Se o desafio da Educação a Distância (EAD) no passado foi atrair novos alunos, agora a meta é ter um diferencial e se destacar entre a concorrência. Depois de uma década de crescimento no número de matrículas, os cursos buscam aperfeiçoar os métodos, de forma que professor e aluno sejam cada vez mais próximos. Nesse cenário, a tecnologia entra como aliada e novos formatos, cada vez mais interativos, integram a rotina de aulas.
A pandemia e a necessidade de implantar um ensino remoto emergencial para crianças e adolescentes deram a chance que faltava à modalidade, o que gerou um aumento exponencial da oferta de vagas EAD. Num mercado altamente competitivo, conceituadas instituições de Ensino Superior passaram a fazer investimentos que lhes garantissem um diferencial de qualidade e credibilidade em relação à concorrência.
— Cada vez mais capacitamos professores para o uso de ferramentas digitais que possam ser incorporadas nas aulas a distância, presenciais ou em atividades extracurriculares. Não basta dar bibliografia, é preciso infográficos, experiência de realidade aumentada, 3D. Imagine um professor dando uma aula online de anatomia, sobre sistema circulatório, dissecando um corpo. Aí, um ícone de realidade aparece na tela, e o aluno pode capturar a imagem no computador ou no celular e até projetá-lo na mesa. Isso possibilita ao aluno um rico espaço de aprendizado — diz o reitor da Universidade Feevale, Cleber Prodanov.
Na EAD, as tradicionais visitas técnicas a empresas e fábricas foram substituídas por passeios virtuais há anos. Porém, hoje, o uso do 3D e de ferramentas como a visualização em 360° tornam a experiência mais próxima da realidade.
— É possível visitar a usina de Itaipu pelo celular. Nunca é como a visita real, mas as pessoas não deixam de ver, de conhecer, o que é muito útil — comenta.
Na mais moderna EAD, uma única aula utiliza diferentes objetos de aprendizagem, como videoaulas, infográficos, gamificação e podcasts para trabalhar um mesmo conteúdo. A coordenadora de Graduação Online da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Débora Conforto, explica que o formato multimodal permite explorar vários canais de compreensão do estudante, principalmente o visual e o auditivo, o que leva dinamismo às aulas.
— Um mesmo conteúdo vai ser trabalhado com vídeo, áudio, texto, objetos interativos, porque os alunos aprendem de diferentes formas. Na PUCRS, usamos o conceito de micro learning. Pegamos a disciplina e vamos construindo microaprendizagens com um início e um fim. Começa com uma problematização e sempre vai terminar com uma aplicação. Esses microcenários vão permitir que o estudante faça o processo de aprendizagem em espiral, no qual ele vai e volta para um objeto de conhecimento em diferentes formatos e, a partir dali, vai aprendendo — conta.
Professor no centro
Também é tendência no ensino virtual recolocar o professor no centro da mediação entre o aluno e o conhecimento. Na EAD tradicional, esse papel cabe a tutores, cuja formação, muitas vezes, é questionada.
— Aqui, é o professor quem interage com os alunos na plataforma. Não só por chat, mas também em aulas ao vivo semanais ou quinzenais. O docente também tem acesso aos dados do aluno com o conteúdo do site e pode usar essas informações para fazer intervenções pedagógicas nas aulas — diz a gerente acadêmica da EAD da Unisinos, Laura Dalla Zen.
Outro indicativo da valorização do professor no processo de aprendizagem é a produção de conteúdo autoral – num cenário em que é comum a compra de pacotes em empresas especializadas.
— É diferente de quando o conteúdo tem a assinatura do professor. Quando é terceirizado fica meio pasteurizado, alunos de instituições do Brasil inteiro ficam sob a mesma perspectiva de análise. Será que o estudante é o mesmo em todas as regiões? Acreditamos que a ação do professor deve estar desde a construção do material ofertado ao estudante até o processo de mediação — diz Débora, acrescentando que o papel do tutor também foi abolido na PUCRS.
