O Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) julgou, nesta sexta-feira (24), o caso de injúria racial sofrido pelo meia Celsinho, do Londrina, em partida contra o Brusque, em 28 de agosto, pela 21ª rodada da Série B. O clube catarinense foi punido por "ato discriminatório": perdeu três pontos na tabela e terá de pagar multa de R$ 60 mil. A equipe que tinha 29 pontos e estava em 15ª cai para a 16ª posição, com 26 — um ponto acima do Vitória, primeiro time no Z-4.
Além da punição para o Brusque, o presidente do Conselho Deliberativo do clube, Júlio Antônio Petermann, terá de pagar multa de R$ 30 mil e cumprirá suspensão de 360 dias por "praticar ato discriminatório, desdenhoso ou ultrajante, relacionado a preconceito em razão de origem étnica, raça, sexo, cor, idade, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência". Cabe recurso da decisão no pleno do STJD, última instância nacional.
Na súmula da partida Brusque 0x0 Londrina, no Estádio Augusto Bauer, em Santa Catarina, o árbitro Fábio Augusto Santos Sá relatou que Celsinho ouviu no final do primeiro tempo: "Vai cortar esse cabelo, seu cachopa de abelha". Por conta disso, o Londrina ingressou com uma Notícia de Infração no dia 10 de setembro, anexando ao documento do jogo o Boletim de Ocorrência registrado pelo atleta, um vídeo do segundo tempo da partida em que afirma ser possível ouvir alguém gritar "macaco" e matérias jornalísticas veiculadas sobre o caso.
O clube paranaense citou, ainda, a nota oficial do Brusque após o episódio, em que critica o jogador Celsinho. No comunicado, a equipe diz que o jogador é "conhecido por se envolver neste tipo de episódio" e afirmou que tomaria "as medidas cabíveis para a responsabilização do atleta pela falsa imputação de um crime".
Antes desse episódio diante do Brusque, Celsinho já havia sido alvo de ofensas racistas em outras duas partidas, contra o Goiás e, uma semana depois, diante do Remo, ambos em julho. Nos dois casos, os xingamentos partiram de profissionais de emissoras de rádio durante as transmissões dos confrontos.
Durante o processo, o meia se manifestou:
— É pesado e constrangedor eu ter que dar satisfação ao meu filho mais velho, de 14 anos, que entende mais, que as pessoas ainda usam esse tipo de crime. O maior peso, onde realmente me machucou emocionalmente, foi pelo lado familiar, ver minha esposa chorando, meu filho chorando, meu filho mais novo sem entender e eu tendo que explicar que ele não tem que aceitar isso. É por isso que eu vou até o final nesses casos.
O presidente do Conselho Deliberativo do Brusque, Júlio Antônio Petermann, deu a sua versão sobre o que aconteceu e pediu desculpas ao jogador:
— Eles estavam entre o banco e o alambrado se aquecendo, xingando o Brusque. Teve uma hora em que me irritei e realmente proferi "Cachopa de abelha vai jogar bola". Isso foi um momento inadequado, onde o jogo estava quente. Queria aproveitar e pedir desculpas, se eu realmente o ofendi, e a todo o pessoal que eu possa ter ofendido. De maneira nenhuma eu quis ofender e não imaginei que pudesse dar essa confusão toda. Nessa região é muito comum chamar pessoas assim, de cachopa de abelha. Jamais iria proferir isso para ofender o Celsinho ou qualquer outra pessoa.
Em seu voto, o relator do processo e auditor do STJD, João Gabriel Maffei, considerou os fatos incontroversos em razão da confissão do conselheiro do Brusque.
— Houve ato discriminatório em razão da raça e cor? Sim, uma pessoa branca ofendeu o cabelo de um jogador negro. Jamais o jogador seria chamado assim se fosse branco. O objetivo foi atingir e ofender o jogador. A provocação trazida pela defesa não pode legitimar um revide em ato discriminatório. Refuto, também, a defesa que a cachopa de abelha tinha o contexto cultural e sim de ofensa e ridicularização. Muito me entristece saber que os filhos do Celsinho chegaram às lágrimas. Deve ser muito difícil sofrer um ato discriminatório. Se o dirigente não for punido à altura, com que moral poderemos exigir a conduta dos torcedores? — disse o auditor, que complementou:
— Espero que esse julgamento sirva como um paradigma para que os atos discriminatórios sejam abolidos do futebol, do esporte e da sociedade como um todo.