1983
Parece um sonho, Grêmio. Tu te sagraste, ontem, campeão da América. Terminou naquela apoteose de ontem no Olímpico, que ainda se alastra hoje por todo o Rio Grande do Sul. Que vitória, Grêmio. Valeu o esforço de todos. Dos jogadores, dos treinadores, dos dirigentes e funcionários de hoje. E de todos os jogadores, treinadores e dirigentes de todos os tempos. Porque, ontem, por exemplo, Grêmio, estavam nas sociais o Juarez e o Airton, entre tantos outros jogadores do passado. E como o Juarez ainda é e sempre será gremista, Grêmio! Ele é doente pelo Grêmio. E o Airton? O maior zagueiro de todos os tempos vibrou com a vitória de De León, ontem, Grêmio. Então, a vitória é de todos os ex-presidentes, de todos os ex-presidentes, de todos os ex-diretores, de todos os ex-funcionários, Grêmio. Foi o trabalho e o amor deles em todos os tempos que te levaram à grande e eterna vitória de ontem, Grêmio.
Que coisa, Grêmio. Nasceu no humilde Fortim da Baixada. Quanta dificuldade, quanta singeleza, Grêmio. Veio depois para o Olímpico. Quanta ambição, Grêmio. Já ali um time espantava a todos nos anos 50 e 60. E ameaçava ser campeão brasileiro nas Taças Brasil. Por sinal, merecia. Mas eu juro que os juízes não deixavam chegar à glória que merecias, Grêmio. Pois ontem ela veio muito maior que a que te roubaram há mais de 20 anos.
Ela veio às enxurradas, glória para que nós bebamos todos os dias, todas as noites de toda a nossa vida, Grêmio.
Glória que nos embebedará toda a vez que tua amada camiseta tricolor entrar em campo.
Que lindo, Grêmio. Que esforço de Fábio Koff. Que oportunidade feliz a vinda do Mazaroppi, Grêmio. Que negócio magnífico a tua torcida, Grêmio.
Ela ontem atendeu a todos os nossos apelos. Que gesto o do América de Cali, Grêmio. Jamais esqueceremos a dignidade do América de Cali, o presidente já me prometeu que perpetuaremos nas paredes do Olímpico a honradez dos nossos irmãos colombianos da América, eliminando o Estudiantes que, por direito, nós já tínhamos eliminado. Que emoção, Grêmio. Tu ontem foste exatamente o que nós sempre quisemos de ti e sabíamos que tu eras capaz de nos dar.
A América agora é tua, Grêmio. E o mundo, a terra, todo o planeta se oferece para ti, em Tóquio, em dezembro. Se fores campeão mundial, Grêmio, eu já disse: bordaremos na tua camiseta o globo terrestre, abaixo dele a frase célebre de Iuri Gagarin, quando viu lá de fora do nosso planeta a imensa esfera em que habitamos: "A Terra é azul". Que palavras proféticas do Gagarin, Grêmio. Agora, Grêmio, a felicidade invade o coração dos teus torcedores. Eles são capazes até, de tanta alegria, de tamanho comportamento, de suportar todos os pacotes, de aguentar no osso do peito, os 130% de aumento de BNH, de sofrer sorrindo a inflação galopante. Porque nós vamos ficar de hoje em diante tão magnetizados pelo encanto do teu triunfo que a nossa vida será leve, o nosso trabalho será suave, os nossos sacrifícios terão perfume de rosas.
Missão cumprida, Grêmio. Agora é festejar até as lágrimas, como já fizemos ontem, a grande vitória. Chegaste à tua destinação. Orgulhaste o Brasil e o Rio Grande. Agora, não tens mais limites físicos, Grêmio. Tu que nunca tiveste fronteiras espirituais. Chora, ri, vibra, enlouquece, torcedor gremista.
Tua paixão agora desce desde as planícies do Missouri até a Patagônia.