A caminho do híbrido
Na avaliação da gerente acadêmica de EAD da Unisinos, Laura Dalla Zen, a experiência do ensino virtual é um caminho sem volta, tanto para graduação quanto para especializações e cursos livres. O que se estuda agora é qual será o próximo passo.
– O que temos percebido hoje é um caminho para o hibridismo, pela convergência dos modelos. O futuro do Ensino Superior passa pela virtualização do presencial, mas também pela EAD tendo presencialidade – diz.
É o processo de aprendizagem que está no centro, e não a distância.
DÉBORA CONFORTO
Coordenadora de Graduação Online da PUCRS
Laura revela que a live de acolhida dos novos alunos EAD foi marcada por perguntas de interessados em frequentar os campi da universidade, mesmo estando vinculados aos polos. Isso indica que parte do corpo discente deseja pertencer à vida universitária presencialmente:
— Os alunos de EAD têm demandas mais diversas. Ao mesmo tempo em que a gente tem alunos que estão fazendo um curso, mas têm família, emprego e não querem fazer trabalhos em grupo, há alunos mais jovens que querem esse pertencimento e se organizam para estar em conjunto.
As universidades por seu lado desenvolvem estratégias para manter-se próximas.
— Aproveitamos ao máximo a possibilidade de 30% de carga horária presencial, além de estabelecer atividades síncronas. Essas aulas permitem discussões, para que os alunos interajam entre si e, principalmente, com o professor. Por que só se aprende com o professor? — argumenta a pró-reitora de Ensino da Feevale, Angelita Renck Gerhardt.
Segundo os gestores, há uma ideia preconcebida sobre o perfil do aluno de EAD: a de que por serem, em maioria, mais maduros e inseridos no mercado de trabalho, são capazes de se organizar e fazer trabalhos autoinstrucionais com sucesso. Mas a realidade é que os estudantes brasileiros não costumam desenvolver essa autonomia ao longo da vida escolar e, no Ensino Superior, precisam ser cobrados. As universidades se preocupam em falar com o aluno sobre progresso acadêmico.
— É o grande desafio: focar na aprendizagem, e não no ensino. Olhar para o estudante como um sujeito que precisa ter sua história percorrida. É preciso monitorar as entregas daquele estudante e conhecer seus pontos de fragilidade, por isso a importância do professor. A modelagem online não é mais fácil, é mais difícil. Exige um protagonismo e uma responsabilidade maior do aluno. Ele precisa ser acompanhado e receber feedbacks de qualidade para não se sentir abandonado — afirma a coordenadora de Graduação Online da PUCRS, Débora Conforto.
Por isso, o termo “a distância” é, aos poucos, abolido em parte das instituições que oferecem EAD.
É o processo de aprendizagem que está no centro, e não a distância. Quando a gente fala EAD, vem sempre o pejorativo do afastamento. É uma modalidade diferente da presencial, mas que também pressupõe qualidade — finaliza Débora.
Os 10 cursos mais procurados na EAD
Em instituições privadas:
- Pedagogia
557,2 mil matrículas - Administração
341,1 mil matrículas - Contabilidade
193,1 mil matrículas - Gestão de Pessoas
170,4 mil matrículas - Educação Física
146,4 mil matrículas - Sistemas de Informação
128,8 mil matrículas - Enfermagem
108,2 mil matrículas - Serviço Social
103,9 mil matrículas - Logística
95,9 mil matrículas - Marketing
74,2 mil matrículas
Em instituições públicas:
- Pedagogia
12,8 mil matrículas - Licenciatura em Matemática
8,5 mil matrículas - Licenciatura em Letras/Português
7,3 mil matrículas - Administração
6,7 mil matrículas - Administração Pública
6,6 mil matrículas - Licenciatura em Biologia
4,1 mil matrículas - Licenciatura em Computação
2,6 mil matrículas - Engenharia de Produção
2,6 mil matrículas - Licenciatura em Física
2,5 mil matrículas - Licenciatura em Química
2,3 mil matrículas
Fonte: Censo da Educação Superior 2021, do Inep