Correção: a ocupação teve início na noite de quinta-feira (29), e não como o informado entre 22h45min do dia 2 de setembro e 9h35min desta terça-feira (3). O texto já foi corrigido.
A reitoria da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) em Chapecó, no Oeste de Santa Catarina, está ocupada por aproximadamente 90 alunos que acamparam no prédio na noite de quinta-feira (29), em protesto à escolha de Marcelo Recktenvald para reitor da faculdade. O presidente Jair Bolsonaro decidiu que o professor assumiria a liderança da instituição — ainda que tenha ficado em terceiro lugar na lista tríplice que indica o nome do novo reitor —, desagradando uma parcela da comunidade acadêmica.
— A nomeação do reitor Marcelo foi arbitrária e antidemocrática. É um movimento alinhado com as pautas do Bolsonaro e que fere a autonomia universitária — afirma uma das lideranças do movimento, que preferiu não se identificar.
O protesto tem a participação da União Nacional dos Estudantes (UNE) e de diversos outros grupos organizados e autônomos. Os estudantes estão acampados em barracas e fazem a higiene no banheiro do prédio. Para ajudar na organização, existem comissões de limpeza, alimentação, segurança, cultura e comunicação. Não há previsão de desocupação.
O coletivo também tem posicionamento contrário ao projeto Future-se. O programa anunciado em julho pelo Ministério da Educação (MEC) propõe que as universidades públicas não sejam mais financiadas pelo governo federal, mas que busquem verba junto à iniciativa privada. De acordo com outra integrantes do grupo, que também pediu para ter o nome resguardado, a proposta "muda a cara da nossa universidade, os vieses de pesquisa e molda a educação para o mercado, fora a grande brecha para a cobrança de mensalidades que seria um fator de evasão gigantesco".
O novo reitor tem posse marcada para esta quarta-feira (4). Até lá, o interino é o professor Joviles Trevisol, que, por meio da assessoria de imprensa da instituição, informou que, no momento, não vai se posicionar sobre as ocupações.
Na sexta-feira (30), o diretor do campus de Erechim divulgou uma nota em que expressa sua preocupação com a decisão do governo. "Tal entendimento sustenta-se no fato de que essa nomeação não representa o projeto democraticamente legitimado pela comunidade universitária da instituição. Nesta oportunidade, aproveitamos para reafirmar nossos compromissos com a autonomia universitária e com os preceitos democráticos que devem orientar o projeto institucional da UFFS, tendo em vista o seu caráter público, popular e de qualidade", diz o texto.
Recktenvald é formado em Teologia e Administração, já foi pró-reitor de gestão de pessoas e pró-reitor de assuntos estudantis na UFFS. Ele respondeu ao posicionamento do diretor do campus Erechim dizendo que cada integrante da comunidade universitária tem pleno direto de manifestação do seu pensamento.
— Compreendo que possa ter havido alguma frustração do diretor do campus Erechim, já que o candidato por ele apoiado não foi escolhido pelo Presidente. Contudo, nosso entendimento é que, na verdade, estamos tratando de um modelo democrático de escolha de reitores de universidades federais a partir da composição de listas tríplices, e não de uma eleição. É esse o modelo de escolha de reitores, regramento amplamente conhecido por todos os candidatos que ingressaram na disputa. A prerrogativa de escolha do presidente existe exatamente para possibilitar que a democracia da sociedade brasileira, de modo amplo, possa ser exercida por meio da discricionariedade do presidente eleito. Neste sentido, acredito que a escolha tenha sido para atender um desejo claro que as urnas demonstraram, democraticamente, no último pleito eleitoral no país — afirmou o reitor escolhido por Bolsonaro.
Protesto nas Missões
O campus de Cerro Largo, na região das Missões no Rio Grande do Sul, também foi ocupado na noite de sexta-feira. Durante o final de semana os estudantes realizaram formações de qualificação. Aconteceram palestras sobre cotas afirmativas, cine-debate sobre o filme Democracia em Vertigem, roda de conversa sobre a permanência da comunidade LGBTQ+ na universidade, entre outras discussões.
A segunda-feira começou sem aula no campus, pois os manifestantes lacraram o bloco A, onde acontecem as atividades acadêmicas. Durante a manhã a direção do Campus e representantes dos estudantes discutiram o fim da manifestação e a ocupação foi encerrada. Os participantes do movimento afirmam que tanto a ocupação quanto a desocupação ocorreram de forma totalmente pacífica.
— Fizemos isso pra reivindicar que fosse revista a decisão do presidente, pois ela fere a autonomia da universidade e temos histórico de jamais ter desrespeitada a vontade acadêmica. Sentimos que todo o processo eleitoral foi em vão e houve esvaziamento do processo democrático, por isso resolvemos protestar — disse a manifestante que preferiu não se identificar.
A UFFS tem seis campi no Sul do Brasil. Além de Chapecó e Cerro Largo, a instituição está presente em Erechim e Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, e em Realeza e Laranjeiras do Sul, no Paraná. Ao todo são mais de 8.6 mil estudantes matriculados divididos em 44 cursos de graduação, 15 mestrados e dois doutorados.