Fui furtado numa praia de Doha. Me levaram umas chinelas. Saí descalço — para sentir a areia e a água do mar — a passear pela pequena prainha, com o equipamento e fazendo ao vivo o Timeline na Gaúcha. Com som e imagens. Mostrávamos as ondas, um casal se beijando, homens sem camisa e mulheres de biquíni. Tudo meio proibido no Catar.
Uma hora de programa. Volto para o posto onde estávamos. Uma cabana tipo guarda-sol. De palha. Duas espreguiçadeiras coloridas. Praia chique. Aliás: R$ 350 para entrar, com R$ 150 de consumação. Ou seja: quatro cervejas. Elas são caras por aqui.
Mas, no nosso pedacinho de areia alugado, nada mais das chinelas. Tinham sumido. Alguns argentinos estavam por perto. Perguntei sobre elas: "azuis, bandeira do Brasil na tira". Eles disseram que nada viram.
Um deles riu. Liguei o alerta. Estavam debochando da minha cara? Subiu o sangue. Fiquei p da vida. Mas respirei. "Mental forte! Mental forte!" Me segurei. Um outro ria junto. Vestidos com as camisas 1 e 2, Messi nas costas. Segurei. Mental forte, mental forte pensava.
Minha última frase foi "vou lá observar as câmeras de segurança na gerência… Aqui no Catar eles acham tudo que perdem…". E ri. Eles riram amarelo.
Virei as costas. Saí quase feliz. Uma Havaianas aqui custa R$ 300. No Brasil consigo por menos de R$ 40. Mas saí com o a felicidade do controle emocional. Tudo jogava contra. Já estava fraco com as quatro cervejas com álcool. Eles eram debochados. Eram argentinos. Segurei. De pés descalços para voltar pra casa sem cair em provocações hermanas.
A lição de Modric
Descalço, com mental forte e feliz. Tipo a Croácia. Eduardo Gabardo, nosso repórter, virará pai em março, ouviu Modric 15 minutos após o triunfo croata. A pergunta era a óbvia:
— Por que a Croácia eliminou o Brasil, Modric?
Ele foi em espanhol do Real Madrid:
— Nunca rendirse!
Mental forte. Não se render. Veja o tape do gol deles. Veja quantos jogadores de amarelo desistem da jogada. Foi um golden gol. Um gol qualificado.
Brasil desabou. Croácia se acavalou e o melhor em campo pegou um pênalti. Livakovic só foi vencido quando driblado. Fechou o gol no tempo normal. Pegou pênaltis contra o Japão e um contra o Brasil. E, você já sabe: pênaltis é categoria com mental forte.
Agora sou um brasileiro eliminado em outra Copa. Em 2026 igualaremos o maior jejum: 24 anos sem taça. Até lá comprarei Havaianas novas. E o mental da Seleção? Como estará com uma fila de 24 anos?