Entre os 11 filmes nacionais em cartaz neste momento em Porto Alegre, Luz nas Trevas: A Volta do Bandido da Luz Vermelha é um dos que tiveram um lançamento menos atabalhoado. Como a maioria dos outros 10, seus horários são restritos, mas já são mais de 20 dias de sessões na Sala P.F. Gastal, no Cinemark Ipiranga e no Cine Santander - carreira paralela à do documentário Mr. Sganzerla, em exibição no Unibanco Arteplex. Entre os 11, é também o mais significativo historicamente: trata-se de uma continuação, anárquica como o original, da obra-prima de um dos maiores cineastas brasileiros.
O protagonista de O Bandido da Luz Vermelha (1968) morre ao final do filme. Ainda assim, seu diretor, Rogério Sganzerla (1946 - 2004), escreveu um roteiro sobre a volta do anti-herói. Em família, a viúva Helena Ignez (diretora), suas filhas Sinai (produtora) e Djin Sganzerla (protagonista feminina), além do genro André Guerreiro Lopes (protagonista masculino), resolveram homenageá-lo filmando este roteiro. Luz nas Trevas transborda paixão pelo cinema e pela obra sgan­zerliana, um dos pilares sobre o qual se desenvolveu a produção nacional contemporânea pós-Cinema Novo.
Na trama, Ney Matogrosso vive o Bandido, que da prisão observa os atos do filho assaltante de grã-finos paulistanos (Lopes). O caráter social da contravenção aparece de forma mais explícita, mas, no fundo, pai e filho - este batizado Tudo ou Nada - são parecidos. A estética que fez d'O Bandido revolucionário está toda aqui: há narração ao estilo dos policiais radiofônicos, letreiros representativos do caos visual das ruas, dramaturgia fragmentada construída a partir de uma narrativa linear, ironia sobre as instituições e as relações de poder etc.
Musa do cinema marginal, Helena Ignez já demonstrara talento dirigindo o ensaístico Canção de Baal (2008). Aqui, sua habilidade na direção de cena - é pelas suas mãos que Djin resplandece como a musa de Tudo ou Nada - é fundamental para dar força a um filme forjado em grande parte na pós-produção. Pode-se contestar o papel dramático da sequên­cia musical ao fim, mas, num trabalho tão comovente, e competente, é melhor simplesmente deixar fruir.