Quando conclui sua volta ao mundo em 2012, o Turanor Planetsolar poderia ter dado por encerrados seus grandes feitos. O primeiro barco a energia solar a realizar a façanha, com 510 metros quadrados de células fotovoltaicas e oito toneladas de baterias de íon-lítio, no entanto, está se transformando em uma embarcação científica, pelo menos durante este verão.
O barco, um catamarã de 100 pés e US$17 milhões que foi projetado por um aventureiro suíço e bancado por um empresário alemão, cruzará a Corrente do Golfo estudando o papel dos aerossóis atmosféricos (partículas suspensas na atmosfera que podem impactar a formação de nuvens, o reflexo da luz solar e outros processos) e do fitoplâncton na regulação do clima, sob o comando de Martin Beniston, um climatologista da Universidade de Genebra.
O cruzeiro de pesquisa, com cinco tripulantes e até quatro pesquisadores a bordo, começou em Miami, há algumas semanas, e fará uma parada em Terra Nova e na Islândia, para monitorar a corrente do nordeste. A viagem deve terminar em Bergen, na Noruega, em agosto.
Na semana passada, o barco parou na cidade de Nova York por alguns dias a caminho do norte (foto). A embarcação de fibra de carbono e seu grande deque, dominado pelo conjunto fotovoltaico, pareciam um pouco deslocados em meio aos iates de luxo e outros barcos mais convencionais ancorados na marina perto do distrito financeiro da cidade.
De certa forma, o barco está equipado para pesquisas. Sendo totalmente alimentado pelo sol - as células solares de alta potência carregam as baterias que alimentam motores elétricos conectados às duas hélices da embarcação -, ele não produz emissões de dióxido de carbono ou outros gases que possam contaminar amostras do ar. E o barco não tem problemas em ir devagar, se necessário, enquanto coleta amostras da água - a velocidade média é de 5 nós.
- Mas ele não é uma embarcação de pesquisa - ressaltou Bastiaan Ibelings, ecologista microbiano da Universidade de Genebra que está trabalhando no projeto. O catamarã precisou ser equipado com instrumentos de pesquisa, incluindo uma "caixa de balsa", criada originalmente para balsas no Mar Báltico, que registra constantemente temperatura, salinidade e outras características da água. Ele também possui uma "caixa biológica", criada pelo departamento de física aplicada da universidade, que usa um laser para analisar o número e os tipos de aerossóis em amostras de ar.
Tripulantes organizam painéis solares do Planetsolar (Foto: Jabin Botsford/NYT)
A questão dos aerossóis gerados pelo oceano é algo relativamente novo na ciência do clima, afirmou Beniston.
- Acreditamos que o oceano deva ser um colaborador bastante grande de aerossóis através da ação das ondas e do vento - disse ele. - Mas seu papel exato ainda está aberto a discussões - acrescentou.
A Corrente do Golfo é uma das correntes oceânicas mais estudadas do mundo, mas o plano de Beniston é examinar algumas de suas estruturas em menor escala. Estas incluem os redemoinhos, onde costuma haver maior afloramento de águas mais frias e profundas do que a própria Corrente do Golfo. Um objetivo é examinar se diferentes condições da água produzem tipos diferentes de aerossóis. Com sua pesquisa de plânctons, Ibelings quer descobrir se a condição da água em redemoinhos resulta em menos ou mais diversidade biológica do que em outros locais.
Embaixador da energia solar
As modificações ao catamarã - que também incluíram novas hélices e o remodelamento dos aposentos para oferecer espaço de trabalho aos pesquisadores - foram realizadas em um estaleiro francês depois que o barco terminou sua circunavegação de 19 meses e 60 mil quilômetros, em maio de 2012. Essa viagem pretendia demonstrar mais as capacidades gerais da energia solar do que a praticidade de barcos movidos à energia solar (afinal, embarcações alimentadas eficazmente por energias alternativas já existem há séculos - elas se chamam veleiros).
- Ele é um embaixador da energia solar - explicou Gérard d'Aboville, atual comandante do Planetsolar. - Mas eu teria de ser louco para dizer que precisamos pedir 20 barcos como este.
Além dos problemas de custo e velocidade, o Planetsolar apresenta alguns desafios únicos. Além do vento, ondas e corrente, d'Aboville precisa analisar constantemente a quantidade de luz solar atingindo as células fotovoltaicas, com o objetivo de manter as baterias as mais carregadas possíveis - para o caso de longos períodos com tempo nublado (totalmente carregadas, elas podem alimentar o barco por cerca de 72 horas).
Ele possui um laptop onde recebe mapas detalhados (e constantemente atualizados) da agência nacional meteorológica da França, a Météo-France, mostrando o potencial ganho solar (calculado através da cobertura de nuvens e outros fatores). Se houver uma nuvem no horizonte, ele pode decidir contorná-la, imaginando ser possível ganhar mais energia com o céu limpo do que perder com o desvio.
- Tenho esse novo parâmetro do sol, e isso torna a vida interessante - concluiu ele.