Até o começo do século, um turista que fosse a São Petersburgo e quisesse trazer um mimo para um amigo provavelmente compraria um livro em russo de um dos grandes autores vinculados à cidade. Nos últimos anos, o crescimento do Zenit faz com que a camisa do clube passe a ser um outro souvenir a ser considerado. O histórico da equipe interessada em tirar Yuri Alberto do Inter tem menos craques do que os escritores ligados à segunda metrópole mais importante da Rússia como Gogol, Dostoiévski, Anna Akhmatova e Nabokov.
Os nomes mais relevantes a terem passado pela chamada Capital do Norte não terminam com sufixos típicos de sobrenomes russos. Eles atendem por Hulk, Giuliano, Hernani, Maurício, Douglas Santos, Wendel e Claudinho. Apesar da história quase centenária, o Zenit, fundado em 1925, teve tamanho inflado a partir de 2005, quando a Gazprom, principal empresa de energia do país, assumiu o clube. O aporte financeiro impulsionou resultados.
Desde a chegada da estatal foram sete títulos nacionais, o que transformou o Zenit no segundo maior vencedor da Premier League Russa — o maior é o Spartak, com 10 — e atual tricampeão do torneio. A próxima etapa será ter desempenho mais vigoroso na Champions League, onde nunca passou das oitavas. Ano passado, investiu 12 milhões de euros para tirar Claudinho do Bragantino. Agora está disposto a pagar 20 milhões de euros por Yuri Alberto.
O primeiro brasileiro a chegar foi Hulk, contratado para a temporada 2012/13 por 40 milhões de euros, mesmo valor pago para trazer o belga Witsel, na mesma janela de transferências, e o brasileiro Malcom, em 2019.
— Fiquei oito anos na Rússia, dois deles no Zenit. Sempre foi uma potência. Quem fez a mudança principal foi o Hulk. Foi ali que começou a despontar. Ele foi muito decisivo — explica o volante Maurício, revelado pelo Fluminense e atualmente no Panathinaikos.
Só com a contratação de brasileiros o investimento beira os 139 milhões de euros desde a compra de Hulk. O crescimento também passou pela busca de técnicos de fora do leste europeu. Dick Advocaat (duas Copas com a Holanda), Luciano Spalletti, André Villas-Boas e Roberto Mancini (campeão da Euro com a Itália) conheceram São Petersburgo nos últimos anos. No momento, o russo Sergey Semak está à frente da equipe. Ele conta com um brasileiro como assistente.
O principal momento vivido pelo Zenit foi ainda antes do garimpo de jogadores brasileiros no mercado. O principal título foi a conquista da Copa Uefa (atual Europa League) em 2008. Na final, a vitória foi sobre os Rangers. Antes, nas semis, aplicou 4 a 0 no Bayern de Munique. Na sequência do primeiro título internacional, superou o Manchester United na Supercopa da Uefa.
Antes da Era Gazprom, a sala de troféus tinha uma taça da Liga Soviética e duas da Copa Soviética. No restante da história, o Zenit foi um clube que teve poucos feitos dignos de serem manchete no Pravda (principal jornal da União Soviética). Tampouco o passado foi um drama digno de Dostoievski. Até os anos 1980 levava uma vida insossa nos gramados, exceção feita ao campeonato de 1967. Logo na temporada do cinquentenário da Revolução de 1917, foi rebaixado.
Como São Petersburgo, então chamada de Leningrado, seria o centro dos festejos devido à sua importância para que os comunistas assumissem o comando da União Soviética, o governo decidiu por não rebaixar o Zenit. Nos anos 1990, a queda foi inevitável. Foram três temporadas na segundona russa.
Outro asterisco no currículo do clube esteve nos atos de racismo contra Malcom, logo que o atacante começou a atuar pelo Zenit. Uma atitude que contradiz o histórico da torcida.
— Os torcedores foram muito acolhedores. Teve uma época que não estávamos bem e perdemos um jogo importante. Depois, entrei no carro com a minha mulher. Vi muitos torcedores vindo na minha direção. Fiquei preocupado, mas eles só queriam tirar foto, apesar da situação — relata Maurício.
A atual temporada teve eliminação na fase de grupos da Champions. Em fevereiro, o time enfrentará o Betis, nas oitavas da Liga Europa. Em casa, lidera o Campeonato Russo com dois pontos de vantagem para o Dínamo Moscou.
Uma cópia fiel daquilo que o Zenit faz desde 2005.