Funcionários do Ministério da Educação (MEC) indicam que a definição das datas do Enem só deve ocorrer após a escolha do novo ministro.
A falta de um ministro ainda reflete na demora na escolha de novos membros do Conselho Nacional de Educação (CNE), órgão responsável por deliberações importantes da área.
Abraham Weintraub foi demitido no dia 18 de junho, e o país segue sem titular da pasta desde então. O presidente Jair Bolsonaro chegou a nomear Carlos Alberto Decotelli para o cargo no último dia 25, mas falsidades em seu currículo fizeram com que ele nem sequer tomasse posse.
Desde o ano passado, a pasta é alvo de assédio de diferentes alas de influência dentro do governo, e cada grupo insiste em emplacar um indicado que atenda suas agendas. Bolsonaro disse que pode decidir o futuro do MEC ainda nesta terça-feira (7).
Com uma gestão marcada por ataques constantes a pessoas e grupos considerados adversários, Weintraub legou ao MEC uma escassa agenda educacional.
Projetos lançados por ele ficaram parados. A nova política de alfabetização é a única dentro do MEC com maior consolidação apesar das críticas e das dúvidas que restam sobre sua implementação.
A pasta também tem se mostrado ausente quanto aos efeitos da pandemia na educação básica e teve participação tímida nas discussões no Congresso para a renovação do Fundeb, principal mecanismo de financiamento da educação básica e que vence neste ano. Espera-se do novo ministro envolvimento no tema. Está prevista para este mês a análise da proposta de emenda à Constituição (PEC) na Câmara, e depois o tema segue para o Senado.
Principal porta de entrada para o ensino superior público, o Enem ainda está sem data para ocorrer. O MEC fez uma consulta com participantes, que indicaram preferência em fazer a prova em maio de 2021.
Mas se antes a opinião dos participantes definiria as novas datas, somente depois da consulta é que o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep) divulgou que haveria uma nova rodada de conversas com entidades educacionais para a tomada de decisão final.
Instituições que representam secretários de Educação e universidades públicas e privadas já foram consultadas. Técnicos do Inep disseram à reportagem que o instituto aguarda a escolha do novo ministro para a definição. Weintraub, por exemplo, era contra adiar o exame, previsto inicialmente para novembro deste ano.
Nesta sexta-feira (10), expiram os mandatos de 12 dos 24 conselheiros do CNE (dois cargos são cativos de secretários do MEC). A nomeação é atribuição do presidente da República, mas os nomes são indicados pelo MEC. Sete mandatos a vencer referem-se à Câmara de Educação Básica e do conselho. O restante é da Câmara de Educação Superior. Dessa forma, o órgão pode ficar sem quórum na Câmara de Educação Básica para definições das pautas caso não haja a formalização das nomeações.
Weintraub havia elaborado uma lista com alunos do escritor Olavo de Carvalho e de empresários do setor privado de ensino superior para o CNE. Um deles é o do controlador da Universidade de Santo Amaro (Unisa), Antonio Veronezi, que é próximo de Weintraub e de membros do governo.
A Unisa foi beneficiada por uma decisão atípica da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do MEC, para aprovação de um novo doutorado, como a Folha de S.Paulo revelou em novembro de 2019.
Questionada, a Presidência da República pediu que as dúvidas sobre o CNE fossem encaminhadas ao MEC. A pasta não respondeu aos questionamentos até a publicação desta reportagem.
Desde a saída de Weintraub, o MEC divulgou resultados da consulta com alunos sobre as datas do Enem, instituiu comitê para o acompanhamento da educação a distância nas instituições federais de educação profissional e também um protocolo de segurança sanitária para essas unidades.
A pasta ainda fez divulgação de relatório de acompanhamento das metas do Plano Nacional de Educação (PNE). Na avaliação de interlocutores do MEC, são sinais de que a máquina continua em funcionamento.
Outro lado
Em nota encaminhada à Folha de S.Paulo na semana passada, o MEC afirmou que trabalha no levantamento de informações e indicadores necessários à regulamentação do novo Fundeb, "a fim de viabilizar a operacionalização tempestiva do novo modelo de financiamento a partir do ano de 2021, caso a proposta seja efetivamente aprovada".
O texto atual prevê aumento da complementação da União no Fundeb dos atuais 10% para 20%, de modo escalonado. O governo sempre foi contra e Weintraub defendia chegar a somente 15%.
O Ministério da Educação afirmou em nota que segue suas ações normalmente. "Não há qualquer ação ou política do Ministério que esteja comprometida neste período de transição de ministro". Segundo a pasta, o plano é divulgar as datas do Enem nesta semana ou começo da semana que vem. "O processo de definição é técnico", diz o texto.
Sobre o CNE, o MEC afirma que "trabalha junto com o Planalto na definição final" e que as nomeações devem ser divulgadas "nos próximos dias".