Não muito tempo atrás, o programa de biatlo da Rússia (antigamente muito elogiado) estava em frangalhos. A equipe foi atormentada por questões de doping. Eles estavam perdendo grandes competições para países teoricamente mais fracos, como Bielorrússia e Cazaquistão. Uma importante autoridade do biatlo foi condenada por tentar encomendar o assassinato de um governador local.
Que diferença faz um oligarca.
De todos os títulos ostentados por Mikhail D. Prokhorov - proprietário do time Brooklyn Nets, playboy milionário, candidato à presidência da Rússia -, talvez o mais improvável seja este: presidente da Federação de Biatlo.
A equipe de biatlo da Rússia costumava estar entre as mais temidas do mundo - o grupo de revezamento masculino manteve o ouro olímpico de 1968 a 1988 -, mas o programa vinha enfrentando problemas nos últimos anos entrando, então, Prokhorov.
Ele assumiu o comando da Federação de Biatlo em 2008, um ano depois que Sochi, na Rússia, foi escolhida para sediar os Jogos de Inverno, e cobriu a equipe de dinheiro - assim como fez no Brooklyn com os Nets. Ele transformou o programa em uma máquina banhada a ouro na esperança de restabelecer a dominância russa quando as Olimpíadas começarem, em fevereiro.
Prokhorov está pagando para a equipe de biatlo viajar a Sochi em três jatinhos particulares, declarou Sergei Kushchenko, importante autoridade do biatlo e antigo representante de Prokhorov. Prokhorov recentemente concedeu "bônus pessoais" aos atletas, treinadores e dirigentes do biatlo, disse ele, embora sem descrever seu conteúdo.
Sob Prokhorov, a equipe contratou um dos treinadores mais conhecidos do mundo, vindo da Alemanha, junto a batalhões de assistentes. As acomodações na estrada melhoraram muito.
- Para Prokhorov, é muito importante permitir que seus atletas, esses caras na equipe internacional, pensem e foquem unicamente o treinamento e a competição, e não pensem nas camas ou outros detalhes - explicou Kushchenko.
Prokhorov é um entre diversos executivos russos de alto escalão - frequentemente chamados de oligarcas - que assumiram a responsabilidade por um esporte de inverno na expectativa de Sochi. Os magnatas trouxeram suas conexões, experiência e (o mais importante) bolsos extremamente recheados a organizações atléticas antes obscuras, alterando a paisagem competitiva internacional.
Andrei Bokarev, um bilionário de minas de carvão, é o presidente da Federação de Esqui em estilo livre. Alexei Kravstov, CEO da Kraftway, uma das maiores empresas de tecnologia da informação no país, é o presidente da Organização de Patinação. Vagit Alekperov, presidente da Lukoil, enorme empresa russa de petróleo, transformou sua empresa na patrocinadora da equipe de esqui cross-country.
Eles se ofereceram para o serviço olímpico, ou foram alistados? Como sempre, as relações entre o Kremlin e o mundo dos negócios são obscuras, e analistas políticos só podem especular sobre como exatamente os bilionários acabaram trabalhando com as federações esportivas.
Kushchenko explica da seguinte forma:
- Em nosso país todos querem vencer, e por isso foi decidido que os melhores executivos do país iriam coordenar algumas organizações de esportes. Hoje, muitos executivos do lado comercial já comandam a maioria das federações.
O envolvimento dos executivos indica a importância dos jogos para o presidente Vladimir Putin, que investiu anos, e dezenas de bilhões de dólares em fundos do governo, para colocar a Rússia entre as melhores nas Olimpíadas.
O biatlo, que combina esqui cross-country com tiro ao alvo, poderia ser visto como um estudo de caso para as ambições olímpicas da Rússia. Após décadas de dominância, a reputação da equipe foi manchada por escândalos de doping e pela condenação criminal, em 2007, de Alexander Tikhonov, ex-ídolo olímpico que foi o antecessor de Prokhorov na Federação de Biatlo.
(Tikhonov, que nega a acusação de ter contratado seu irmão para matar um funcionário público local, foi condenado a três anos na prisão, mas acabou imediatamente liberado sob uma lei de anistia.)
