Passei três dias da semana que passou na agradável e bucólica Veranópolis. Comentei a vitória do Grêmio sobre o VEC, na RBS TV, ao lado do Paulo Brito e seus bordões. Voltei de lá ainda mais defensor dos campeonatos estaduais, ao contrário da onda nacional para enterrá-los de vez. Os quero mais enxutos, com menos participantes e gramados melhores. Os gramados, inclusive, deveriam ser eliminatórios. Quem não tem abre vaga para outro que atenda esse pré-requisito básico. Como disputar um campeonato num barral tipo freio de ouro?
Por um Gauchão transformado, para garantir a sobrevivência de comunidades amantes do futebol capazes de produzir personagens como Sandro Sotilli e suas frases de impacto. Como esta, sobre a importância do contato com a comunidade no interior:
- Quem está lá no alto só quer saber de avião, mas de vez em quando é bom pegar um busão e colocar o pé na estrada para conhecer o carinho sincero do torcedor do interior.
O alemão matador defendeu nada menos do que 12 equipes do futebol gaúcho, incluindo o Inter. Jogou três anos no México, uma temporada na China, mas foi no interior que se consagrou ao ponto de viver da fama que conquistou. Isso mesmo: o emprego de Sotilli, desde que pendurou as chuteiras, é ser Sandro Sotilli. Nem ele tinha dimensão do tamanho do mito que o tão desprezado Gauchão seria capaz de produzir.
Tudo começou com um perfil falso no Twitter, criado de brincadeira por um fã. Em questão de dias, 3 mil tuiteiros seguiam o @SandroSotigol. E depois 15 mil, 30 mil, 100 mil, até os atuais 230 mil. Criador e criatura se conheceram e acertaram algo curioso. É um caso raro de perfil fictício oficial, que evoluiu para uma página no Facebook. Pelas redes sociais, os fãs de todas as partes do Gauchão, conquistados numa carreira de duas décadas, acharam um ponto de encontro. Resumindo: a brincadeira cresceu, e o maior artilheiro da competição, com 112 gols, viu uma maneira de gerir sua imagem. A Zoeira do Gauchão, que reúne memes da competição, é sucesso absoluto.
- Estou mais famoso agora do que no tempo em que jogava. Tudo ganhou proporções impensáveis. Me chamam no palco para entregar bonés e presentes e falar ao microfone. Joguei no México e na China, mas é a força do Gauchão que me deu tudo isso. Estou fazendo o que mais gosto nessa vida: contar histórias, comer uma carne, bater uma bolinha com os amigos. Em suma: me divertir. E ainda me pagam! (risos)
Os municípios o disputam a tapa. A presença em bares, restaurantes, churrascos, festas, empresas para tirar fotos e contar histórias reunidas em centenas de jogos em praticamente todos os estádios gaúchos, sai por R$ 2 mil. Há também um pacote que abrange o dia inteiro. Aí é mais caro: até R$ 5 mil livres, tirando os custos com os músicos e o deslocamento. À tarde, futebol dos amigos do Sotigol contra uma equipe local. A bilheteria fica com os organizadores, mas ele embolsa um percentual também. À noite, bailão com a banda San Marino. No time dele, ex-jogadores: Gabiru, Fabiano, Arílson, Christian. Se o evento for beneficente, ele faz de graça. Em Sarandi, duas mil pessoas. Em Carazinho, 1,8 mil. A agenda está repleta até abril: Frederico Westhpalen, Santa Maria, 1º de Maio, Santo Ângelo, Sarandi, Vacaria:
Mas e a tese do fim dos estaduais para enxugar o calendário, defendida por muita gente?
- Quando escuto isso me dá uma tristeza. O pessoal do Interior que ver os seus ídolos. Em Passo Fundo, onde moro, deve haver 5 mil sócios de Grêmio e Inter. Eles não merecem receber os jogadores na cidade? Asism é em outras cidades. E vão fazer o que com as torcidas do Pelotas, do Brasil, do São Paulo-RG, do Passo Fundo? Tem de respeitar o calendário da Dupla Gre-Nal, mas há vida pulsante no Interior, e ela não pode ser tratado como se não existisse.
Fecho meu papo com Sandro Sotilli com uma revelação surpreendente. Trata-se do Gauchão tipo exportação. Ele tem ido a Santa Catarina com a Sotilli's Fest. Estão surgindo convites do Mato Grosso.
- Onde houver gaúcho para ouvir histórias do nosso Gauchão, eu vou. O Gauchão sempre será a minha vida.
Quantos Sotillis há por aí, nem tão famosos, mas que igualmente fizeram fama em seus municípios graças aos caminhos e descaminhos do nosso torneio provincial?
*ZHESPORTES