Apesar de representarem apenas 24% dos milhares de cursos avaliados pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) de 2019, universidades públicas brasileiras – estaduais e federais – concentram 81% das graduações com nota máxima.
Só as federais, atacadas ao longo da gestão Jair Bolsonaro e alvo de provável corte orçamentário no ano que vem, reúnem 67% dos conceitos máximos na prova.
O Enade é uma prova anual, aplicada pelo Ministério da Educação (MEC), para avaliar o aprendizado de universitários prestes a se formar. Os resultados do exame de 2019, que avaliou 8,3 mil graduações, foram divulgados na terça-feira (20). As notas vão de zero a 5 – quando um curso tira nota 1 ou 2, está abaixo da média.
A cada ano, um grupo de cursos é avaliado. Em 2019, foram as engenharias, Medicina, Enfermagem, Arquitetura e Urbanismo, Farmácia, Agronomia, Odontologia e Fisioterapia, além de cursos técnicos.
As particulares são maioria no Brasil – representam mais de 76% das graduações analisadas –, mas têm 23% dos cursos com nota máxima. A Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (ABMES) manifestou-se sobre o Enade por nota, destacando que os dados devem ser avaliados e repercutidos levando-se em conta, entre outros pontos, diferenças regionais das instituições privadas de Ensino Superior diante das exigências e dos critérios do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) e perfil socioeconômico dos alunos ingressos e egressos das instituições privadas de Ensino Superior.
Seguindo tendência nacional, no Rio Grande do Sul, as universidades públicas também dominam a elite do ensino. Das 37 graduações com nota 5, 29 ficam em federais, a saber: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFRS). Das piores notas, quase todas estão em instituições particulares, como mostra o gráfico a seguir.
O presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Alexandre Lopes, declarou, quando do anúncio dos resultados, que o Brasil teve uma grande expansão de faculdades privadas e que, agora, o desafio é trabalhar a qualidade delas.
A desigualdade social brasileira ajuda a explicar esse cenário, no qual estudantes mais pobres estudam nas privadas, explica Gregório Grisa, doutor em Educação e professor do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS).
Ele cita que universidades públicas concentram os melhores professores, atraídos por melhores condições de trabalho e prestígio, os melhores alunos (inclusive entre cotistas), filtrados pelo vestibular, e boa infraestrutura de pesquisa e de laboratórios.
Após analisar com inteligência artificial o resultado de 3,8 milhões de brasileiros no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), GZH já mostrou que as condições econômicas das famílias influenciam diretamente no desempenho do estudante. Quanto mais rico, maior é a nota – e a chance de entrar na universidade.
O bom resultado das públicas contrasta com a previsão de corte de R$ 1,882 bilhão no orçamento das universidades e institutos federais no próximo ano, segundo previsão do MEC. É uma redução de 18% frente ao orçamento deste ano, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), para quem a redução poderá inviabilizar as operações de 2021.
— O impacto pode ser desastroso. A gente vem de uma sequência de quatro anos com subfinanciamento de universidades, enquanto nossas despesas crescem. Estamos em um processo inclusive de endividamento. A única forma de sobreviver é atrasar o pagamento de fornecedores, mas esse atraso tem limite. A pandemia impacta em custos, com a necessidade de readequar estrutura e de adquirir equipamentos de proteção individual, e ainda tem o corte previsto para o ano que vem. Tememos uma fuga de cérebros — diz o presidente da Andifes e reitor da Universidade Federal de Goiás (UFG), Edward Madureira.