Por Amanda Munhoz, Leandro Behs, Rafael Diverio e Rodrigo Oliveira
Vitorio Piffero voltou à ativa. Após meses recluso devido aos dissabores provocados pelo rebaixamento e pela rejeição das contas de sua gestão no Conselho Deliberativo do Inter, o ex-presidente do clube de 64 anos resolveu partir para o ataque. Promete processar seus detratores nas redes sociais e, na sua pasta de couro, carrega documentos que segundo ele comprovam a sua idoneidade. A principal delas, os R$ 9 milhões em obras internas no Beira-Rio, sendo R$ 799 mil com notas sequenciais e de empresas com sede no subúrbio de Viamão e numa cobertura em Torres, alega datarem de 2015 e que foram aprovadas pelo Conselho Fiscal. Nesta entrevista ao Grupo RBS, Piffero se diz vítima de perseguição política no Inter por ter sido o presidente que rebaixou o clube em 2016. Ainda não conseguiu retomar a sua rotina normal, evita muitos lugares, entre eles o Beira-Rio, onde jamais voltou. Confira os principais trechos:
O senhor não foi apresentar sua defesa ao Conselho. Não poderia ter ido lá?
Quando for chamado, vou lá.
Mas precisa ser chamado? O senhor é conselheiro?
Mas irei lá, quando for chamado. Tenho muito mais coisas para contar.
Por exemplo?
Vou esperar ser chamado.
Quando vai ser chamado?
Já faz um ano, ainda não sei. Aguardo.
Nenhuma vez?
Não fui chamado nenhuma vez em 2015, 2016 ou 2017.
O senhor não foi convocado em 17 de abril do ano passado?
Não. Recebi a chamada como conselheiro.
Como o senhor avalia sua gestão?
Vou pegar um documento. Existe uma coisa que é o clube de futebol e como o clube de futebol é administrado. Eu fui presidente seis anos. Administrei sempre da mesma maneira. A sindicância levantou alguns pontos, como obra por adiantamento de caixa e sem contrato. Esta ocorrência aparece sempre nos últimos 15 anos. Em todos os anos foi feita a ressalva pelo conselho fiscal ou pela auditoria do conselho fiscal de que foram feitas obras por adiantamento de caixa e sem contrato. Fragilidade nos controles relacionados a adiantamentos de valores ou sua prestação de contas: aparece 12 vezes. Fragilidade nos processos de compras não utilização do sistema de informática: 11 vezes. E assim vai.
O Inter apresentou um déficit de R$ 50 milhões. É tudo da gestão atual?
Déficit é sempre anual. É o que a gestão programa fazer de 1º de janeiro a 31 de dezembro. Não está dito em lugar nenhum nem no relatório da Ernst & Young. O que fez a Ernst & Young? Olhou minha gestão e fez um relatório para que o Inter tivesse uma nova e melhor gestão em 2017. Um novo clube surgindo, alicerçado em documentos e na análise de uma grande empresa. É importante ressaltar que não aparece nesse relatório os mais de R$ 80 milhões de causas trabalhistas e cíveis com origem na gestão Luigi, cujo vice de futebol é o nosso atual presidente. Forlán, 10 milhões. O presidente foi ao Uruguai porque iria começar o bloqueio bancário. Scocco, R$ 8 milhões. Orlando da Hora, 3 milhões. André Cury, nas transações do Dagoberto. Eram R$ 7 milhões. Só aí tem quase R$ 30 milhões em quatro ações, que começaram na gestão anterior à minha, cujo vice de futebol é o nosso atual presidente (a direção do Inter nega o débito).
Sobre a gestão 2015/2016, o senhor classifica como boa?
Do ponto de vista administrativo ela foi igual às outras. Ela foi desaprovada, mas foi igual às outras. Se quiser pegar de mais tempo, pode pegar, era ainda mais esculhambado. Não que agora seja esculhambado. Mas era pior. Os argumentos para desaprovar minhas contas os mesmos dos anos anteriores.
Se acha perseguido político?
Não acho, tenho certeza que estou sendo perseguido. Estou sendo penalizado pelo rebaixamento.
Só por isso?
Essa é a minha avaliação.
Por que os vices citados, como Pedro Affattato (de finanças) e Emídio Ferreira (de patrimônio) não recebem a mesma crítica?
Porque ficou tudo na "gestão Piffero". Pela amplitude das coisas que abrangem várias vices presidências, se fosse uma dessas só, seria aquela especificamente. Administrativo: não foi feito contrato para fazer a apresentação do futebol americano. Foi feita, sim. Eu, Vitorio, aluguei por valor irrisório de R$ 300 o centro de eventos quando em outras ocasiões foi alugado por R$ 15 mil. Mas quando se faz uma festa para 1000 convidados, se cobra R$ 15 mil. Quando se faz uma festa para 20 pessoas, conselheiro, diretor da base, se cobra R$ 300.
Mas por que esses vices não lhe defendem?
Assim como eu, eles também não têm os documentos para se defender. Eu recebi os documentos em 18 de dezembro.
A questão dos R$ 9 milhões para empresas situadas em Viamão e Torres...
Onde tu pensa que estão estabelecidas as pequenas empresas de mão de obra? Em Brasília?
Em Viamão e Torres?
Viamão, Torres, Cachoeirinha, Gravataí, e por aí vai...
Em Torres é uma cobertura.
Isso é tu que está dizendo.
E em Viamão é um bairro popular.
Vocês já viram um carro de empreiteira passando pela rua? Daqueles com várias pessoas dentro e uma escada em cima.
Sim.
Acham que eles moram onde?
As que fazem contrato de R$ 9 milhões, possivelmente, não na periferia das cidades.
