Pedro Ernesto Denardin está no sétimo passaporte. Todos os continentes foram visitados. Quase uma centena de países. Pudera, já se passaram 50 anos da entrada na RBS. Completa meio século com uma coleção de histórias para contar. E temperadas com bom humor, sua marca registrada. Foi esse faceiro setentão (73 anos) que conversou com a reportagem.
Viveu alguma situação inusitada em transmissão de Gre-Nal?
A situação mais louca foi a decisão do Gauchão de 1999. O Ronaldinho fez um golaço, e o (Paulo) Sant’Ana começou a gritar “Pelé! Pelé! Pelé!”. Atrapalhou a narração, o Ruy Carlos Ostermann ficou brabo, e eu no meio da confusão.
Qual foi a história mais estranha que presenciou em uma cabine?
Na final da Libertadores de 2006, alguém inventou que o Casagrande (então comentarista da Globo) tinha ido ao vestiário do São Paulo motivar os jogadores. E chegou nele um boato de que eu que tinha falado. Ele subiu na cabine da Gaúcha e veio tirar satisfação. De fone, eu não ouvi direito. Então, o Silvio Benfica o expulsou de lá. Era tudo mentira, mas meu nome estava marcado por causa do gol do Sobis (narrou dizendo que o Inter rasgava a camisa do São Paulo).
Nos tempos de repórter, qual entrevista se orgulha de ter feito?
Foi na Copa de 1986, no México. Fui ao aeroporto e entrevistei com exclusividade o Maradona por 15 minutos. Outra legal foi na Copa de 1978. Entrei na concentração da Argentina e tinha o Ortiz, ex-Grêmio. Depois de falar com ele, pedi que trouxesse pessoas para entrevistar. Apareceram o técnico (Cesar Menotti), o Passarella, capitão do time, e o lateral Tarantini.
Na narração, quem gostava de ouvir?
Narrador tem escola, né? (Armindo Antônio) Ranzolin era da escola paulista. Eu era de outra. Ouvia o Mendes Ribeiro e o Pedro Carneiro Pereira. Tanto que comecei como narrador, aproveitando que minha voz é parecida, imitando o Pedro Pereira. Mas imitava mesmo. Até achar o meu jeito. Depois, o Ranzolin foi meu chefe, me ensinou coisas, me deu broncas, era bem mais formal do que eu.
Qual foi o melhor estádio em que trabalhou?
O melhor estádio, o mais bonito, foi onde o Brasil ganhou da China, pela Copa de 2002, o Jeju World Cup. Ficava no sul da Coreia do Sul. Uma cidade linda.
"Comecei como narrador, aproveitando que minha voz é parecida, imitando o Pedro Pereira"
PEDRO ERNESTO DENARDIN
E o pior?
Não diria que o pior, mas foi um lugar que fui uma vez e acabei voltando outras quatro, mas só porque era a trabalho. Foi Hernando Siles, em La Paz. Fica a 3,8 mil metros de altitude. Não tem elevador. Quando chegamos à cabine, depois de subir as escadas, já estamos mortos. Lá me vi mal algumas vezes.
Entre os nossos times aqui, qual foi o melhor Grêmio que viu?
Claro que esse do Renato que ganhou a Copa do Brasil de 2016 e a Libertadores de 2017 era bom. Mas tem um que até não teve grandes títulos, mas jogava muita bola. O time do técnico Otacílio Gonçalves da Silva, em 1988. Apelidei de “Grêmio Show”. Era um baita time, com Cristóvão no centro de tudo, e tendo Valdo, Lima, Cuca e Bonamigo ao lado.
Qual foi o melhor Inter?
Ah, sem dúvida o de 1975 e 1976. Aquilo era diferente de tudo no Brasil. E foi coroado com o bicampeonato brasileiro.
Qual a melhor Seleção Brasileira?
A de 1970. Nunca teve uma igual. Mas, trabalhando, gostei de 2002. Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho juntos. É como reunir Cristiano Ronaldo, Messi e Neymar hoje. E ainda Cafu e Roberto Carlos. Claro, teve uma força do juiz contra a Bélgica, mas isso aí faz parte do futebol.
