da Praça de Maio, persiste na investigações sobre mortos, desaparecidos e filhos destes (108 netos foram localizados e tiveram suas identidades restituídas, mas as "madres" e "abuelas" calculam que eles sejam, no total, mais de 500).
Com a ressalva de que não se festeja a morte de uma pessoa, seja ela quem for, Nora de Cortiñas, do grupo Mães da Praça de Maio, lamentou que o ex-ditador tenha levado "os segredos mais importantes da História".
Para ex-ditador, violência era preço da luta antissubversão
Justamente porque Videla não se arrependeu de seus atos, ativistas como o presidente do Movimento de Justiça e Direitos Humanos (MJDH), Jair Krischke, definem sua morte como "o fim de um ciclo".
- Com a morte dele, termina um ciclo trágico não só para a Argentina, mas para toda a América Latina. Até o último momento, ele estava convencido do que fez. Isso me lembrava um Hitler. Esse perfil de pessoa acaba sempre produzindo uma tragédia, que foi o que ele fez - disse Krischke.
Videla governou a Argentina entre 1976 e 1981 (a ditadura se estendeu entre 1976 e 1983). No golpe (chamado de Processo de Reorganização Nacional), em 24 de março de 1976, ele foi um dos principais protagonistas. O resultado, segundo entidades de direitos humanos, foi de 30 mil opositores mortos e desaparecidos.
Um ano antes de deixar a presidência, Videla esteve em Porto Alegre. Iria reinaugurar a Praça Argentina, no Centro, descerrando uma placa ao lado do colega brasileiro João Figueiredo. Um protesto de estudantes, reprimido com dureza pela Brigada Militar, tomou conta do local. O general argentino desistiu de comparecer.
Em 2010, o ex-ditador sofreu dois reveses: foi condenado à prisão perpétua pelo fuzilamento de opositores na província de Córdoba e responsabilizado por um dos métodos tidos como mais atrozes da ditadura argentina, o roubo de bebês de mulheres que haviam chegado grávidas aos porões da repressão.