"Nossa cidade é muito grande e tão pequena, tão distante do horizonte do país...", cantava Humberto Gessinger há mais de 30 anos na faixa que dava nome ao célebre álbum da banda gaúcha Engenheiros do Hawaii. Cidades a exemplo dessa são a origem dos clubes que voltam a duelar pela retomada de um espaço entre os protagonistas do futebol brasileiro. O Juventude, da próspera Caxias do Sul, e o Guarani de Campinas, cidade com PIB superior ao da maioria das Capitais brasileiras. O Ju campeão da Copa do Brasil em 1999 e da Série B em 1994. O Bugre, campeão da Série A em 1979 e da B (Taça de Prata) em 1981.
O encontro está marcado para sábado, às 19h, no Estádio Alfredo Jaconi. Poderia ser apenas mais um jogo no longo calendário da Série B. Mas a disputa entre os alviverdes vale a liderança da competição e, possivelmente, uma escalada de volta à elite. O aproveitamento é idêntico: 66,7%. Percentual que, se mantido até o final da competição, poderá garantir o acesso à Série A.
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O cenário atual, entretanto, destoa das dificuldades enfrentadas por ambos especialmente na última década. No Brasileiro, os gaúchos baixaram à Série D. Os paulistas desceram 'apenas' até a C. Em compensação, enquanto o Papo seguiu disputando o campeonato regional com dignidade, o Bugre chegou a ser rebaixado no Paulistão. Mas por que clubes tradicionais, com títulos relevantes e representando cidades com poder econômico causaram tanta decepção em suas torcidas?
A inaptidão administrativa comum nos clubes brasileiros sempre estará no topo das causas. Mas a sensibilidade de Humberto Gessinger também ajuda a explicar. Caxias do Sul – 130 Km de Porto Alegre e Campinas – 98 Km de São Paulo estão longe demais das Capitais. Na realidade, estão longe demais das sedes das Federações de futebol e dos interesses de seus dirigentes. A esmola endereçada a esses clubes e a 99% das agremiações brasileiras destoa das fortunas reservadas para dez ou doze privilegiados. E ainda tem briga nesse grupinho, pois dois deles recebem bem acima dos demais. Aí estão os interesses comerciais de quem tem cacife para comprar os direitos de transmissão do campeonato. Mas, acima de tudo, está a mais clássica e perniciosa ação da cartolagem.
Já se fala que estamos a caminho de tornar essa distribuição de grana mais justa. Pago pra ver. Equidade, por enquanto, é vista no futebol inglês (Premier League): 50% do faturamento com direitos de transmissão são divididos igualitariamente entre todos os clubes; 25% são baseados na classificação da temporada anterior; e 25% são variáveis de acordo com o número de jogos transmitidos. Existe ainda um sistema de solidariedade que distribui recursos para as divisões inferiores. Isso contribui muito para o equilíbrio técnico. Aí sim as maiores torcidas poderão fazer a diferença a favor do seus clubes aderindo a estratégias inteligentes de marketing esportivo.
É impressionante como os Engenheiros do Hawaii foram visionários. "Eu sempre quis viver no Velho Mundo, na velha forma de viver...", está na letra da mesma música que inspirou esse artigo. Nada surpreendente vindo de quem previu que o Papa seria Pop. Então, dá-lhe Papa e dá-lhe Papo!
*O colunista Francisco Michielin está de férias.