Ser jogador profissional de futebol é o sonho de Vanderlei Gonçalves da Silva, 23 anos, e Vicente Júnior, 19, assim como de tantos outros jovens que veem na bola um futuro melhor. Ambos são atletas do Milan, de Júlio de Castilhos, time que disputa a Série B do Campeonato Gaúcho, e como os demais companheiros do time, têm outra atividade profissional além da praticada dentro de campo. Na rotina diária de Vanderlei, ao invés da bola, o seu principal instrumento é a colher de pedreiro. É com essa ferramenta que ele garante o sustento ao mesmo tempo em que almeja chegar a um clube grande.
- O serviço é pesado, mas, se não for desse jeito, não vivo só com o dinheiro do futebol. O trabalho é bom, pois ajuda a manter o preparo físico - afirma o profissional, que atua como atacante na equipe.
No caso de Júnior, que é zagueiro no rubro-negro castilhense, o período diário de trabalho começa às 7h. Ele é responsável por manter o fogo da caldeira que aquece a piscina de uma academia da cidade. Após um intervalo de almoço, o jogador volta às atividades até as 17h. Depois disso, Júnior vai para casa e se prepara para o treino, que começa por volta das 19h, faça calor, frio ou chuva. O jovem atleta, que há pouco tempo trabalhava em uma lavagem de carros, reconhece as dificuldades e não reclama.
- Meu sonho é tocar a vida com o futebol, mas, enquanto não dá, vou me virando de outra forma - analisa o zagueiro, que já fez testes no Grêmio e carrega no currículo atuações nas categorias de base do Inter-SM, até chegar ao Milan.
Cerca de 95% dos jogadores do clube tem outra profissão
O presidente do Milan, Márcio Rubin, é responsável pela contratação dos jogadores. De acordo com ele, a ideia de montar um grupo com nomes locais tem a finalidade de diminuir custos. Segundo Rubin, 95% dos atletas exercem outra atividade profissional (veja quadro), além de defender as cores do clube.
Assim, após um dia inteiro de trabalho, todos vão ao gramado do Estádio Miguel Waihrich Filho. O principal motivo é que o clube não tem patrocínios, trabalha com uma baixa arrecadação e não pode pagar altos salários aos atletas.
- Não temos como proporcionar isso a eles. Por esse motivo, garantimos que não tenham despesas extras. Uniforme, alimentação e transporte para os jogos fora de casa são pagos pelo Milan - diz o presidente.
Desgaste reflete dentro de campo
Poucos reforços vêm de fora, assim como o treinador Marcelo Gaúcho (ex-jogador de Guarany-CA, Lajeadense, Passo Fundo, Riograndense e São Paulo-RG), que mora em Cruz Alta e atua em outras áreas quando não está na casamata. Para completar a renda, ele também é motorista de caminhão e mototaxista, além de receber uma simbólica quantia para defender um time amador de Santa Maria, aos sábados.
O técnico reconhece que as atividades paralelas refletem no desempenho de campo. Apesar disso, ele revela o principal motivo para seguir à frente da equipe do Milan.
- Temos muitas dificuldades, mas não desisto do meu trabalho, porque é jogando que os meninos têm chance de estar na vitrine e, quem sabe, chamar a atenção de um clube grande - diz ele, salientando que não pode ser radical com os atletas nos treinos, que ocorrem à noite, pois estão exaustos após um dia inteiro de trabalho.
Nas partidas de meio de semana, o treinador tem mais um obstáculo: levar o time completo a campo.
- Às vezes, monto um time forte no treino, mas, no dia da partida, o atleta não é liberado do emprego, ou tem aula e não pode ir. Daí, meu plano não dá certo - afirma o técnico, que até já passou informações por telefone a jogadores que não puderam treinar.
O TIME E OS EMPREGOS
Goleiros
Vinícius - Vendedor em uma loja de carros
Robson - Serviços gerais em uma empresa de compressores
Marcos - Mototaxista
Augusto - Estudante
Zagueiros
Paulo Cesar - Vendedor
Vicente - Operador de caldeira
Murilo - Serviços gerais em uma madeireira
Pereto - Funcionário público
Laterais
Alexandre Silveira - Lavador de carros
Diozer - Professor
Dênis - Estudante
Jean Padilha - Estudante
Roque Júnior - Serviços gerais em uma madeireira
Meias
Perci - Empresário
Alexandre Pirata - Mototaxista
Bolacha - Pedreiro
Michel Douglas - Apenas jogador
Volantes
Peter - Professor de informática
Kaian - Militar
Atacantes
Vanderlei - Pedreiro
Alisson - Funcionário público
Jean Nunes - Estudante
Saulo - Serviços gerais
Patrick - Estudante
Técnico
Marcelo Gaúcho - Atleta do amador, motorista de caminhão e mototaxista