A crise financeira provocada pela pandemia gerou êxodo nas escolas particulares do Rio Grande do Sul. Uma consulta elaborada pelo Sindicato do Ensino Privado no Estado (Sinepe) projeta que em torno de 5,7 mil matrículas dos ensinos Médio e Fundamental já foram canceladas (2,5% do total da rede básica privada). A inadimplência no setor chegou a 19,6% em maio, ante 15,7% no mesmo período do ano passado.
A evasão na rede privada acaba impactando o sistema público. Segundo dados da Secretaria Estadual de Educação, a migração mais do que dobrou nos primeiros meses deste ano. Em média, a cada ano, as escolas estaduais recebem 1,4 mil alunos vindos de instituições particulares. Em 2020, já foram emitidos 3,5 mil certificados de transferências. A expectativa da pasta é de que este número cresça ainda mais nas próximas semanas.
Segundo o secretário Faisal Karam, a rede pública tem condições de absorver nova demanda. Enquanto trabalha no planejamento para a retomada das aulas presenciais, Karam determinou a realização de estudo para distribuição dos novos alunos nas turmas já existentes, obedecendo os limites de ocupação.
– O pessoal está trabalhando tanto para termos o espaço físico adequado como para termos os servidores na área de higienização e limpeza – assegura.
Na rede privada, os reflexos mais danosos da pandemia ocorrem nos dois extremos do sistema: a Educação Infantil e o Ensino Superior. Conforme o Sinepe, em média, 16% das crianças abandonaram as escolinhas – em alguns estabelecimentos, o índice chegou a 72%. A inadimplência ficou em 18,3%.
No Ensino Superior, o cenário é ainda mais dramático. O atraso no pagamento das mensalidades atinge quase um em cada quatro alunos (23%). As dificuldades financeiras geraram taxa de cancelamento de matrículas da ordem de 13,8% em maio, três vezes superior à de abril. A evasão fez com que quase metade das instituições cortasse gastos demitindo funcionários.
Na educação básica, a rede privada registrou média de 2,5% de cancelamentos de matrículas. Os encerramentos de contratos se concentraram com maior vigor nos anos iniciais do Ensino Fundamental – 3,2%. Esse percentual corresponde a 3.337 estudantes do 1º ao 5º ano. Nos anos finais, a situação é relativamente melhor, com 2,4% de cancelamentos – 1.632 alunos do 6º ao 9º ano.
Só o Fundamental responde por 86% das baixas de matrículas na rede privada. São 4.969 contratos extintos, conforme o Sinepe. No Ensino Médio, a consulta revelou cancelamento de 1,9% do total de matrículas – o que equivale a 762 estudantes.
Prolongamento da crise preocupa entidade das escolas privadas
Para o presidente do Sinepe, Bruno Eizerik, a discrepância entre a perda de 5,7 mil matrículas na rede privada e o aumento de 3,5 mil ingressos na rede pública pode ser explicado pelas diferentes escolhas dos pais. Há casos de transferência para escolas da rede pública, para escolas particulares mais baratas ou até mesmo em que o aluno teve os estudos interrompidos na pandemia e só irá retornar ao colégio em 2021.
Eizerik, aliás, teme que algumas escolas possam diminuir o número de turmas em razão das perdas, diminuindo as vagas para o próximo ano. A probabilidade de a crise econômica perdurar para além da pandemia também assusta o presidente do Sinepe, com queda ainda maior nas matrículas na virada do ano.
— Nos últimos anos, a rede privada vinha aumentando o número de alunos. Se olharmos o quadro geral da crise, evasão (perdas de matrículas) média de 2,5% é até razoável. Mas não tenho dúvida de que teremos redução maior ao final do ano, para 2021 — afirma Eizerik.
O dirigente assegura que as escolas estão prontas para retorno imediato das atividades, com obediência total aos protocolos do Estado. No início de junho, o governador Eduardo Leite divulgou as regras para a retomada, com cada turma operando com 50% dos alunos, em rodízio semanal. As aulas presenciais só poderão ocorrer em bandeiras laranja ou amarela.
— A rede privada se preparou e está apta para recomeçar imediatamente. Claro que ninguém seria insano dizer para voltar agora, quando estamos no pior momento da curva de contágio, inclusive muitas escolas estão fazendo seu recesso de julho. Mas não vejo motivo para que não tenhamos um retorno a partir de 3 de agosto — argumenta Eizerik.
O secretário Faisal Karam evita criar expectativas e não tece prognóstico sobre datas. Segundo ele, no Estado a prioridade agora na rede pública é a aquisição de equipamento de proteção para estudantes e servidores, além de amplo diagnóstico sobre a disponibilidade da mão de obra.
Conforme Karam, o governo está consultando um a um os professores para saber quais podem voltar tão logo o refluxo da pandemia permita a retomada presencial. Porém, ele pondera:
– Estamos no pior momento. Em agosto, a rede pública não volta.