Não foi um contrato, foram 12.
Quais obras foram essas?
Todas essas obras, são 12 ou 13 obras. Primeiro, pela empresa de auditoria Bakert Tilly, contratada pelo Conselho Fiscal. Olhou obra por obra. "Verificamos a emissão de três cartas convite para contratação de serviço de construção civil, referente ao serviço de adaptação do estádio com material e mão de obra datado no dia 19 de janeiro. Quem fez isso foi a empresa de auditoria: "Examinamos os orçamentos encaminhados com as empresas convidadas. Formalizadas e devidamente assinada pelos representantes". "Verificamos a cotação de preço", diz a empresa. Então tinha cotação de preço. Tinha três convidados. Emissão pelo Patrimônio, para afins comparativo de preço. Devidamente assinado pela vice presidência de patrimônio. Também examinamos os relatórios de medição de serviço, medição única. E a pá de cal. "Inspecionamos relatório fotográfico da execução da obra".
Isso o senhor vai levar para o Conselho?
Isso é uma auditoria feita em 2015 sobre as obras de 2015. Foi uma empresa contratada pelo conselho fiscal.
Tudo isso veio à tona em função de o Inter ter caído para a Segunda Divisão?
Por que essa auditoria não foi feita antes? Por que essa auditoria de 2015 não foi citada? Isso foi apresentada novamente em 2017 em uma reunião do conselho fiscal.
A gestão fiscal está lhe perseguindo?
Tu quem tá dizendo. Isso aqui é um relatório sobre as obras de 2015. O que aparece no relatório de obras referente a 2015/2016. Em 2015, as minhas contas foram aprovadas sem ressalvas. São obras de 2015, cujas contas foram aprovadas sem ressalvas.
Sua consciência está tranquila?
Total. Não tenho a menor dúvida. Eu fiquei chateado porque eu rebaixei o clube. Participei das maiores conquistas. Mas rebaixei o clube.
E como tem sido o seu dia?
Sobre o episódio da praia, aconteceu que meu irmão saiu para me defender. Meu irmão, com mais de 60 anos, xingou ele, que foi embora. Isso se transforma. Eu não vou botar meus amigos e minha família em desconforto. Eu tenho vivido esse desconforto. Eu não tenho nada para esconder. Assim que eu recebi (a documentação), vim aqui no maior meio de comunicação. A diferença desses detratores, que eu estou aqui. Tem meu endereço, CPF. Quero ver quem tem c** para fazer isso.
Senhor tem frequentado os mesmos lugares?
Eu ando profundamente chateado da maneira como o meu clube tem me tratado. Eu não vou no Inter. Nunca mais fui.
Mas pensa em voltar?
Não. Eu assisto a jogos. Não se faz o que fizerem. Eu vou até o fim contra esses detratores.
Você se sente injustiçado?
Quando se faz justiça? Nosso estatuto diz: garantida a ampla defesa. Antes de me entregarem isso aqui (os documentos), fui execrado de agosto até dezembro. Isso é justiça? Ou fui julgado antes de me defender? O tipo de gestão que encaminhou a desaprovação das contas é a mesma feita no clube há 15 anos. Vai valer só para mim? MP tem que investigar os 15 anos.
Você entregou o clube melhor do que recebeu, fora o resultado de campo?
Não tenho dúvida.
Financeiramente também?
Não tenho dúvida. O que eu paguei de conta da antiga gestão. Paguei certamente R$ 70 ou R$ 80 milhões da gestão anterior.
Para isso o empréstimo do Banrisul de R$ 60 milhões?
Não, não era só para isso. Ao longo dos dois anos.
Anderson e o tempo de contratado e a liberação do D'Alessandro não foram erros da sua gestão?
O presidente que disser que não errou, está mentindo. O Anderson tinha um passado futebolístico maravilhoso. Cinco anos de Champions League e eu resolvi apostar nele. Não deu certo, não conseguiu se recuperar. Vou dar exemplo do Sobis. Veio para o Inter e foi liberado para reencontrar o futebol. E agora está aí.
E o Moledo?
Moledo veio se recuperar no Inter. Quando ele não estava pronto a sua recuperação, é uma atitude que o Inter tomava sempre. Acontece que ele foi para a Grécia e recuperou-se. Se voltar, vai ser ótima contratação.
Não foi erro liberar o D'Alessandro?
Eu estava no Rio de Janeiro em uma reunião da Liga Sul-Minas-Rio. E ele me disse que já tinha conseguido 200 mil dólares pelo valor do empréstimo. Quando o teu craque diz isso... tive que liberar.
Senhor ficou como "gestão Piffero". Tem jogadores que até hoje sofrem com o rebaixamento. Neste ponto, onde entra a responsabilidade do Carlos Pellegrini, que contratou e renovou com uma série de jogadores?
Onde entra a responsabilidade dos vice anteriores? Onde entra?
Mas neste ano específico o Inter caiu.
Então, qual a responsabilidade em cair? É minha.
Senhor não carrega essa cruz sozinho?
Cada vice presidente é responsável por cada deliberação da sua pasta. E se forem chamados, vão falar. Esses erros e acertos acontecem. Essa gestão atual (presidente Marcelo Medeiros e e vice de futebol Roberto Melo), trouxe jogador em um dia e mandou embora no outro.
E por que caiu?
Não é um fator. Eu não saberia te dizer. É uma conjuntura. Aquele time que caiu liderou o brasileiro. E a partir daí, desandou. Tentamos fazer de tudo. Trocamos, e não conseguimos mudar. E resulta, lamentavelmente, na questão do rebaixamento. Mas voltamos e espero que as coisas cada vez melhorem mais.