Os dados do Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2022 mostraram que 37.814 pessoas têm 100 anos ou mais no Brasil. No final do último mês, pelo menos mais um idoso alcançou esta idade no país. Morador de Porto Alegre, o empresário Anton Karl Biedermann chegou ao seu 100º aniversário no dia 22 de setembro.
E se você imagina uma vida calma e pacata de um idoso centenário, Biedermann contraria qualquer pensamento neste sentido. Sua conquista mais recente mostra o que o gaúcho é capaz de fazer em plena terceira idade. No fim de agosto, o atleta do Grêmio Náutico União, clube que defende desde os 17 anos, quebrou o recorde mundial nos 50m costas na categoria 100+, com o tempo de 1m9s.
Mas para chegar em condições de estabelecer a marca, Biedermann tem uma rotina movimentada e uma dieta balanceada, sempre acompanhado por sua filha, Rosane Biedermann Mariante, que mora com ele.
— Não sei o que é mais difícil: chegar aos 100 anos ou bater um recorde mundial. Sempre que me perguntam como faz para viver até os 100, eu respondo "só chegar aos 99" — disse o empresário, aos risos.
A rotina dele começa às 5h30min, quando acorda. Antes mesmo de se levantar da cama, pratica alongamentos.
— Eu vejo gatos e cachorros se alongando quando acordam. Eles não correm antes de fazer isso. Pensei em introduzir isso na minha rotina.
Trinta minutos depois, faz sua primeira refeição do dia. Geralmente, um café com leite, pedaços de mamão, uma maçã e duas fatias de pão de centeio. Feita a digestão, faz seus exercícios diários. Primeiro, uma hora de musculação (quatro vezes por semana).
A frequência de Biedermann na academia do seu condomínio é tão grande que o local conta com uma placa em sua homenagem. Quando ele entra, todos param para o cumprimentar. Uma verdadeira estrela fitness.
Dali, ele dá 15 passos e entra no ambiente da piscina térmica do prédio. Posiciona-se em uma cadeira, tira seu abrigo, bota a touca e os óculos de nado. Em uma hora e meia, nada de 1.600m a 1.800m em uma das raias de 25m — algo entre 64 e 72 piscinas, traduzindo para quem não tem familiaridade com o esporte.
O único dia de descanso dessas atividades é nas sextas (casualmente o dia que recebeu a reportagem do Grupo RBS em casa). Nos domingos, vai ao clube.
— Cada dia que eu falto a alguma das minhas atividades físicas, eu penso que deixei de ajudar meu corpo — explica.
A parte da tarde no dia de Biedermann é menos movimentada. Depois dos exercícios, toma banho, almoça e descansa entre uma hora e uma hora e meia. Caso necessário para preencher a rotina, caminha para completar as atividades.
Se o despertar é cedo, o dormir também. Após a janta (quase sempre com uma tacinha de vinho), às 19h30min, o centenário atleta deita antes das 21h.
O empenho do nadador master resultou, na carreira, em 255 medalhas de ouro em provas individuais, outras tantas em revezamentos e dois recordes mundiais.
Da infância à terceira idade
Muitos devem se perguntar como Anton Biedermann chegou tão bem na terceira idade e nadando melhor do que muito jovem. Apesar das três pontes de safena e do diabetes que o acompanham, o rio-grandino sempre teve relação com o esporte.
A paixão pelo exercício físico surgiu aos 12 anos. Ele era fã de Johnny Weissmüller, grande nadador da época, intérprete de Tarzan nos filmes do personagem e cinco vezes campeão olímpico.
Depois de se mudar para Guaratinguetá, no interior de São Paulo, começou a nadar em um dos clubes da cidade por influência da mãe. Em 1941, Anton voltou para Porto Alegre, ingressou no União e dali nunca mais saiu.
O senhor de 100 anos tem uma carreira de renome fora das piscinas. Formado em contabilidade, economia e administração, fez parte da Federação de Entidades Empresariais do Rio Grande do Sul (Federasul) e do Sebrae, nas décadas de 1980 e 1990.
Em busca da consolidação do escritório de contabilidade no qual foi dono, largou os esportes e focou na vida laboral. Biedermann passava cerca de 14 horas por dia trabalhando e, em determinado dia, recebeu um convite inesperado de um amigo. A pergunta "vamos remar?" mudou a vida do então contador.
— Primeiro, respondi que não iria pois estava muito cansado. Mas remei por cinco minutos e todo o cansaço sumiu — comentou.
Depois de anos no remo, o gaúcho reencontrou a natação. Aos 75 anos, depois de 30 anos sem nadar, recebeu um convite para participar de um Campeonato Brasileiro de Natação master em Porto Alegre, e voltou a competir. O que ele não sabia era que o reencontro seria tão longevo.
Mesmo sem treinar o nado há tempos, fez um bom tempo e percebeu que aquele poderia ser o seu esporte de verdade. Algo tão família que passou para os seus filhos.
— O esporte nasceu conosco. Quando a gente era pequena, sempre foi incentivada a fazer exercício, aprendemos a nadar cedo. O pai realmente é uma inspiração, um incentivo. Às vezes a gente até é cobrado se já treinou no dia — relembra Rosane, filha de Biedermann.