Que nota dá para o Pedro narrador?
Em uma situação normal, daria 7 ou 7,5. Mas neste momento, estou em decadência. Já não tenho mais aquela visão que eu tinha, erro mais do que antes. E os estádios atuais ficam muito longe. Na Arena, a cabine fica no oitavo andar. Quando Ramiro e Arthur jogavam no Grêmio, nunca diferenciei. Acertava porque tinha 50% de chances (risos). Já foi ao Independência, ao Alfredo Jaconi? A cabine fica quase dentro do campo. Daí acerto. E outra coisa é o fôlego, isso muda. Para não sentir tanto, pratico exercícios, caminho, vou na piscina. Só não sou mais aquele guri de 30 anos.
Que nota dá para o Pedro cantor?
(Risos) Pô, essa é boa. Menos, né? Vou dizer francamente: não sou ruim cantando. Mas só sei 30 músicas. Vou alternando entre os shows. E ensaio bastante. Se precisa dar nota, acho 5,5.
Qual é sua relação com a música?
Todo mundo gosta de música. No meu caso, me adapto melhor com a música gaúcha. Não ando a cavalo, não tomo chimarrão. Mas isso é de família, meus pais, minha mulher, ninguém toma. Respeito, gosto das tradições gaúchas. E sobre a música? Dá dinheiro e gero receita aos músicos que me acompanham. E tem outra: nós, comunicadores, somos vaidosos. Aí, por exemplo, fui a Canoas no Dia do Trabalho e tinha 30 mil pessoas assistindo. Nos rodeios também têm multidão. Então a gente faz o pessoal cantar. É maravilhoso!
"Vou dizer francamente: não sou ruim cantando. Mas só sei 30 músicas"
PEDRO ERNESTO DENARDIN
Pensa em aposentadoria?
Vou trabalhar até morrer. Até quando vou narrar? Não sei. Diria que se já tive no estágio 10, hoje estou no 7,5. Não sei se vão ser três, quatro, cinco anos. Posso ser aproveitado em outra função, como comentarista, apresentador. É que depois dos 70, cada ano pesa muito. Por isso tem de se alimentar bem. A boca determina as doenças ou não.
São 50 anos de dedicação em uma profissão que exige sacrifícios. Como faz para manter a motivação?
Eu gosto, apesar de ter pouco tempo para a família. Faz 50 anos que não tenho domingo. Não tem Dia das Mães, Dia dos Pais, Páscoa. Mas o que nos acostumamos é inverter. Faz no sábado.
Algum dia vai revelar para qual time torce, ou torcia quando era guri?
Há 65 anos, mais ou menos, morava aqui na Glória. Era pobre. Não passei fome nem nada, mas não tinha grana. Mas tínhamos uma turma de gurizada que jogava bola, fazia confusão. Nosso time era o Gaiato.
E a torcida?
Tínhamos quatro estádios na região. Um era o da Montanha. O Olímpico, víamos o primeiro tempo de cima do morro, ainda não tinha o anel superior. Quando abriam os portões, entrávamos. Nos Eucaliptos, não dava para ver, mas conseguíamos entrar assim que possível. E ainda tinha o campo do Nacional, no Menino Deus. Formei uma cultura que não me dá dificuldade para narrar gol do Inter ou do Grêmio. Torço para os dois. Inclusive profissionalmente. Sabe por quê? Porque fui ao Japão várias vezes graças a títulos deles. Enquanto alguns vão com bandeira, eu vou com o microfone. Vou trabalhar.
"Torço para os dois. Inclusive profissionalmente. Enquanto alguns vão com bandeira, eu vou com o microfone. Vou trabalhar"
PEDRO ERNESTO DENARDIN
Como é o Pedro com as redes sociais. Pretende virar influencer?
Não. Somando as redes sociais, tenho 400 mil seguidores e quase não participo. Não tenho saco. Sabe quantas fotos tenho? Nenhuma. Fiz 12 Copas do Mundo e não tenho foto. Nunca tive máquina fotográfica. Jamais serei influencer, não tenho vocação. E não gosto.