Foi durante essa crise que Prokhorov, que fez sua fortuna na mineração de níquel, tornou-se presidente da União Russa de Biatlo. Prokhorov possui uma conhecida paixão por basquete e esqui, mas Kushchenko não soube dizer se seu chefe tinha qualquer experiência anterior com biatlo (entretanto, ele afirmou, em tom de brincadeira, que tanto biatlo quanto basquete começam com a letra B).
Ele disse que Prokhorov, que se recusou a ser entrevistado para este artigo, era motivado por patriotismo:
- O orgulho nacional vem em primeiro lugar.
A nova equipe da Rússia vem sendo observada bem de perto no circuito do biatlo, atraindo inveja e ressentimento.
Noruega, Alemanha e França possuem fortes programas do esporte, mas nenhum possui recursos comparáveis aos da Rússia. Kushchenko não quis definir um número para o orçamento da equipe de biatlo, mas disse combinar financiamento do governo e de Prokhorov.
Nos Estados Unidos, o biatlo não possui tanta popularidade. Tim Burke, talvez o melhor biatleta americano em sua geração, não precisa exatamente se preocupar com os paparazzi.
Embora os esportes Olímpicos dos EUA recebam algum financiamento através de patrocínios corporativos, os atletas americanos olham para os recursos da Rússia e suspiram.
- Os russos viajam com uma equipe enorme, mais treinadores e assistentes do que atletas. Eles voam muito em aviões particulares, de Copa do Mundo a Copa do Mundo - comparou Burke.
O orçamento de biatlo nos EUA não permite luxo em viagens aéreas - ele corresponde a cerca de US$1,6 milhão para as Olimpíadas, afirmou Max Cobb, presidente da U.S. Biathlon.
- Suspeito que o orçamento russo seja provavelmente 10 vezes essa quantia. Isso é realmente assustador. Eles estão excepcionalmente bem servidos - disse ele.
Um dos maiores desafios de Prokhorov foi limpar a Federação após uma série de escândalos de doping. Em 2009, três biatletas russos foram suspensos com exames positivos para um hormônio que altera o sangue. Acabar com o doping era a prioridade mais alta, contou Kushchenko, e autoridades internacionais aplaudiram os esforços da Rússia.
Prokhorov "abordou os problemas de doping no biatlo russo com muita seriedade", garantiu Anders Besseberg, presidente da União Internacional de Biatlo.
No Brooklyn, Prokhorov foi criticado por ser um proprietário ausente dos Nets, mas ele parece ter assumido o papel de líder de torcida do biatlo. "Bravo, bravo, e mais uma vez bravo", escreveu ele em seu blog pessoal em janeiro, depois que as atletas russas venceram uma competição da Copa do Mundo na Alemanha. A exibição ofereceu "esperança para futuras vitórias russas, e não somente nos esportes".
Contudo, Prokhorov sabe que, no fim, será julgado por uma única medida: medalhas olímpicas de ouro. Ele declarou que pedirá demissão caso a equipe russa não consiga ao menos duas em Sochi.
Os russos possuem uma equipe competitiva, mas o ouro não está garantido. Dos 15 melhores biatletas internacionais masculinos, quatro são russos; das 15 mulheres com maior pontuação, apenas duas são russas. Quanto aos próprios atletas russos, eles parecem estar gostando da era Prokhorov.
- Com a chegada da nova liderança, fomos capazes de relaxar um pouco. Não precisamos nos preocupar com nossa locomoção para outros lugares ou o que vamos comer durante as Olimpíadas - afirmou em 2010 Maxim Chudov, então capitão da equipe.
Prokhorov e seus dirigentes acham que já fizeram a parte deles. Agora é com os biatletas.
- A equipe nacional russa conseguiu os melhores equipamentos e investimentos para ter o melhor desempenho. Vamos ver no que vai dar - disse Kushchenko.
Pelo ouro olímpico
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Equipe de biatlo da Rússia passava por tempos difíceis quando Mikhail D. Prokhorov assumiu o comando da federação do esporte no país
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