Pelo menos 41% das secretarias municipais de educação no Rio Grande do Sul não realizam ações consistentes para cumprir a Lei 10.639/03, promulgada há 20 anos para promover a educação antirracista nas escolas. É o que revela a pesquisa "Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira", conduzida pelos institutos Alana e Geledés.
Das 62 secretarias do Rio Grande do Sul que responderam, 60% promovem ações perenes para a implementação da Lei 10.639/03. Com relação à disponibilização de verbas para a aplicação da lei, 85% dos municípios do RS investem na pauta. Contudo, somente 11% observam indicadores de aprendizagem levando em consideração a raça e a cor dos alunos, muito abaixo da média nacional de 24%.
O levantamento teve adesão de 12% dos 497 municípios gaúchos. No total, a pesquisa conta com informações de 1.187 secretarias municipais de educação do Brasil, o que representa 21% das redes municipais de ensino do país. A Lei 10.639/03 alterou a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), incluindo no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática história e cultura afro-brasileira, mas ainda não foi implementada em sua totalidade.
O estudo verificou, ao longo do ano passado, como e se foram construídas condições para combater o racismo estrutural, e quais são as lacunas existentes para a implementação da Lei 10.639/03 nas redes municipais de ensino. Para a analista de Políticas Públicas do Instituto Alana, Beatriz Benedito, a pesquisa demonstra que ainda temos um longo caminho pela frente.
— No Rio Grande do Sul, uma das maiores lacunas identificadas é a falta da presença de profissionais especializados neste tema dentro das secretarias municipais. É importante ter pessoas olhando para essa agenda, trazendo apoio e parcerias, identificando os problemas. Muitas vezes, existem profissionais da educação nas escolas comprometidos e preocupados com esse assunto, que promovem discussões relevantes. Mas isso é uma política pública e as secretarias precisam se organizar — ressalta Beatriz.
Principais lacunas no RS
Embora tenha tido baixa adesão no RS, o levantamento nos 62 municípios gaúchos mostra um cenário positivo, na contramão do cenário nacional, que é preocupante. Apenas 5% dos municípios brasileiros afirmaram ter implementado uma área técnica dedicada à agenda da educação para as relações étnico-raciais, e somente 8% das secretarias dizem ter orçamento específico para isso. Em 74% das cidades respondentes não existia um profissional ou uma equipe responsável pelo tema.
O levantamento mostra que a maioria das ações realizadas para apoiar as escolas no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira são, na realidade, orientações. Elas são direcionadas a explicar que tipo de medidas podem ser tomadas em casos de racismo, além de práticas pedagógicas.
A ausência de apoio de governos e empresas, além da dificuldade dos gestores e profissionais em aplicar o que está previsto nos currículos são os desafios mais citados pelos municípios gaúchos na aplicação da lei. Outra lacuna identificada é a escassez de verbas específicas, com apenas 8% das secretarias do Brasil e 15% na região Sul possuindo orçamento específico para implementá-la.
Desafios em âmbito nacional
A pesquisa “Lei 10.639/03: a atuação das Secretarias Municipais de Educação no ensino de história e cultura africana e afro-brasileira” foi desenvolvida em duas etapas: quantitativa e qualitativa. Em abril de 2023, foram publicados os resultados da etapa quantitativa.
A pesquisa foi realizada por meio de uma parceria entre os institutos Geledés e Alana, encomendada à Plano CDE. O trabalho foi realizado com apoio da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime), da União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme) e da Imaginable Futures.