Estudantes brasileiros de pós-graduação estão enfrentando em 2016 um primeiro semestre de vacas magérrimas, motivado por cortes expressivos nas bolsas concedidas pelos dois principais órgãos financiadores federais, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Há poucos dias, a Capes anunciou a suspensão do cadastramento de novos bolsistas, riscando da sua planilha de despesas 7,4 mil bolsas que se esperava que fossem oferecidas – o equivalente a cerca de 9% do total, de acordo com a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG). Alunos que já davam como certa a subvenção e que haviam inclusive se demitido do emprego para poder receber os valores ficaram de mãos vazias, de acordo com a associação.
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O CNPq, por sua vez, suspendeu a concessão de novas bolsas para a realização de cursos de pós-graduação no Exterior – obrigando pesquisadores que já estavam com a viagem agendada a cancelar os planos. Um dos prejudicados pelos cortes é o doutorando em Linguística da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Dorival Gonçalves Santos Filho, 33 anos. Ele começou há um ano os preparativos para estudar na Université de Lyon, na França. Elaborou o projeto, garantiu a gratuidade das atividades em laboratório, enviou documentos e fez entrevistas para atestar a proficiência no idioma. No início deste semestre, já com o aceite da instituição francesa em mãos, surpreendeu-se quando foi informado, por e-mail, de que a bolsa do CNPq para o chamado doutorado sanduíche – quando o aluno faz parte do curso em universidade estrangeira – estava suspensa.
– A frustração é geral, minha e de vários colegas meus. Por um lado, a gente entende, mas por outro, a minha pesquisa não entende. Eu ia aprender muita coisa lá para depois replicar aqui. Agora, já vou ter de começar a delinear outro rumo para minha pesquisa – lamenta Dorival.
Zero Hora encaminhou uma série de perguntas sobre o assunto ao CNPq. Em resposta, o órgão encaminhou tabelas que confirmam a queda dos valores aplicados e das bolsas concedidas, além de apresentar uma nota em que relaciona os cortes à "atual situação orçamentária" e na qual garante que "a suspensão da concessão de bolsas ao Exterior é temporária".
A Capes também respondeu às perguntas de ZH por meio de nota, dizendo que o Sistema de Acompanhamento de Concessão (SAC) está aberto normalmente para todos os procedimentos, "com exceção do cadastramento de bolsistas nas cotas que não estavam sendo utilizadas no último mês de março", o que seria uma "medida temporária do cadastramento de bolsistas em cotas não utilizadas".
Segundo a ANPG, o que a CAPES está chamando de bolsas ociosas seriam, na verdade, as bolsas que ficam em "stand by" no período entre a saída de um pós-graduando, que concluiu o curso ou atingiu o prazo máximo de 24 meses de recebimento da bolsa, e a entrada de um novo pós-graduando que se cadastra para receber a bolsa.
A presidente da ANPG, Tamara Naiz, critica a escolha de março como mês de referência. É nesse período que grande parte dos graduandos costuma se titular, desvinculando-se da bolsa.
– Pode demorar um pouco para outro estudante acessar, com um novo CPF. Não significa que está ociosa. Não sei se, com essa suspensão, o governo quer fazer uma economia de dois meses ou se vai postergar isso, para depois dizer que há mesmo bolsas sem utilização até cortá-las de vez – afirma Tamara.
O programa Ciência Sem Fronteiras, que em anos anteriores enviou dezenas de milhares de alunos de graduação a universidades estrangeiras, também deve ficar sem edital em 2016, segundo o Ministério da Educação.