Depois da poesia de Ana Cristina César, o ator e diretor Paulo José vai buscar na sociologia de Zygmunt Bauman o pretexto para falar da profunda solidão da contemporaneidade. Repetindo parcerias da montagem de Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César, sucesso da edição 2010 do Porto Alegre Em Cena, ele traz agora à Capital e ao festival Histórias de Amor Líquido. O espetáculo estreia nesta quinta-feira (15) no Teatro CIEE com ingressos esgotados.
Histórias de Amor Líquido entrelaça três narrativas ficcionais que, cada qual a seu modo, dialogam com os temas de fundo do livro Amor Líquido, de Zygmunt Bauman. O sociólogo polonês discute os rumos de uma sociedade em que tudo, do amor às instituições, do trabalho ao sentimento de comunidade, parece incapaz de manter a mesma forma, como líquidos. E é sobre isso que também versam os três episódios da peça, intercalados em cena ao longo de um único ato. O texto é escrito pelo mesmo Walter Daguerre responsável por Um Navio no Espaço ou Ana Cristina César.
- O espetáculo surgiu de uma necessidade de continuar falando sobre a busca de encontros que a gente fica tentando estabelecer. O Bauman nem foi a fonte inicial, é a cereja do bolo, muita coisa já havia sido escrita pelo Walter, e o Bauman veio organizar para a gente esse lugar da discussão, que é tão universal e pertinente nos tempos que estamos vivendo - conta Ana Kutner, que já havia vivido Ana Cristina César na montagem anterior e que agora está presente em um dos episódios do espetáculo.
Em uma das histórias, A Corretora, uma mulher ganha a vida como analista de investimentos amorosos, aconselhando seus clientes sobre quais relações têm mais possibilidade de lucro - tal como em uma bolsa de valores. Na segunda linha narrativa, dois personagens que sofrem de insônia após um abandono amoroso estabelecem uma forte identificação pelo seu histórico de perdas. No terceiro, um casal em visita a uma casa herdada pelo marido termina por rever a própria relação.
Desta vez, Paulo José não está em cena, mas dirige o elenco, que conta com suas duas filhas, Ana e Bel Kutner. Lidar com o tema das relações afetivas em uma peça realizada em família é, segundo Ana, um "trabalho de alto risco":
- Quando você está no meio de um processo criativo você está muito exposto. Por um lado, ser em família facilita muito porque tem a dinâmica de entender como o outro é, como sente. Mas, ao mesmo tempo, isso não dá garantia nenhuma de que vai ser mais fácil se expor. Você tem de sair da esfera familiar quando olha para seu pai que está te dirigindo e ele te exigindo coisas, te provocando não como pai, mas como artista. Porque está partindo do princípio de que você também é outro artista e dá conta de ser provocado.
"Histórias de Amor Líquido" debate as relações contemporâneas
Com direção de Paulo José, peça se baseia em livros do sociólogo Zygmunt Bauman
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