Para a pesquisa de mestrado, o biólogo evolucionário Andrew Martin estudou as cigarras periódicas, um inseto que vive sob a terra e emerge a cada 13 ou 17 anos. Cruzando os Estados Unidos, Martin, que agora é professor na Universidade do Colorado, passou o verão ao lado das cigarras. Em cada lugar ele manuseava cerca de 30 a 50 espécimes.
O corpo das cigarras era oleoso, e os abdomens dos insetos frequentemente estavam cobertos por um pó esverdeado. Esse é um fungo que torna as cigarras estéreis e acaba por causar sua morte. Depois de um mês de pesquisa, as cigarras não eram as únicas afetadas pelo pó verde. Sempre que Martin tocava a substância, seus olhos coçavam e começavam a lacrimejar - e a cada vez os sintomas ficavam piores.
- Quando havia muito fungo, meus olhos pareciam que iam saltar da cara. Dava vontade de arrancá-los na unha - recordou.
Martin desenvolveu uma alergia a seu objeto de pesquisa, um fato que tornou a finalização do projeto uma tarefa excruciante.
- Eu sempre precisava tomar alguma coisa - afirmou, referindo-se aos antialérgicos. - Mas mesmo assim continuava mal.
Tornar-se alérgico à própria pesquisa tem se revelado um perigo comum e pouco discutido da pesquisa científica. Estima-se que entre 15 a 20 por cento dos pesquisadores que trabalham com ratos e camundongos, por exemplo, se tornam alérgicos a esses animais, afirma Karin A. Pacheco, professora assistente de saúde ambiental e ocupacional no National Jewish Health, em Denver. Os números podem ser ainda maiores, uma vez que algumas pessoas que se tornam alérgicas talvez nunca venham a relatar o fato, dando mais valor ao trabalho do que à saúde ou ao conforto.
Alergias são causadas quando nosso sistema imunológico se torna excessivamente sensível a substâncias que, em outros momentos, seriam inofensivas.
- A primeira vez que você é picado por uma abelha não causa alergia. É preciso ser exposto ao antígeno e então desenvolver uma reação imunológica a ele - diz Pacheco.
Uma vez que a pesquisa científica frequentemente envolve contatos prolongados com substâncias e criaturas, ela se torna o veículo perfeito para alergias. Charlotte R. Hewins, especialista em pesquisa do Holden Arboretum, em Kirtland, Ohio, costumava passar seis meses por ano trabalhando com flores de hamamelis, fazendo a polinização manualmente.
O hamamelis é utilizado como arbusto em jardins e como adstringente na medicina, e nos galhos da planta cresce uma espécie de pelinho. Quando Hewins manuseava as plantas, esses pelinhos se soltavam e ficavam flutuando no ar.
Em pouco tempo, recordou, "comecei a ficar com coceira nas mãos e nos braços. Meus olhos começavam a coçar, lacrimejar e eu espirrava".
Para Burk Dehority, microbiologista e professor emérito da Universidade Estadual de Ohio, a substância problemática foi o formaldeído. Dehority estava estudando os protozoários que vivem no estômago de animais de criação.
- Depois de usar o formaldeído em quantidades excessivas durante anos, sempre derramando a substância na pele, comecei a desenvolver bolhas nas minhas mãos - afirmou Dehority. Ele tentou usar luvas de borracha, mas a solução não foi suficiente. Os gases químicos liberados eram parcialmente culpados pela alergia. Por isso, Dehority instalou uma espécie de exaustor para retirar esses gases. Isso tornava a situação mais suportável, embora a alergia tenha persistido ao longo de 40 anos de pesquisa.
- Construí minha carreira em função do estudo de protozoários. Nunca pensei em mudar de área.
Também para Martin, abandonar o projeto das cigarras parece nunca ter passado em sua mente.
- Estava colhendo dados tão legais - afirmou Martin, que teve o primeiro trabalho sobre as cigarras publicado pela revista Nature. - Você acaba se concentrando apenas no que tem que fazer.
Na verdade, até mesmo alergias pré-existentes não são capazes de deter cientistas obcecados com determinada linha de pesquisa. Monica Raveret Richter, ecologista comportamental do Skidmore College, desenvolveu uma alergia aguda a abelhas, vespas e moscas quando era criança. Ainda assim, a pesquisadora passou boa parte de sua carreira estudando o comportamento de vespas - ajudada por adrenalina autoinjetável e anti-histamínicos.
- Tenho problemas se tomar muitas picadas. Aprendi a conviver com isso - afirma.