O continente do futuro, a Terra Prometida, a América do Sol tem um soberano do futebol. Tu és o rei, Grêmio E eu vou cantar-te nos meus versos, todos os dias em todos os meus programas e colunas. Eu vou cantar-te nos meus poemas, que voltei a fazê-los depois de 20 anos. Como esse, em homenagem à tua imorredoura conquista de ontem:
GRÊMIO, MEU BEM-QUERER/PAIXÃO DO MEU CORAÇÃO/GRÊMIO, ATO DE FÉ/ESTADO DE ESPÍRITO/GRÊMIO, MEU CHIMARRÃO/NOS 200 ANOS DO NASCIMENTO DE SIMON BOLÍVAR/EU SORVO INTEIRA A TUA GLÓRIA/TEU IMENSO PALA TRICOLOR/AQUECE E ENVOLVE AGORA/TODA A AMÉRICA QUE COLOMBO MANTINHA ATÉ ONTEM DESCOBERTA.
1995
Ganhar uma Libertadores já parecia inacreditável para os gremistas. Duas, então, era uma utopia. Incrivelmente realizada. Quase não dá pra crer. Mas é real, eu estava lá e vocês viram pela televisão. O Grêmio de Fábio Koff torna-se assim um dos mais importantes clubes de futebol do mundo. Quando se fala em grande clube internacional, obrigatoriamente em todas as latitudes, se pronunciará o nome Grêmio, indicativo de que na Província de São Pedro, capital Porto dos Casais, como eram chamados o nosso Estado e nossa cidade, ao tempo em que se vivia aqui a doce calma colonial, existe um núcleo de paixão notável, colorido com três tons, que arrebata a maior parte da população pampeana. Agora duas vezes campeão da Nova Terra, descoberta por Cristóvão Colombo.
Duas vezes campeão da faixa de terra que vai das estepes do Alasca até os lagos gelados da Patagônia é demais. Nem os próprios gremistas conseguem se livrar dessa violenta impressão, que parece um sonho.
Que as palavras imprescindíveis sejam agora dirigidas aos colombianos. A polícia protegeu os jogadores do Grêmio e os dirigentes, a nós, jornalistas, como se fôssemos tesouros humanos intocáveis. Pareciam querer mostrar que aquele pedaço de terra americano de formosura ímpar, cujos campos que avistei do avião na descida sobre Medellín pareciam jardins bens cuidados, a exemplo das pradarias escocesas e das montanhas suíças, não é só marcado pelo narcotráfico que a mídia internacional torna mais importante do que é. Eles queriam nos dizer que é possível que num país pobre e de Terceiro Mundo habita um povo amável, hospitaleiro e fidalgo, cujos representantes na torcida do Nacional brindaram-nos com doces aplausos no estádio e em todas as ruas, à passagem da delegação gremista e dos cerca de 200 torcedores que éramos na noite inesquecível de anteontem. Que povo educado, gentil, solidário, culto se pode dizer até, pela conduta civilizada e cordial que nos emprestaram!
Campeão da América novamente, Grêmio! Eu não acredito. Não é possível. É uma grande ilusão. Belisco-me. Estou sonhando. Posso de repente acordar-me e ver que estou na Segunda Divisão. É um delírio. É uma loucura. Não pode ser.
Mas o que era aquilo, povo gaúcho? Nós no caminhão de bombeiros e centenas de milhares de gaúchos jogando seus olhares e seus gritos sobre a passagem dos heróis de campo, os técnicos e os dirigentes. Que recepção, Grêmio!
E agora, Tóquio. De novo Tóquio. Se o time se reforçar, o Grêmio pode ser bimundial. E ainda só com este time de anteontem, pode ser bicampeão brasileiro ainda este ano, seriam três bis só em 1995! Que é mais impossível a este Grêmio de Luiz Felipe e desta torcida jovem incendiada, que fez da camiseta do Grêmio uma vestimenta de moda popular?
Como é grande o Grêmio! É do tamanho da América. É bravo e resistente como os índios americanos e o negro cativo que enriqueceu com seu trabalho esta América florão do mundo. Grêmio e América são palavras casadas agora, inseparáveis.
Acorda da Glória, Cristóvão Colombo, o grande descobridor! Abre os olhos, sai da eternidade e verás que o continente que desvelaste saúda o Grêmio como o seu mais recente e adorável dominador. Colombo, o Grêmio que agora te sucede no usufruto deste rico e alegre continente tem casualmente as três cores que simbolizam os melhores alimentos da natureza desta terra americana: o preto do negro, que teve a pele ainda mais reluzente depois que veio da África para tornar a América musical e poética; o branco da neve das geleiras antárticas; e o azul do céu tropical ou austral que cobre toda a extensão deste divino território abençoado por Deus. E administrado futebolisticamente pelo Grêmio.