A Polícia Civil indiciou por injúria racial um aluno da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) denunciado por racismo contra uma professora da instituição. A identidade dele não foi divulgada pela polícia.
De acordo com a delegada Tatiana Bastos, titular da Delegacia de Combate à Intolerância em Porto Alegre e responsável pela investigação, provas testemunhais e uma sindicância da universidade ajudaram a polícia a chegar à conclusão de que o estudante deveria ser responsabilizado.
A sindicância da UFRGS foi um Processo Disciplinar Discente (PDD) conduzido por uma comissão que decidiu pela expulsão do estudante.
A UFRGS, a respeito da decisão da comissão, disse que "o processo está tramitando nas instâncias da universidade, sendo, portanto, ainda sigiloso". Não foram divulgadas informações sobre o aluno: se permanece frequentando aulas ou está afastado.
Sobre as provas testemunhais, segundo a polícia, a professora que sofreu a injúria, Gláucia Aparecida Vaz, do curso de Biblioteconomia, contou que o caso teria acontecido em 19 de julho de 2023, quando ela chegava para dar aula. A docente relatou que o universitário disse que ela "não sabia qual era o lugar dela". Ele também teria falado que ela "continuaria sendo perseguida e odiada" (veja detalhes abaixo). Em depoimento à Polícia Civil, o aluno negou que tenha praticado o crime.
O inquérito policial foi remetido ao Ministério Público (MP), órgão responsável por decidir se vai oferecer denúncia ou não à Justiça. Caso isso ocorra, o estudante será formalmente acusado do crime. Se a Justiça aceitar a denúncia, ele começará a ser julgado.
Processo disciplinar
Ao longo do PDD, testemunhas apontaram que o aluno se manifestava de forma inadequada em relação à professora, tanto fora da sala de aula, em um grupo da turma no WhatsApp, quanto na universidade, "depreciando a abordagem dada aos conteúdos, questionando suas metodologias".
Ele teria dito "que a professora Gláucia era uma 'mala' e que a racista era ela porque ele era branco dos olhos verdes", diz o relatório.
Durante depoimento à comissão, o estudante também teria dito que "nada a ver ser preta ou mulher, o problema é ser chata", que foi casado com uma "mulher negra" e que tinha um filho que "é mulato".
A comissão enquadrou o caso no Código Disciplinar Discente. "O seu inciso V caracteriza como infração gravíssima 'praticar, induzir ou incitar, a discriminação ou preconceito de raça, sexo, cor, etnia, religião ou procedência nacional'", disse a comissão.
O que aconteceu
Gláucia relata que, assim que passou a catraca da recepção da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação (Fabico), em Porto Alegre, percebeu que o aluno a aguardava segurando o elevador. Em seguida, ele disse que queria discutir uma questão do trabalho com ela, pois não havia tirado a nota máxima, 15, mas sim 14.
— A nota era praticamente a nota máxima, mas ele disse que não era a nota (o motivo da discussão) e, sim, o enunciado da questão. Ele não concordava com a forma que eu tinha proposto a atividade, mas não deu nenhuma explicação (a respeito do que não concordava). Falava tudo isso gritando e alterado — lembrou a professora.
Ao ver que o diálogo não estava levando a nada, Gláucia disse que precisava trabalhar e optou por ir de escada até a sala de aula. O aluno pegou o elevador. No entanto, no lance de escadas que ia do terceiro para o quarto andar, o estudante apareceu e impediu que ela subisse.
— Minha intenção era subir direto, mas ele falou que eu não sabia escutar ninguém, que eu não sabia qual era o meu lugar. E que, ainda que fosse uma mulher, ele usou isso: falou "uma mulher loirinha dos olhos azuis", eu continuaria sendo perseguida e odiada pelas pessoas — conta Gláucia, emocionada.
A professora ainda citou que era recorrente que o aluno questionasse a sua autoridade dentro da sala de aula. Tudo isso fez com que a docente buscasse assessoramento jurídico, o que motivou o pedido de abertura de um processo administrativo disciplinar à UFRGS, para que a instituição apurasse a situação.
— Eu me senti totalmente desamparada. O que me choca mais nessa história é a falta de humanidade. E acho que isso escancara o racismo institucionalizado — afirmou, na época do caso.